segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Portugal. O BOM DA FITA: DESAPARECEU UM HOMEM. OUTROS CÁ FICAM…




Por imensas razões este é um dia negro. A começar pelas carências de que povos no mundo enfermam. Incluindo os portugueses. A miséria – mais ou menos envergonhada – bateu à porta de inúmeras famílias em Portugal enquanto um traste de presidente da República e um governo sugam desalmadamente os que já quase nada têm. Este também é um dia negro pelos que no sul de Portugal, no Algarve, foram vítimas da intempérie agravada que os assolou e destruiu os seus haveres domésticos, comerciais, empresariais. Albufeira ficou arrasada, em Boliqueime, terra de Cavaco Silva, desapareceu um homem, idoso. Houve quem admitisse que tivesse sido Cavaco. Mas não. Foi um plebeu. Um pobretanas, vítima das políticas de Cavaco e do seu governo. Para azar não foi Cavaco que desapareceu. Mas há-de desaparecer. Daqui, da vida, todos saem.

Outro homem desapareceu. Um grande homem das artes cinematográficas: José Fonseca e Costa. Um fundador do Centro Português de Cinema e do Cinema Novo de Portugal. Realizador e contador de histórias no celulóide. As cenas dele cabiam desde o Vá-Vá (Alvalade) ao resto do mundo. Um mundo que o Zé queria muito melhor. Era, então, um coletivista. Um Otelista nos tempos do Verão Quente. Contrariado rendeu-se ao que foi inevitável. O que ele queria era realizar os seus filmes… mas não era bem quisto pelos regimes que marchavam a passos largos para a direita, para a direita, para a direita.  E agora olhem como estamos. Ramalho Eanes foi então o “mestre” de cerimónias da contra-revolução. Um choque entre o Zé e o Fernando (Lopes) – um Eanista – outro realizador que já se foi. Até lá. Obrigado pelos legados que nos deixaram. Passaram, por isso, a imortais. A cultura agradece-vos. Nós também.

Desapareceram dois homens. Um algarvio plebeu – não foi Cavaco – e um grande realizador de cinema. Acima de tudo um grande homem do Cinema. Certo das suas visões, questionando as suas obras: José Fonseca e Costa. Como os anos passam depressa, Zé Fonseca!

Até breve.

Ricardo Costa, diretor do Expresso, abre o Expresso Curto com o Zé. Sentiu. É assim mesmo.

Redação PG / MM – foto Global Imagens

Bom dia, este é o seu Expresso Curto

Ricardo Costa - Expresso 

A vida é dura (põe-te em guarda)

Hoje é um daqueles dias em que preferia não fazer o Expresso Curto. Morreu ontem o José Fonseca e Costa e gostava de não ser eu a escrever isto. Soube que estava muito doente há poucas semanas numa conversa com a Margarida Marinho, que estava a filmar com ele. O filme ficou por acabar, mas o Paulo Branco garante que será terminado. Antes assim, vamos poder ver o seu último filme e era isso que ele queria.

Conhecia o Zé desde que nasci, mas não é por isso que vai à cabeça do Expresso Curto. Leiam este artigo que o Jorge Leitão Ramospublicou no Expresso Online (O homem que gostava das mulheres) e percebem a sua importância para o cinema português.

O seu filme mais famoso foi o Kilas, o mau da fita, com Lia Gama no papel de Pepsi Rita, para quem Sérgio Godinho escreveu uma grande canção e, para não variar, uma fabulosa letra.

Disseram-me um dia, Rita (põe-te em guarda)
aviso-te, a vida é dura (põe-te em guarda)
e eu disse adeus à desdita
e lancei mãos à aventura
e ainda aqui está quem falou

(Põe-te em guarda). Todo o refrão da música vai assim, entre parêntesis. E é assim que andamos, vai quase para um mês. Quarta-feira passam trinta dias sobre as legislativas e não sabemos a quantas andamos. É verdade que já temos governo e que hoje, pela manhã, ministros e secretários de Estado vão ministérios adentro trabalhar. Mas também é verdade que este governo pode morrer daqui por oito dias.

