Aline
Frazão – Rede Angola, opinião
Depois
das primeiras 72 horas, a aflição da fome tende a desaparecer. A partir do
terceiro dia, o corpo começa a transformar as reservas musculares em energia
para poder funcionar. Os níveis de potássio e de outras vitaminas vai baixando
para níveis críticos. O corpo perde gordura e massa muscular. Depois de duas
semanas, aumentam as tonturas, calafrios, fraqueza, falta de coordenação motora
e tensão baixa. Os baixos níveis de vitamina B1 podem causar danos
neurológicos. Quatro semanas depois, existe o risco desses danos serem
irreversíveis. O perigo de morte é elevado.
As
greves de fome são um protesto extremo. Historicamente, foram usadas como o
último recurso usado por activistas políticos para conseguir os seus
objectivos. Destacam-se os casos de Mahatma Gandhi que, mais de uma vez usou
com sucesso esta forma de resistência pacífica, e da greve de fome dos sete
presos políticos irlandeses, do IRA, em 1981, que terminou com a sua morte.
O
objectivo de se fazer uma greve de fome é, fundamentalmente, pressionar o lado
oposto, colocando a responsabilidade pela sobrevivência dos manifestantes nas
mãos do poder, na esperança que surja algum sentimento de culpa ou compaixão.
Isto só se consegue, normalmente, se existir uma enorme corrente na sociedade
civil e opinião pública que leve as autoridades a ouvir e negociar com quem
está em greve de fome, de forma a preservar as suas vidas e evitar o pior
desfecho.
Já
é sabido que, à meia-noite do dia 21 deste mês, quatro dos presos políticos
angolanos deram início a uma greve de fome. A notícia caiu como uma bomba de
desespero e indignação entre todos aqueles que se preocupam, de facto, com este
caso que tem marcado intimamente a nossa realidade política.
O
cenário não é optimista. Do lado do poder, há semanas que se joga o jogo do
silêncio e parece haver pouca preocupação com a saúde física e psicológica dos
activistas, confinados em pequenas celas solitárias há mais de 90 dias, alguns
deles com graves problemas de saúde.
Este
tipo de protesto só faz sentido quando do outro lado existe o mínimo de
bom-senso e genuína preocupação com a vida e com os direitos humanos. Caso
contrário, a resistência pacífica pode ser uma decisão calamitosa, por mais
honrada e respeitável que seja.
Quero,
mais uma vez, confiar que em Angola haverá, bem lá no fundo, essa preocupação,
nem que seja pela imagem que se passa lá para fora, da qual será cada vez mais
difícil escapar. Pessoalmente, não quero mais páginas de luto na história do
meu país e acredito que o diálogo é possível, tendo a lei e a Constituição da
República como mediadores o mais isentos possível. Não hesito um só segundo em
pensar que uma solução é possível. Dela só depende haver vontade política.
Usaria
todas as mais poderosas e honestas palavras, se soubesse, se conseguisse, para
apelar mais uma vez ao bom-senso das autoridades. Libertem estes jovens,
prossigam com a investigação que entenderem até haver provas que justifiquem
este calvário. Evitem uma tragédia. Não queremos mártires. Queremos estes
jovens livres para exercerem a sua cidadania com energia e contribuírem para um
país melhor para todos, mais justo para todos, com espaço para todos.
O
relógio, esse, não para. E se tivesse poderes especiais, viajaria até às suas
celas e diria, bem perto dos seus ouvidos: “Resistam. Não estão sozinhos.”
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