sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

São Tomé e Príncipe. A VEZ DOS BRONCOS



Adelino Cardoso Cassandra – Téla Nón, opinião

Age de tal maneira que a máxima da tua ação possa tornar-se uma lei geral para todos os seres dotados de inteligência. Esta formulação Kantiana, num contexto sociocultural e político como o nosso, bem poderia servir de referência simbólica para a mudança comportamental que todos desejamos, sobretudo num país onde, voluntária ou involuntariamente,ainda se faz tábua rasa de todos os compromissos políticos, de leis e de cumprimento de obrigações.

Esta deveria ser, aliás, o slogan, transversalmente assumido e praticado, para quem se predispôs, voluntariamente, transformar o país num novo Dubai até como forma de mobilização popular. Mas, infelizmente, constata-se exatamente o contrário.

Tudo isto vem a propósito da última notícia que recebi relacionada com o facto da EMAE – Empresa de Água e Eletricidade – ter cortado a luz no renovado aeroporto do Príncipe pelo facto da ENASA – Empresa Nacional de Aeroportos e Segurança Aérea – não ter cumprido as suas obrigações financeiras para com aquela empresa. Segundo as notícias, tal facto já dura há uma semana.

Quando li a notícia em causa pensei que estávamos em presença de uma brincadeira, idêntica àquela que se faz no dia um de abril ou, em alternativa, que fosse um lapso jornalístico. Soube, posteriormente, que não se tratou nem de uma coisa nem da outra. Tratava-se de pura realidade e com efeitos já dramáticos, em termos operacionais, para o referido aeroporto regional com todas as consequências que isto acarreta.

Infelizmente é este o Dubai que o Patrice Trovoada está a construir depois de ter feito implodir todas as empresas públicas, repartições e direções estatais, destituindo os anteriores diretores e chefias intermédias das mesmas, e ter colocado nelas, em substituição, autênticos broncos, mais propensos ao seu proclamado ativismo reformador inconsequente e manifestação de mimetismo perante a imagem do chefe.

Temos agora, nestas empresas, os broncos de serviço, sem quaisquer qualificações dignas para o efeito, bom senso e sentido de responsabilidade, que, a reboque do plano melodramático para a construção do Novo Dubai, passam a vida a tomar decisões, arquitetar diatribes e disseminar malfeitorias em toda a extensão territorial nacional com reflexos dramáticos no tecido económico, empresarial e social do país.

Ninguém consegue meter ordens nestes broncos de serviço que se estão a transformar numa autêntica praga prejudicando os esforços de outrem no processo de revitalização económica e social do país, na atração do investimento estrangeiro e na própria mudança da imagem externa do país.

Este caso do aeroporto regional do Príncipe já é o terceiro,em termos de impacto mediático negativo avassalador para a imagem externa do país, que estes broncos germinaram e desenvolveram, provavelmente com alguma satisfação e empenho político hierárquico, sem consequências para os próprios, tendo em conta a sua natureza de eternos inimputáveis.

O primeiro,destes casos, tem a ilha do Príncipe como epicentro, tendo em conta que um bronco qualquer resolveu criar condições que impediram o empresário ClaudioCorallo, radicado já há algum tempo nesta parcela do nosso território, de exportar o seu chocolate para o exterior.

Tal facto teve impacto bastante negativo na empresa do referido empresário, extensível aos seus trabalhadores e colaboradores, sendo que este deixou de poder comprar cacau, aos produtores do referido produto, no contexto regional, com todas as consequências negativas para a economia daquela parte no nosso contexto arquipelágico.

O segundo, destes casos, também tem, indiretamente, a ilha do Príncipe como epicentro, na medida que o mesmo empresário, Claudio Corallo, provavelmente o maior exportador privado nacional, apesar de todos os esforços e empenho pessoal, foi excluído de dar a sua participação, como especialista de renome internacional na área de chocolate, como contributo na promoção da imagem do país, na exposição mundial que decorreu em Milão e que o país participava sob o slogan “S. Tomé e Príncipe – Ilha do Cacau”. Mais uma vez um bronco qualquer resolveu dar cabo do país, por um capricho insano qualquer, em nome de uma causa que ninguém consegue descortinar de forma objetiva.

