quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Portugal: O MUNDO VIRADO AO CONTRÁRIO



Paula Ferreira – Jornal de Notícias, opinião

Há dias fui a um banco tentar perceber quanto podia ganhar com uma pequena poupança. E grande foi o meu espanto quando o funcionário me diz, em discurso digno de um professor de Finanças, que esse banco não se financia com os depósitos dos clientes. De forma rebuscada, informava-me de que não estavam interessados nas minhas economias. Enfim, até podiam guardá-las, mas eu iria beneficiar tão pouco que, na opinião do diligente bancário, mais valia não depositar. Com a lição bem estudada, lá me explicou: a culpa é do BCE e suas taxas de juros, a níveis nunca vistos, a Europa está à beira da deflação. Se domiciliasse o meu ordenado, pedisse um cartão de crédito e por aí fora, talvez conseguisse mais uns cêntimos. Mantive o espanto.

Reconheço-me não muito preparada na área financeira, todavia conheço o essencial. Sei que os depósitos a prazo nos bancos não cativam, mas atirarem-me à cara, recorrendo a eufemismos vários, que não precisam do meu dinheiro para nada, era uma situação imprevista.

Ainda incrédula, entro no carro e ligo o rádio. Pedro Passos Coelho, numa cerimónia pública, elogia o ministro Nuno Crato. Ouvi bem? Na inauguração de uma escola, em Esposende, Passos e Crato são fortemente apupados, tanto que as canções cândidas das criancinhas (cena que nos faz recuar ao preto e branco do tempo do presidente Américo Tomás) foram abafadas. É nesse ambiente que o primeiro-ministro afirma ter feito a escolha certa, ao nomear Nuno Crato para a pasta da Educação. Só se isso fizer parte de alguma estratégia concertada para implodir o país (Crato, como se sabe, fez com brilhantismo a sua parte de implodir o Ministério da Educação). Ouvia Passos Coelho e lembrava-me de que a minha filha - ela e milhares de alunos - está há semanas a experimentar professores. Vão e vêm, consoante os erros do Ministério tutelado pelo homem que o primeiro-ministro Passos elogia. Continuei incrédula.

A ministra da Justiça segue a mesma cartilha. Está tudo bem, diz, aparentemente indiferente ao caos instalado nos tribunais desde o passado dia 1 de setembro. Um inquérito feito a funcionários judiciais revela que o sistema informático, apesar de ter ressuscitado, esqueceu muitas peças processuais. Mesmo Paula Teixeira da Cruz age como se estivesse a ser vítima de uma cabala.

No regresso a casa, passo pela praia. Vejo gente em biquíni a apanhar sol e a comer gelados, como se estivéssemos em pleno agosto. Esgotei a capacidade de me surpreender. Afinal, o Mundo está mesmo virado ao contrário.

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