Tudo
o que se passa num país que deu o nome a uma das mais sinistras prisões dos
Estados Unidos e onde estarão alguns dos mais perversos prisioneiros – ou
considerados como tais – fez-me recordar um livro de Irving Wallace – O
Documento R – sobre as coincidências de factos que, de tanto repetidos,
deixam de poder serem considerados como meras coincidências. O enredo passa-se nos
EUA.
Uma
das referidas coincidências está na repetição de detenções de pessoas que, num
imediato olhar, parecem nada terem a ver umas com as outras, até pelas
distâncias e comportamentos sócio-económicos que as distinguem, mas que com o
desenrolar do enredo se verifica que todas eles têm algo em comum: não gostam
de verem alguns dos seus mais elementares direitos serem coartados por aqueles
que, à partida, deveriam ser os garantes da preservação desses direitos.
Outra
das coincidências surge com o facto dos detidos ou perseguidos serem leitores
de livros que, certas autoridades – e à revelia e desconhecimento efectivo das
principais autoridades, como se verifica nos últimos capítulos – consideram
serem demasiado progressistas ou incentivadores de condutas que possam pôr em
causa o status quo vigente.
Ora
o que os mentores dessas perseguições e detenções concebem é criar uma imagem
dos visados, para a opinião pública, que o que eles pretendem é desvirtuar a
bondade do sistema tentando provocar, com isso, uma crise política, social e,
principalmente, institucional.
De
acordo com os tais mentores a solução passaria por alterar as normas em vigor,
sejam políticas ou judiciais a fim de criar uma qualquer emergência nacional
através de “(…) fazer algo pelo povo que ele não pode fazer por si mesmo.
Dar segurança às suas vidas. (…) poremos em execução todas as nossas
prorrogativas legais ao abrigo da emenda [seria uma 35ª emenda à
constituição dos EUA que, após aprovada e sob a sua tutela, seria posta em
execução num eventual e ehipotético caso de emergência nacional] (…) Não há uma
nacional emergência efectiva. (…) {e para isso] 8…) terá de existir uma crise
real… uma emergência… uma conspiração… antes de podermos actuar. (…) Mas
podemos, Noah, porque teremos a nossa emergência, a nossa crise. Isso
arranja-se (…)” (pág. 309). E uma das razões para emergência seria a
possibilidade de “assassínio (…) do Presidente” e de eventuais
conspirações “para subverter a nação”. Ora no texto surge que quando se receia
um certo tipo de batalha “nos agarramos a qualquer expediente” (pág.310).
E
parece que, recentemente, tem acontecido muito disto. Teoria da conspiração?
Talvez.
Mas
quando as coincidências são demasiadas e contínuas, quando algumas
personalidades fazem uso repetitivo de certas frases para suportarem supostos
factos em vigor, quando quem deveria aparecer mais vezes junto do povo
raramente surge e, por vezes, delega funções em terceiros, as coincidências
tornam-se ilusórias.
Recordando
uma série televisiva norte-americana passada entre área castrense, uma das
personagens costuma dizer – mais ou menos – que quando as coincidências são
demasiadas coincidentes, deixam de ser coincidência e passam a ser,
preocupantemente, reais ou verdadeiras!
Claro
que isto é só uma imagem e uma ideia literária de uma certa situação que é
meramente coincidente com o que se passa no livro de Wallace. Claro!
Claro
que é só um conto literário, nada mais; talvez um incentivo a escrever um
romance…
*Investigador
do CEI-IUL e CINAMIL - Na foto: Eugénio Costa Almeida
**Eugénio
Costa Almeida* – Pululu -
Página de um lusofónico angolano-português, licenciado e mestre em Relações
Internacionais e Doutorado em Ciências Sociais - ramo Relações
Internacionais -; nele poderão aceder a ensaios académicos e artigos de
opinião, relacionados com a actividade académica, social e associativa.
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