quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

ARÁBIA SAUDITA, O VERDADEIRO ESTADO ISLÂMICO



Retrógrado, misógino, intolerante, Reino de Saud financia e estimula o ISIS. Decapitou 47 opositores, no primeiro dia do ano. É o grande aliado do “mundo livre” no Oriente Médio…

Nuno Ramos de Almeida - Outras Palavras

“Era de manhã em Karbala, cidade a cerca de 100 quilômetros ao sul de Bagdad, e o mercado local estava cheio quando todos ouviram gritos. Um grupo de homens vestidos de preto, levando espadas e bandeiras negras, invadiu o mercado matando crianças, mulheres, idosos e adultos. Avançaram pelas ruas até tomar o controle de toda a cidade. Neste dia, cerca de 4 mil pessoas morreram. Os homens vestidos de preto que organizaram esta matança não eram do grupo autodenominado Estado Islâmico. O massacre ocorreu há mais de 200 anos e o grupo era comandando por um dos primeiros governantes da Arábia Saudita, que acabava de formar um novo movimento religioso: o wahabismo”, recorda a insuspeita BBC.

A história tem várias versões, mas resumindo e simplificando conta-se da seguinte maneira: uma vez pediram ao ocupante de turno da Casa Branca que se pronunciasse sobre Anastásio Somoza Garcia, o primeiro da família como ditador da Nicarágua. O líder do mundo livre terá feito um silêncio e respondido: “é um filho da puta, mas é o nosso filho da puta”.

Só essa lógica oportunística justifica o apoio dos Estados Unidos e dos seus aliados europeus à monarquia reinante na Arábia Saudita. Mas essa lógica de ter aliados pouco recomendáveis para fazerem o jogo mais sujo, arrisca-se a rebentar-lhes nas mãos, como os apoios que deram a Bin Laden durante a guerra do Afeganistão contra a ocupação soviética.

Não só vêm da Arábia Saudita os principais financiamentos a grupos terroristas como o Estado Islâmico; também é o reino que fornece a sua base ideológica: sem o wahabismo, doutrina salafista, pregada pelo poder saudita, não haveria interpretações radicais do Islã, que transformam a religião muçulmana numa identidade assassina para todas as pessoas, inclusive os muçulmanos que não acreditam numa interpretação feudal, misógina e conservadora que viola repetidamente as palavras do Corão. Por todo o mundo muçulmano, os sauditas exportaram a sua forma de religião, com o dinheiro do petróleo financiam madrassas e outras escolas religiosas que propagam o salafismo além fronteiras.

Esse apostolado tem tido frutos venenosos: quando vemos como regride a situação das mulheres nas zonas libertadas do Sahara Ocidental ou da Palestina, percebemos o papel da influência religiosa do wahhabismo.

Finalmente, a Arábia Saudita é a concretização na prática do que seria um país dirigido pelo Estado Islâmico. Nesse território, as mulheres são seres de segunda, os imigrantes são abaixo de cão, os não crentes podem ser mortos, os estrangeiros estão proibidos de visitar às cidades sagradas de Meca e Medina, e qualquer oposição ao poder despótico vigente é condenada à morte por decapitação.

No entanto, com a execução neste sábado de 47 condenados, entre os quais o clérigo xiita Nimr al Nimr, a estratégia terrorista de apoios ao Estado Islâmico atingiu um novo e perigoso patamar. O líder dos xiitas da Arábia Saudita foi preso, torturado e decapitado. As suas últimas palavras foram um aviso: “a minha morte será um motivo para ação”. Esse aviso há muito que monarquia saudita conhece: aquilo que se pretende com esta execução é transformar a guerra contra o Estado Islâmico num conflito entre sunitas e xiitas.

O governo da Arábia Saudita está envolvido numa guerra em várias frentes contra os xiitas, nomeadamente no Iemen, Bahrein, Síria e Iraque. Os governos do Ocidente têm fechado os olhos a estas ações, porque elas são contra a maior potência xiita, o Irã. Mas as ruas de Paris são a prova que não há guerras limpinhas para os aliados do reino. Um conflito que opusesse sunitas e xiitas poderia salvar, momentaneamente, o Estado Islâmico e Riad, mas conduziria o mundo a uma guerra sem fronteiras.

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