sábado, 29 de novembro de 2014

GUARDA PRESIDENCIAL DE ANGOLA ESCONDE ASSASSINO DE HILBERT GANGA



Folha 8 Digital, 29 novembro 2014

O alegado assassino de Hilbert Ganga é um militar que faz parte, não das For­ças Armadas Angolanas, enquanto órgão governa­mental, mas do exército privado de José Eduardo dos Santos, actual Pre­sidente da República de Angola.

Este soldado da UGP–Uni­dade da Guarda Presiden­cial-, cuja cultura de pro­tecção assenta no “mata primeiro e discute depois”, andou muito tempo escon­dido, quer dizer, os seus superiores hierárquicos, que se julgam e sempre es­tiveram acima da lei, refu­taram-se a denunciá-lo as autoridades judiciais.

“Não sabemos quem foi o soldado, que disparou”!

“Se calhar é um infiltrado”!

Respostas atentatórias aos neurónios de qualquer ci­dadão normal. Diante des­ta aberração o advogado decidiu formular a quei­xa contra o comandante da unidade; um general, garbosamente pago pelo Presidente da República e com mordomias, que muitas vezes, segundo uma fonte, chegam aos 50 mil dólares semanais.

Aí chegados, o generalíssi­mo abandonou a clandes­tinidade, e para não ver a pele aquecer nos qua­dradinhos das fedorentas masmorras do regime, re­cuperou a memória e, no meio dos 19 mil homens que compõe o exército privado de Eduardo dos Santos, des­cobriu, qual agulha no pa­lheiro, o alegado assassino de Hilbert Ganga, jovem engenheiro e militante da CASA-CE, barbaramen­te assassinado no 23 de Novembro de 2013, cujo crime foi a de colar carta­zes à mais de 800 metros do Palácio Presidencial, exigindo justiça pelos as­sassinatos de Cassule e Kamulingue.

E, com base nisso, emer­giu, Desidério Patrício de Barros, solteiro, maior, angolano, filho de Augus­to Manuel e de Faustina Filipe de Oliveira Barros, que já está devidamente identificado nos autos, pois chegou a ser ouvido, na fase de instrução preparatória, mas continuam as posições dila­tórias.

O processo foi remetido ao tribunal e distribuído para a 8.ª secção, com o n.º 884/14, estando na letra do juiz José Pereira Lourenço.

Antes da pronúncia foram emitidos dois “manda­dos de captura”, sendo o último, através do oficio 218/14 de 30 de Outubro e recebido na DPIC (Direc­ção Provincial de Investi­gação Criminal), no dia 04 de Novembro 2014, mas a verdade é que este órgão e o departamento de Buscas e Capturas, mesmo saben­do do domícilio do alega­do assassino, estes não cumprem com a decisão judicial.

O próprio advogado da causa, Dr Miguel Fran­cisco, já se deslocou por várias vezes a DPIC, mas estes continuam a fazer ouvidos de mercador, por se tratar de alguém, pro­tegido da Presidência da República.

“Eu não entendo qual é a dificuldade desta direc­ção de Buscas e Captu­ras cumprir uma ordem judicial, principalmente, quando o infractor está localizado?”, interroga-se o advogado.

A dificuldade é uma. Fosse um outro infractor, ligado, por exemplo, a CASA – CE, UNITA ou PDP-ANA e à muito o homem estaria atrás das grades ou mes­mo preso na barriga de um qualquer jacaré, do­mesticado nos rios da Se­gurança de Estado e DPIC.

É a consagração do princí­pio da desigualdade...

A Constituição de Angola, feita a medida do fato de Eduardo dos Santos de­monstrou mais uma vez ter sido feita por gente no exterior e aprovada por gente que não a leu, ao ponto de, quando o cida­dão pretende, recorrer aos seus articulados, como o art.º 47.º (Liberdade de reunião e de manifesta­ção), o regime reage com violência, como foi no caso, de Hilbert Ganga.

Quanto a proximidade a lei diz, não poderem os manifestantes, chegar a 100 metros dos órgãos de soberania, ele estava a 800 mts.

Se ainda assim tivesse de haver violência ela, não poderia, violar o art.º 57.º da constituição que diz no n.º 1: “a lei só pode res­tringir os direitos, liberda­des e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário, proporcional e razoável numa sociedade livre e democrática, para salvaguardar outros direi­tos ou interesses constitu­cionalmente protegidos”.

Ora isso não diz nada aos brutamontes assassinos, tão pouco aos seus mento­res e chefes, daí a morte ser a medida de razoabilidade.

“O processo está acusado e o digno agente do Mi­nistério Público já exarou um Despacho de captura. Penso até que um dos in­divíduos ligados ao sector de captura está aqui pre­sente (na manifestação recordando um ano de passamento de Ganga), e já o abordei mesmo na entrada do cemitério”, de­sabafou Miguel Francisco.

O autor do homicídio, ain­da beneficia da presunção de inocência, até condena­ção em julgado, mas deve aguardar, pela dimensão da imputação criminal: homicídio voluntário, jul­gamento em prisão pre­ventiva.

“É tudo muito fácil, ele é da UGP, está identificado, nem é preciso lá ir, é só mandarem uma ordem e de lá o militar é encami­nhado para a DPIC e con­sequente, esta coloca-o na prisão, para aguardar o julgamento. Mas, até lá, ele goza da presunção de ino­cência e caberá ao Tribu­nal julgá-lo, se for o culpa­do, e aí pagará pelo crime cometido”, concluiu.

Na foto: Hilbert Ganga, depois de gratuita e barbaramente assassinado pela guarda presidencial.

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