segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Hong Kong. Um ano após a ocupação das ruas, as atenções viram-se para eleições



Hong Kong, China, 21 set (Lusa) -- Um ano depois da ocupação das ruas em Hong Kong contra a reforma política proposta por Pequim, todos os olhos estão postos nas eleições locais de novembro e nas de 2016, quando for eleita a nova composição do parlamento.

Com o chumbo do plano de reforma política a 18 de junho, mantém-se o 'status quo', ou seja, em 2017, o chefe do Executivo de Hong Kong vai continuar a ser eleito por um comité de cerca de 1.200 membros.

Mas ao invés de "impasse", Suzanne Pepper, investigadora do Centro de Estudos Chineses da Universidade Chinesa de Hong Kong (CUHK na sigla inglesa), prefere a expressão "compasso de espera" para definir o atual momento político: "Penso que se as pessoas continuarem a discutir, Pequim eventualmente vai dar [o sufrágio universal], mas está à espera de ver como correm as eleições".

A investigadora refere-se à eleição para o lugar vago deixado no Conselho Legislativo com a demissão do pró-democrata Ronny Tong (que se arrependeu de ter votado contra a reforma proposta por Pequim), às eleições para o District Council (os órgãos municipais, em novembro) e às eleições para o Conselho Legislativo (parlamento) em 2016.

"Pequim está à espera que haja mais moderados eleitos e isso dir-lhe-á se é boa ideia continuar a pressionar para um modelo de eleições ao estilo do interior da China, ou seja, controladas pelo partido, ou não, no caso de os pró-democratas --que têm estado a reclamar eleições ao estilo ocidental --, conseguirem lugares extra, pois a proposta para a eleição do chefe do Executivo requer uma maioria de dois terços no parlamento para passar", explica, em declarações à agência Lusa.

Hong Kong vive atualmente "uma competição entre dois tipos de eleições" e "uma manifestação não é suficiente para convencer as pessoas: isso só pode acontecer através de muitas conversas, de reuniões, de petições", afirma, salientando a importância do tempo para passar a mensagem à população.

Grandes manifestações já surtiram efeito no passado em Hong Kong, nomeadamente em 2003, quando meio milhão saiu à rua contra a regulamentação do artigo 23.º da Lei Básica e o governo adiou a proposta 'sine die', ou em 2012, quando foi retirada a proposta de introdução da Educação Patriótica nas escolas do território. Mas para mudar o sistema, diz Suzanne Peper, "as manifestações não chegam, é preciso um movimento mais abrangente".

"Se vais ter democracia, queres que toda a gente vote. E para isso, as pessoas devem perceber em que tipo de sistema vão votar, e qual é a diferença entre votar num candidato nomeado por Pequim ou noutro candidato que a maioria decidiu apontar. Foi isso que o Occupy fez: levou as pessoas para a rua, e toda a gente se sentou e começou a falar".

A ex-colónia britânica foi devolvida à China, em 1997, sob o princípio de "um país, dois sistemas", que promete manter os sistemas sociais e económicos da cidade até 2047. Um conjunto de direitos e regalias que, segundo Suzanne Pepper, a população de Hong Kong tinha assumido como "algo permanente, que nunca vai mudar", e que a ocupação das ruas permitiu voltar a trazer para a discussão.

"As pessoas começaram a pensar 'como é que vai ser este sítio se continuar a evoluir ao estilo do interior da China'. (...) Foi isso que os jovens começaram a perceber e tudo isso veio do debate durante o Occupy", que foi "um grande exercício de consciencialização política", aponta.

O professor Leung Yan Wing, do Instituto de Educação de Hong Kong, também refere o período pós-2047: "Ninguém sabe se a promessa de 'um país, dois sistemas' vai expirar, por isso, o mais importante é não limitar a reforma política a 2017".

O académico vê os últimos meses como um período de reflexão dos estudantes, uma altura em que algumas associações universitárias se desvincularam da Federação de Estudantes e surgiram "mais grupos com diferentes abordagens", apesar de trabalharem com vista ao objetivo comum do sufrágio universal e dos valores da justiça social.

"Embora este movimento tenha sido reprimido, o ganho é muito maior do que a perda, porque toda a geração ficou mais sensibilizada e alertada para os valores da justiça. Embora tenham experimentado a perda, a depressão, penso que a longo prazo vai ser positivo", conclui.

FV (RCS)

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