terça-feira, 27 de outubro de 2015

Portugal. TACHOS DE LATA



Mariana Mortágua – Jornal de Notícias, opinião

Em 2011, Passos Coelho prometia não levar para o Governo "amigos, colegas ou parentes, mas sim os mais competentes". Para isso até criou a Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública (CReSAP). O leitor pode espantar-se, mas é esse mesmo Governo que acaba por fazer 14 nomeações definitivas para os Centros Distritais da Segurança Social, todas atribuídas a quadros do PSD e do CDS. E logo no Ministério de Mota Soares, campeão da demagogia antitacho.

O que é que aconteceu? Ao que parece, a incapacidade da CReSAP para realizar todos os concursos bastou para que fossem feitas várias nomeações de substituição, livres de quaisquer regras. Chegado o momento do concurso, esse tempo de substituição exercido nos cargos da Administração Pública contou como "experiência" no currículo destes militantes.

Os cargos intermédios também estão fora do crivo da CReSAP. E por isso foi possível ao Governo, já depois de convocadas as eleições, contornar a suas próprias regras e nomear centenas de dirigentes para a Função Pública. Segundo consta, no Ministério da Defesa até foram criados novos cargos na semana anterior às legislativas.

Apesar de todo o seu moralismo e arrogância, Passos Coelho não cumpriu nada do que prometeu. Só a hipocrisia do discurso se tornou mais sofisticada.

A nomeação de fiéis do partido para lugares no Estado é uma forma de recompensa às tropas, mas não é só isso. Em áreas tão delicadas como a Segurança Social, o assalto às esferas de direção possibilita a concretização de uma visão ideológica, sem escrutínio ou contestação. Por isso ninguém desafia ou denuncia, e por isso é tão difícil travar o desmantelamento dos serviços de proteção social ou a sua entrega a instituições privadas (também elas, muitas vezes, controladas pela Direita).

Saibamos separar o trigo do joio. A Administração Pública não se confunde com os "boys", muitas vezes incompetentes, colocados pelos partidos nos cargos dirigentes. Além deles, existe o esforço dos seus trabalhadores. Funcionários e quadros que o Governo prometeu proteger para acabar com os tachos, vindo a fazer exatamente o contrário.

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