Inês
Cardoso* – Jornal de Notícias, opinião
Imagine
que o seu vizinho da frente está enterrado em dívidas e com vendas a crédito no
supermercado. A certa altura, o gestor de conta começa a dizer que lhe parece
inevitável um novo empréstimo para estabilizar a situação financeira.
Preocupado, o fornecedor de eletricidade ameaça cortar-lhe o abastecimento e
aumenta os juros sobre os pagamentos em atraso. Os proprietários do
supermercado, por mais que ele assegure a pés juntos que tem a situação
controlada, limitam o acesso aos produtos. A certa altura, não resta
alternativa: vê-se obrigado a pedir um novo crédito, para acalmar os credores e
poder voltar a abastecer a despensa.
Os
profetas da desgraça têm o estranho poder de fazer surgir nuvens negras onde
instantes antes reinava alguma acalmia. O economista João César das Neves foi
às Jornadas Parlamentares do PSD assegurar que estamos à beira de um novo
resgate, antes de terminar a sua intervenção citando António de Oliveira
Salazar. E disse ainda que "eles", os socialistas que governam, já
estão conscientes de que "uma trovoada de um tamanho tal" está
prestes a abater-se sobre as nossas cabeças.
Igualmente
negras foram as previsões de João Salgueiro, para quem o quarto resgate pode
ser "inevitável". Frases que deixam os nossos fornecedores de
eletricidade nervosos, voltando à metáfora do vizinho da frente. Só que o
vizinho somos nós. E parece pouco sensato andar a brincar às profecias numa
altura em que os ansiosos mercados estão de ouvidos colados à porta, a escutar
todos os azedos comentários com que os nossos políticos falam de finanças e os
nossos economistas fazem política.
Como
se não bastasse o trovejar à Direita, à Esquerda ressuscita-se o debate sobre a
renegociação da dívida, tema que foi votado nada menos que 13 vezes na
legislatura anterior. O BE desafia o PS a sentar-se num grupo de trabalho para
refletir sobre a redução dos montantes da dívida, prazos de pagamento e taxas
de juro.
Lembra-se
de em 2011 um deputado socialista invocar a possibilidade de usarmos uma bomba
atómica contra os alemães? Seria, em linguagem simples, o vizinho chegar ao
banco, aos fornecedores de bens e ao supermercado, e dizer que não pagava.
"Ou se põem finos e me perdoam uma parte da dívida, ou não há nem mais um
cêntimo". Esse deputado agora é secretário de Estado dos Assuntos
Parlamentares. Só que, entretanto, a Grécia parece ter-nos ensinado que as
instituições europeias não ponderam outro caminho que não o de manter os alunos
disciplinados. Resta saber se Pedro Nuno Santos concorda ou até onde está
disposto a empurrar o Governo no desafio à teoria do bom aluno.
*Subdiretora
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