Paulo
Baldaia – Diário de Notícias, opinião
O
PS continua favorito para vencer as eleições e até podia perdê-las com a honra
de assumir as grandes causas que transportam as diferentes ideologias, mas
prefere arriscar a ganhá-las sem ideia nenhuma que fique para o futuro. Pode
parecer que faz todo o sentido aparentar ter soluções para tudo, mas os
portugueses desconfiam de tanta bonança e sabem que é preciso definir
prioridades, hierarquizando os problemas e assumindo opções. A prioridade
atribuída pelo PS à classe média é errada porque nem reflecte a necessidade de
resolver as desigualdades sociais, nem estabelece nenhuma diferença em relação
à prioridade do centro-direita.
Num
país em que as desigualdades sociais são um problema estrutural e a pobreza
cresceu espera-se mais de um partido de esquerda. Fica a ideia de que António
Costa não se encontrou e não se quer comprometer com nenhum caminho que possa
impedir uma vitória que os socialistas vêm como natural. Uns dias coloca a
tónica na pobreza que atinge de forma dura as crianças e na necessidade de
combater as desigualdades sociais, no outro assume de forma clara que a
prioridade é a classe média e a descida de impostos. Ninguém combate a pobreza,
que precisa de mais despesa pública, prometendo baixar impostos e garantindo o
equilíbrio orçamental. A maioria insistirá em colar o actual PS às
irresponsabilidades do passado e a esquerda insistirá na impossibilidade de
tirar o azimute à política socialista. Afinal, o que é que eles querem? Não se
sentem na obrigação de explicar com clareza o modelo de sociedade que defendem
para o país?
Quem,
como eu, já deu como garantida a impossibilidade da actual maioria, que
governou em forte austeridade, ganhar as eleições, corre o sério risco de ter
de engolir um sapo gigante. É certo que PSD e CDS vão ter pescar à linha para
ter votos entre os pensionistas e funcionários públicos, mas podem pescar de
arrasto entre a classe média que se safou desta crise. Os que viram amigos e
familiares perder o emprego, mas que mantiveram o seu, mesmo com redução de
rendimento, não quererão correr o risco de uma mudança de rumo. A prioridade
dada pelo PS à classe média não é uma opção política, parece mais uma jogada
eleitoral para desestabilizar a base de apoio da actual maioria. Na verdade, o
PS está a tentar pescar votos em todas as latitudes, mas assumindo não ser nem
carne, nem peixe, arrisca-se a ter de dividir o eleitorado contestatário, que
tem como prioridade tirar o PSD e o CDS do governo, com os outros partidos de
esquerda e com os que nascem agora para destabilizar o sistema. O resultado é
imprevisível. O fetiche pela classe média já deu muitas vitórias ao PS e ao
PSD, mas o mundo mudou.
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