Recentemente,
provavelmente a partir dos primeiros dias do mês em curso, o Serviço de
Inteligência e Segurança de Estado (SINSE) deu a conhecer à Casa de Segurança
do Presidente da República que estariam em curso preparativos para um suposto
golpe de Estado, em Luanda, visando destituir o Presidente José Eduardo dos
Santos das suas funções à frente do Estado angolano.
António
Setas
Tal
táctica já foi aplicada várias vezes pela Inteligência angolana, nomeadamente
por ocasião da destituição de Fernando Miala, chefe da Secreta exterior de
Angola, em 2006, e numa operação visando Isaías Samakuva, presidente da UNITA,
maior partido da oposição angolana. Neste caso, a démarche visava solicitar uma
“autorização superior” (ao presidente da República) a fim de realizar uma
operação partilhada com o Serviço de Investigação Criminal (SIC), antiga DNIC.
Foi
o que aconteceu a partir da sexta-feira (19) e neste fim de semana ((20 e 21 de
Junho), em que várias operações conjuntas foram levadas a cabo em todo o país e
delas resultou a detenção de cerca de um vintena de cidadãos que estariam
comprometidos com o suposto “golpe de Estado”.
Os
detidos são jovens activistas notabilizados por realizarem protestos e
manifestações públicas contra abusos de direitos humanos, em Luanda. Entre eles
destacam-se o cantor rapper, Luaty Beirão, o ex-preso político de menoridade
Manuel Nito Alves, os dois irmãos Nelson Dibango, Mbanza Hanza, Nicolas de
Carvalho, Albano Bingo, que foram detidos nas suas residências e viram os seus
computadores serem confiscados.
O
arresto de Luaty Beirão é um caso à parte, melhor conhecido dada a sua
notoriedade. O músico e activista, quando falava na rua com amigos, sexta-feira
(19) por volta das 17 horas, foi detido e levado já algemado a sua casa em Luanda
por três agentes do SINSE e 8 agentes da Policia de Investigação, que se
fizeram transportar numa carrinha land-cruiser sem matricula.
Os
agentes confiscaram o seu computador e telefone, mais a máquina fotográfica e
outros engenhos electrónicos no valor total de mais de 20 mil dólares. O pedido
da família do activista a solicitar a presença de um advogado foi ignorado
pelos agentes armados que se encontravam no local.
O
SINSE apresentou como prova dos preparativos do suposto “golpe de Estado”,
material de uma palestra que os jovens tinham intenção de realizar neste sábado
(20) no bairro Nelito Soares da periferia de Luanda, subordinada ao tema
“filosofia ideológica da revolução pacifica versus como derrubar um ditador”.
Essa palestra não é a primeira do género, pois antes dela houve outras, tendo
como orador o filósofo e jornalista Domingos da Cruz.
Este
último, tendo visto as coisas mal paradas, largou de Luanda, mas foi igualmente
preso domingo (21) no interior do país. Sedrick de Carvalho, um jornalista do
Folha 8, que devia fazer cobertura da palestra, acabou também por ser detido
pela polícia de investigação.
Tal
como refere o Rede Angola, “no total, foram presos dois grupos: um, que se
preparava para assistir à palestra e outro integrado, entre outros, por Luaty
Beirão, o ex-prisioneiro político de menoridade, Manuel Nito Alves e Nelson dos
Santos, que foram detidos na rua ou nas suas residências sem que estivessem
envolvidos com a realização da palestra, a qual, na versão do aparelho da
Segurança transmitida à Presidência da República constitui uma das ferramentas
dos preparativos para o “Golpe de Estado.”
Logo
a seguir às detenções, o director do Serviço de Investigação Criminal (SIC),
Eugénio Pedro Alexandre, foi instruído a emitir um comunicado de imprensa
justificando que os referidos cidadãos foram presos porque “se preparavam para
realizar actos tendentes a alterar a ordem e a segurança pública do país”. Esse
comunicado da SIC alega que “durante a operação foram apreendidas uma série de
provas”.
Note-se,
neste ponto, que o SIC, mais sensato do que o SINSE, refere-se a “actos
tendentes a alterar a ordem e a segurança pública do país” e não a um "Golpe de
Estado”.
Por
seu lado, o site do Facebook do Club-k refere que as autoridades policiais
iriam apresentar nos próximos dias os fascículos e livros (sobre derrube de
ditadores) que deviam servir de material de apoio da palestra como prova dos
preparativos do suposto “Golpe de Estado”. Ao mesmo tempo ocorrerão mais
detenções de activistas em Luanda, remata o referido site.
Enfim,
a denunciar as recorrentes “subtracções ao erário público” por via de falsas
alertas à segurança do Estado, as detenções ocorridas em Luanda e a tese do
suposto “golpe de Estado” estão a ser acompanhadas por “antipatias por parte de
uma corrente interna do SINSE” refractária quanto à postura de alguns dos seus
superiores hierárquicos, suspeitados de estar a recorrer a tais pretextos para
obtenção de dividendos económicos pessoais, uma vez que sabem muito bem que o
Presidente José Eduardo dos Santos é bastante sensível ao tema de “golpe de
Estado” e pensam que esta encenação é pouco mais que um mau plágio do que
aconteceu nos casos Miala e UNITA/Samakuva supra citados.
Folha 8 (ao) - Foto
de arquivo
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