Rebeldes
cercam, em sua casa, presidente que autoriza os assassinatos seletivos
praticados com drones, pelos EUA. Ocupado o palácio do governo
Antonio Martins – Outras Palavras, em Blog da Redação
Uma
peça importante no tabuleiro geopolítico do Oriente Médio pode estar se movendo
neste instante. Na manhã de ontem, combatentes do grupo político-religioso houthi, de
tendência muçulmana xiita, tomaram o palácio presidencial do Yemen em Sana’a, a
capital. Como o presidente, Abdu Rabbu Mansour Hadi, encontrava-se em sua
residência particular, esta foi cercada pelos rebeldes — e assim permanece. Um
automóvel da diplomacia norte-americana foi incendiado. O líder dos
houthis anunciou, num discurso pela TV, que não pretende destituir o governo,
mas que adotará “todas as medidas necessárias” para que as reivindicações
políticas de seu grupo sejam atendidas.
Os
novos atos indicam a retomada de uma ofensiva
houthi, iniciada em setembro e motivada por duas questões. A primeira é
econômico-social. As condições de vida já precárias (o Yemen é o 157º colocado,
numa lista de países segundo seu Índice de Desenvolmento Humano — IDH)
agravaram-se em agosto, quando o governo de Abdu Hadi eliminou subsídios e
provocou alta de 100% no preço dos combustíveis. Os houthis, que existem como
movimento há 25 anos e adquiriram força militar em período recente, ocuparam
pontos estratégicos da capital — inclusive estações de rádio e TV.
Em
negociações subsequentes, o presidente aceitou a formação de um governo “de
unidade”, que acabou não se conformando. A ofensiva houthi dos últimos dias foi
deflagrada depois que autoridades anunciaram plano para dividir o país em seis
províncias, o que é rechaçado pelos revoltosos. Na segunda-feira, eles
aprisionaram o chefe de gabinete da Presidência. Ontem, tomaram o palácio e sitiaram
Abdu Hadi.
O
segundo fator da ofensiva é geopolítico e aflige Washington. O Yemen é base de
um ramo importante da Al-Qaeda — o mesmo que teria assumido a responsabilidade
pelo atentado praticado este mês contra o Charlie Hebdo. Os EUA
desencadearam há anos, contra o grupo, uma guerra baseada em assassinatos
seletivos, praticados por drones. Assim como ocorre no Paquistão, os
homicídios, além de serem afronta brutal os direitos humanos, costumam atingir
também a população civil. Só em 2014, segundo o Consórcio Internacional
de Jornalismo Investigativo, entre entre 148 e 214 pessoas foram mortas em ataques deste tipo. São mais vítimas
fatais, por mês, do que as mortas na carnificina praticada no jornal francês…
Os
houthis combatem a Al-Qaeda, mas se opõem tanto aos assassinatos por drones
quando à interferência de Washington nos assuntos do Yemen. Não são os únicos a
fazê-lo. Em abril de 2013, Farea al-Muslimi, uma jovem ativista yememita que
cursou ensino médio nos EUA, prestou depoimento no Senado norte-americano. Ela
é originária da cidade de Wessab, uma das atingidas por assassinatos por
drones. “O ataque conseguiu realizar, num instante, o que os terroristas jamais
haviam obtido”, disse: “Agora há ira intensa e ódio crescente dirigidos aos
Estados Unidos,” disse ela. A possível queda de Abdu Radih, o presidente submisso
a Washington, pode ser mais um sinal deste sentimento.
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