Vanessa
Martina Silva, São Paulo – Opera Mundi
Rico
em petróleo, 77% da população vive na pobreza; apesar das violações aos
direitos humanos, não há sanções econômicas dos EUA contra o país
O
fato de o presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, ter
pago cerca de R$10 milhões à escola de samba Beija-Flor, campeã do carnaval do
Rio de Janeiro, para falar das belezas de seu país não constitui uma novidade
na tática do político, que se mantém desde 1979 no governo, após ter tomado o
poder mediante um golpe de Estado. Para melhorar sua imagem internacional,
prejudicada pela pobreza extrema do povo e pelas violações de direitos humanos
no país, Obiang também se vale de lobistas norte-americanos.
A
ação de lobistas foi utilizada para aproximar empresas e o governo
norte-americano da Guiné Equatorial, um dos maiores produtores de petróleo da
África. Perto do dinheiro gasto com este fim, o patrocínio à Beija-Flor é sim,
dinheiro de pinga, como escreveu Kiko Nogueira do Diário do Centro do Mundo.
Entre
2010 e 2011, o lobista norte-americano Lanny Davis recebeu mais de R$ 1 milhão
para “aconselhar” Obiang em um “amplo programa de reformas políticas, jurídicas
e econômicas”, além de implementar “um efetivo plano e mídia e política
comunicacional nos EUA”, como informou uma reportagem do Huffington Post de 2013.
Ativistas
de direitos humanos questionam a chamada dupla moral dos Estados Unidos com
certos governos africanos. Apesar de criticar, mais de uma vez, a falta de
liberdades individuais, de imprensa, o uso sistemático de torturas nas prisões
e a perseguição de opositores, os Estados Unidos — um dos principais
compradores do petróleo guinéu-equatoriano — não impuseram nenhum tipo de
sanção econômica ao país. Em 2007, a ex-secretária de Estado dos EUA Condolezza
Rice recebeu Obiang para uma reunião em Washington e o presidente Barack Obama
o recepcionou em 2009.
De
acordo com Joshua Kurlantzick, no site da revista Mother Jones, em 2007, a recepção não foi mais do que
um pagamento aos serviços da empresa lobista e de comunicação Cassidy e
Associados. Novamente, o dinheiro dado à escola da comunidade de Nilópolis é
troco de pão. Informações do Departamento de Justiça dos EUA revelam que de
2004 a 2007 foram pagos pelo menos US$ 120 mil por mês para reparar a imagem do
país. A Cassidy também ajudou a criar um fundo social no país com o dinheiro do
petróleo.
Da
mesma forma, a fundação Leon H Sullivan, conhecida internacionalmente pela luta
pelos direitos civis nos Estados Unidos, foi duramente criticada por sediar sua
bienal em 2012 na Guiné Equatorial. Em seu site, a Leon Sullivan afirmou que o
país “apreciava o período mais produtivo de paz, estabilidade e desenvolvimento
de sua história”. O fato foi criticado por ativistas que consideraram a ação
como mais uma vitória dos relações públicas que atuam para minimizar os danos
de imagem causados pelo governo do país.
Outro
fruto desse esforço foi a escolha da Guiné Equatorial para sediar a Copa da
Nações Africanas, realizada este ano no país, vencida pela Costa do Marfim. O
torneio seria sediado pelo Marrocos, que rejeitou ser palco da competição
diante do surto de ebola em diversas nações do continente. Em 2012, o país já
havia sediado a copa local, junto com o Gabão.
Pobre
país rico
No
centro da polêmica em torno do país está o fato de que, mesmo com os altos
ganhos obtidos com a venda do petróleo, principal produto de exportação, a
população local continua vivendo em situação de miséria. De acordo com o Banco
Mundial, 77% das pessoas vivem na pobreza extrema, com menos de US$ 2 por dia.
Não há liberdade de expressão, a única emissora de televisão é operada pelo
Estado. As eleições são contestadas por observadores internacionais como a HRW
(Human Rights Watch) e opositores ao governo são perseguidos, também conforme
denúncias de ONGs internacionais.
Além
disso, um em cada três guinéu-equatorianos morrem antes de completar 40 anos. A
taxa de mortalidade infantil é de 206 a cada mil nascidos.
O
diretor do HRW, Arvind Ganesan, no entanto, afirmou que a Guiné Equatorial “é
um país onde as pessoas poderiam ter a riqueza per capita da Espanha
ou Itália, mas em vez disso, vivem em condições comparáveis ao Chade ou à
República Democrática do Congo”.
Enquanto
isso, uma investigação realizada pelo Senado norte-americano sobre um banco
local identificou que a família de Obiang recebeu pagamentos vultuosos de
petroleiras americanas, como Exxon Mobil e Amerada Hess, como informou a
emissora BBC.
A fortuna de Obiang é estimada em US$ 600 milhões.
Na
mesma linha, o filho de Obiang, Teodorin, que é ministro e candidato a
sucedê-lo no cargo, é acusado por advogados do Departamento de Justiça dos EUA
de usar sua posição para acumular mais de US$ 100 milhões entre corrupção e
lavagem de dinheiro. No ano passado, foi forçado a abdicar de mais de US$ 30
milhões em ativos nos EUA, que autoridades alegam ter sido comprados com
dinheiro roubado.
Na
foto: Michele e Barack Obama recepcionam Obiang em Nova York - Wikicommons
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