Passos Coelho e Paulo Portas estão a fazer o programa sem saber se o texto é um princípio de vida ou um rol de últimas vontades. Seja o que for, está dependente de PS, Bloco e PCP chegarem a acordo, embora ninguém saiba bem de que acordo estamos a falar.

Ontem, Catarina Martins deu uma importante entrevista ao Diário de Notícias a dizer que vai haver fumo branco ("Já há acordo. As pensões vão ser todas descongeladas") e a explicar como algumas das medidas vão sendo aplicadas ao longo da legislatura, com algumas adaptações, ou como diria Vítor Gaspar, sendo calibradas(já tinha saudades do verbo calibrar, confesso).

O entusiasmo e a assertividade da líder bloquista estão a anos-luz da ponderação manifestada por Jerónimo Sousa na sua última ida à televisão. Mas também é verdade que muitos de nós, incluindo comentadores e políticos batidos, percebem pouco do que se passa dentro do PCP, das suas regras e funcionamento. Posso estar enganado - e os tempos não estão famosos para frases definitivas – mas é bastante provável que o PCP assine o acordo, apesar das aparentes divergências.

Ontem, na SIC, Marques Mendes voltou a defender que caso haja acordo Cavaco Silva dará mesmo posse a um governo minoritário do Partido Socialista com apoio parlamentar.

Até lá é seguir caminho, que as nossas vidas não permitem estas pausas dos políticos, que lá para meados/finais de novembro ainda vão estar entretidos, Palácio da Ajuda acima Palácio de São Bento abaixo, quem se senta onde, quem governa o quê e quem se opõe a quem. Como o País não pára e o Mundo muito menos, vamos às outras notícias.

OUTRAS NOTÍCIAS

Sabe aquela ideia de ir para eleições o mais depressa possível para conseguir uma maioria absoluta? Essa mesmo, aquela que seguramente – e com toda a lógica – anda pela cabeça de Pedro Passos Coelho e Paulo Portas, para aproveitar o desnorte do eleitorado socialista? Pois bem, foi isso que aconteceu ontem na Turquia, com Erdogan a ver o seu partido conseguir a maioria absoluta que lhe tinha escapado nas eleições de junho.

E o que e que eu tenho a ver com isso, perguntará uma boa parte dos eleitores? Tudo. Para começar, a Turquia é um país fundamental da NATO (garanto que não é piada para Catarina e Jerónimo), faz fronteira com a Síria, tem mais de um milhão de refugiados e é por lá que entra a maior parte dos europeus que se resolve alistar nas fileiras do Estado Islâmico (Daesh).

Pode ser que a Turquia se defina melhor no combate ao Daesh, numa altura em que a Rússia acaba de ir a jogo no velho estilo desconcertante de Putin. Uma das grandes, e tristes, notícias do fim de semana é exatamente a queda de um avião civil cheio de turistas russos na península do Sinai, no Egito.

Naquela zona, que faz fronteira com Israel há um pequeno grupo radical que jurou recentemente obediência ao Daesh e que reclamou a autoria de um atentado que teria feito cair o avião. Os peritos russos não acreditam e os egípcios também não. Aquele grupo terrorista não dispõe de armamento capaz de abater um avião a voar a tão grande altitude.

Pelo sim pelo não, várias companhias aéreas já deixaram de sobrevoar a zona até que tudo seja esclarecido, embora a tese do atentado com um míssil continue a parecer remota. Mais provável, apesar de tudo, é que tenha existido uma bomba a bordo, já que o avião parece ter-se desintegrado no ar.

O dinheiro pago pela PT aos acionistas da OI em 2010 faz a manchete do Público. As autoridades policiais que investigam o negócio Oi-PT suspeitam da existência de movimentos que terão facilitado as autorizações políticas. Estes poderão ter partido das construtoras brasileiras, após receberem o dinheiro devido pela PT. O negócio, recorde-se, teve envolvimento direto de José Sócrates e Lula da Silva.

