Público,
editorial
Em
Portugal, cada um interpretou as palavras de Jean-Claude Juncker como bem
entendeu
“Pecámos
contra a dignidade dos povos, especialmente na Grécia, em Portugal e também na
Irlanda. Eu era presidente do Eurogrupo e pareço estúpido ao dizer isto, mas há
que retirar lições da história e não repetir os erros.” Esta é a frase de
Jean-Claude Juncker, no Comité Económico e Social Europeu em Bruxelas, que fez
correr muita tinta nesta quinta-feira.
Mas
a frase do presidente da Comissão Europeia tem um contexto. Quando falou em
dignidade, Juncker estava a referir-se aos funcionários da troika que
são colocados nos países alvo de resgate, com um poder desmedido, por vezes com
uma arrogância destemperada, ao lidar com ministros que foram eleitos
democraticamente.
Aliás,
um dos primeiro a alertar para este problema foi o presidente do BPI ainda no
final de 2011. “Não resisto a fazer um apelo para que acabem com as
conferências de imprensa da troika. (...) Ter de ouvir funcionários,
sei lá, de quinta ou sétima linha, não eleitos democraticamente virem cá dizer
o que temos de fazer... Por favor, poupem-me”, afirmou na altura Fernando
Ulrich. A verdade é que pouco tempo depois terminaram os espectáculos
mediáticos das conferências da troika.
Mas
as declarações
de Jean-Claude Juncker surgem numa altura em que em Portugal e por
essa Europa fora se discute a continuidade ou um arrepiar caminho nas políticas
de austeridade, tendo como pano de fundo a Grécia. O PS veio prontamente dizer
que as críticas de Juncker à troika revelam "que há uma maior
abertura para reconhecer o falhanço da austeridade e a necessidade de mudar de
políticas do que muitas vezes muitos querem fazer crer". Vai uma grande
distância entre o que disse Juncker e o que os socialistas leram nas palavras
do presidente da Comissão Europeia. Até porque Juncker fez questão de sublinhar
que as críticas à troika “em nada reduzem a necessidade de consolidar
a curto, médio e longo prazo as nossas finanças públicas”.
Mas
a verdade é que as palavras de Juncker parecem encaixar que nem uma luva na
mensagem do Syriza. "Não negociaremos o orgulho e a dignidade do nosso
povo”, disse Alexis Tsipras na semana passada no Parlamento. Isto numa altura
em que o Eurogrupo volta a reunir-se para discutir o problema na Grécia. O novo
Governo grego deu nesta quinta-feira vários passos atrás nas suas promessas
eleitorais e enviou para o grupo dos 19 uma carta em que propõe o prolongar os
empréstimos da troika por mais seis meses. A carta, que mostra já uma
grande boa vontade do Syriza em negociar, mal tinha saído de Atenas e já um
porta-voz do Ministério das Finanças da Alemanha lia um comunicado a dizer que
o pedido da Grécia não cumpria os requisitos mínimos do Eurogrupo. Uma posição
de inflexibilidade que parece fechar portas à discussão e que só serve para
humilhar os gregos e os seus representantes. E assim não há negociação que
aguente. Pelo menos uma que seja feita com alguma dignidade.
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