Agora os tais broncos deixaram o senhor Claudio Corallo em paz e resolveram transferir todas as suas baterias para o recém-inaugurado aeroporto regional do Príncipe. Queriam causar impacto negativo avassalador, destrutivo e humilhante, extensível a toda comunidade regional.

Por isso, nada melhor que um aeroporto recém-inaugurado. Seria uma boa oportunidade para a manifestação de autoridade e, ao mesmo tempo, de fidelidade ao líder do grupo. Nem sequer se importaram com o impacto extremamente negativo, do ponto de vista operacional,de segurança aérea e de transtorno, que uma medida desta, corte de energia a um aeroporto, poderia causar, para além da imagem negativa que transmite aos empresários estrangeiros já radicados no contexto regional ou que queiram vir investir no país ou na região.

Quem vai investir num país onde os broncos têm o sacrossanto poder de mandar cortar a energia de um aeroporto regional prejudicando todo o tipo de negócios relacionados, a montante e jusante, com este equipamento estratégico para desenvolvimento de qualquer país ou região? Quem vai viajar entre as ilhas se um bronco qualquer pode, quando bem lhe convém, mandar cortar a energia de um aeroporto regional que suporta esta ligação inter-ilhas?

Nunca imaginei que fosse tão fácil e materializável a ideia de cortar o fornecimento de energia de um aeroporto por tão pouco. Não se corta o fornecimento de energia de uma empresa estratégica como um aeroporto como se fosse uma casa particular sendo, ainda, as empresas envolvidas neste conflito, de capitais públicos que deveriam falar entre si em prol do desenvolvimento do país. Isto não acontece em nenhuma parte do mundo a não ser num país onde os broncos ambicionam governar.

Além disso, o aeroporto regional do Príncipe é o único espaço público, no contexto nacional, que tem dívidas para com a EMAE? Se não é, qual o critério associado a este ato discriminatório? Na eventualidade de acontecer qualquer acidente no aeroporto regional do Príncipe, decorrente desta decisão, os broncos da EMAE que tomaram esta iniciativa responderão por seus atos?

O que me intriga, todavia, é que há algo, comum nos três casos, que não consigo compreender, por mais esforço que faça. Todos eles indiciam preocupação, irresponsabilidade em termos de gestão, desnorte, incompetência, incúria e, até, bandalheira institucional, com prejuízos para a imagem do país, e não se ouviu, por uma vez que seja, a opinião do senhor primeiro-ministro, Patrice Trovoada, sobre os mesmos. São, de facto, casos gravíssimos, que, ciclicamente, tendem a manifestar, e o senhor primeiro-ministro não emite qualquer opinião sobre os mesmos apesar de, diariamente, falar sobre quase tudo e até contradizer alguns dos seus ministros sobre outros factos.

Ou o senhor primeiro-ministro está perfeitamente informado sobre os contornos dos três casos e desvalorizou-os porque entende que não são suficientemente graves para o país; ou, em alternativa, está suficientemente informado sobre os mesmos, desde a sua génese, sendo ele mesmo parte integrante e principal responsável pela criação, manifestação e desenvolvimento dos mesmos com objetivos que ninguém descortina sem especulação associada.

Qualquer das opções anteriores encerra um grau elevado de irresponsabilidade política até pelo facto de eu não considerar o senhor primeiro-ministro um ingénuo neste domínio. Portanto, acho que o senhor primeiro-ministro deve explicações ao país sobre estes três casos e se não o fizer só posso concluir, com pena minha, que o senhor primeiro-ministro é, ele mesmo, um potencial bronco que está totalmente convencido que os broncos podem governar um país como o nosso neste clima de inimputabilidade generalizada.

Quem tem a coragem de cortar a energia a um aeroporto, com tanta facilidade, menosprezando todas as consequências, com potencial criminoso, até, decorrentes deste ato, só pode ser um irracional perigoso. Quem lhe manifesta solidariedade, por omissão ou pacto de silêncio, é um irracional duplamente perigoso.

Sinceramente, creio, que ainda não somos um país onde os broncos mandam e, para tal, basta apenas, que os cidadãos que têm responsabilidades acrescidas no nosso sistema político-institucional sejam os maiores defensores e praticantes do cumprimento da lei e das normas de convívio em sociedade.

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