Numa decisão rara, o Supremo Tribunal de Justiça condenou um experiente médico a pagar €300 mil por erro clínico. Terá agido “culposamente” ao perfurar o intestino de uma doente na sequência de uma colonoscopia, adianta o DN.

Já o i faz manchete com um tema aparentado, para nos dizer que as vítimas de negligência médica esperam por vezes 12 anos por Justiça.

Nas primeiras páginas de quase todos os jornais estão imagens ou notícias sobre a tempestade que se abateu sobre o Algarve, em particular Albufeira, que ficou irreconhecível e submersa. O rasto de destruição é enorme e há um desaparecido. As imagens da SIC são impressionantes.

João Sousa também está pelas primeiras páginas matinais e com toda a razão. O tenista ganhou em Valência o segundo título ATP da sua promissora carreira.

FRASES

“Só não há Governo à esquerda se não houver acordo”. Marques Mendes, Jornal da Noite da SIC

“Coligação PS, PCP e BE é um mero acordo para chegar ao poder”.Miguel Poiares Maduro, ex-ministro e agora regressado à vida académica

“O lógico seria que me deixasse encantar pelo rugby, apesar de para mim ser já demasiado tarde”. John Carlin, grande conhecedor do futebol num excelente artigo publicado no El País sobre as lições que o Mundial de Rugby deu ao futebol

O QUE EU ANDO A LER

Antes do que eu ando a ler, uma curta citação para quem gosta de aniversários:

“No primeiro dia de novembro de 1755 Lisboa foi arruinada pelas forças combinadas de um sismo violentíssimo e invulgarmente longo, uma maremoto que lançou ondas gigantes sobre a costa e diversos incêndios, um dos quais consumiu todo o centro da capital portuguesa”.

A citação é de ”O Pequeno Livro do Grande Terramoto”, de Rui Tavares, editado em 2005 na Tinta da China, e um dos ensaios mais originais sobre o terrível terramoto, que ontem teve mais um aniversário. Vale a pena.

E agora, sim, o que eu ando a ler. Um livro que vai dar que falar, porque é muito bom e porque tem como objeto um tema fascinante, polémico e divertido. Estou a falar de “O Independente, a máquina de triturar políticos”, do meu colega de redação Filipe Santos Costa e de Liliana Valente, jornalista do Observador. O Filipe passou alguns meses no Independente antes de aterrar no Expresso, a Liliana foi a última estagiária do jornal fundado porPaulo Portas e Miguel Esteves Cardoso para dar cabo do cavaquismo e que acabaria por morrer sem dar cabo do seu objeto de estimação, mas dando-lhe luta incessante, mãos-cheias de capas inesquecíveis, títulos mirabolantes, boas histórias e carradas de frases curtas e adjetivos superlativos.

O livro chega às livrarias no final da semana, editado na Matéria-Prima, e eu já o ando a ler porque me calhou na rifa fazer uma recensão para a Revista do Expresso.

O livro é sistemático e divertido, implacável no escrutínio e bem-disposto nas citações e conclusões. Passa a pente fino todas edições até 1995, ano em que Portas troca o jornalismo pela política e Vasco Pulido Valente se alista como deputado do PSD, num momento profundamente ridículo do cronista que mais tinha descrito a "vulgaridade" do cavaquismo. Poucos meses depois, foi a vez de Paulo Portas apelar ao voto em Cavaco nas presidenciais num discurso no Parlamento que contrariou tudo o que tinha escrito antes.

Os autores já andam a mostrar algumas coisas do livro no divertido blog Livroindy, onde lembram algumas das melhores histórias de O Independente. É ir lendo os posts até ao lançamento marcado para quinta-feira na FNAC do Chiado, com apresentação de Ricardo Araújo Pereira e João Miguel Tavares.

O Expresso Curto regressa amanhã bem cedo. Até lá vá seguindo a atualidade no Expresso Online, que bateu mais um recorde de audiência em outubro. Ao fim do dia os nossos assinantes e leitores têm direito a mais um Expresso Diário, com informação e opinião exclusiva. Bom dia.

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