Três
jovens foram atingidos a tiro pela polícia em Caluquembe, província da Huíla
(Angola), na passada segunda-feira, durante uma manifestação pacífica
organizada na sequência de decisões sobre o pagamento de propinas e contra a
exoneração da direcção dos estabelecimentos de ensino do II Ciclo e Técnico
Profissionais.
Maka
Angola, em Folha 8
“Foram
atingidos três jovens, dois dos quais se encontram internados nos hospitais da
Igreja Evangélica Sinodal de Angola (IESA), em Caluquembe; um terceiro elemento,
não identificado, em estado mais grave terá sido evacuado para Lubango”,
segundo relatório da delegação do Sindicato dos Professores, a que o Maka
Angola teve acesso.
De
acordo com a mesma fonte, no dia 11 de Abril (segunda-feira), a polícia começou
por prender, às oito da manhã, cinco estudantes que participavam numa
“manifestação pacífica” pela abolição da propina recentemente decretada e
contra a exoneração da direcção dos estabelecimentos de ensino de Caluquembe, a
qual decorria “sem qualquer acto de vandalismo”.
Apesar
de o grupo de cinco estudantes ter sido colocado em liberdade, a manifestação
de estudantes, com idades entre os 13 e os 21 anos, manteve-se no local.
“A
polícia, vendo a euforia dos alunos, começou a agredi-los, batendo com chicotes.
Perante esta reacção da polícia, os alunos agarraram em objectos e
contra-atacaram os agentes. Deste modo, como a polícia não conseguia controlar
ou dispersar os alunos, por volta das 10h15 começaram os disparos, que duraram
até à chegada de dois helicópteros da Polícia Nacional, vindos do Lubango por
volta das 13h45, disparando para o ar”, relata a mesma fonte.
Os
feridos são Paulo Alfredo Cabral, de 17 anos, aluno do curso de Ciências
Económicas e Jurídicas no Colégio Novo Horizonte, no Caluquembe, que foi
atingido na perna direita, junto ao joelho, embora já se encontre “fora de
perigo”; e Cecília Camia Francisco, de 21 anos, aluna da Escola de Formação de
Professores, que foi atingida na coxa direita.
“Esta
encontra-se em estado mais delicado, pois a bala ainda não foi retirada.
Segundo as enfermeiras, que não quiseram identificar-se, houve um terceiro
elemento ferido, que terá sido gravemente atingido no pescoço, e que foi
evacuado para o Lubango sem deixar registo junto do hospital, não se sabendo se
é ou não aluno”, acrescentou o relatório do SINPROF.
No
dia seguinte ao incidente, o porta-voz do Comando Provincial da Polícia
Nacional na Huíla, superintendente-chefe Paiva Chandala Tomás, negou
inicialmente, à imprensa local, que os disparos tivessem sido efectuados por um
agente policial. Na quarta-feira, o porta-voz reconheceu à TV Zimbo que o autor
dos disparos era um agente da Polícia Nacional, já estava localizado e seria
punido.
No
entanto, várias fontes locais contactadas por Maka Angola indicam que o
terceiro sargento Moisés Mununga, o presumível autor dos disparos, “continua a
trabalhar normalmente”.
Uma
autoridade local desabafou ao correspondente do Maka Angola que todas as
administrações locais têm orientações superiores “para reprimir qualquer
manifestação a todo o custo”.
Segundo
o testemunho recolhido pelo Maka Angola, os incidentes ocorreram depois de uma
reunião extraordinária no CMP – MPLA, sob presidência do administrador
municipal, José Arão Nataniel Chissonde, que convocou todos os directores das
escolas do II Ciclo e Técnico Profissional. Nessa reunião foi determinado que
todos os alunos do II Ciclo e Técnico Profissional “devem pagar uma propina no
valor 3000 kuanzas por mês, cada um”, dos quais 2000 kuanzas permanecem nas
escolas e 1000 kuanzas vão para os cofres da Administração Municipal, servindo,
segundo o administrador José Arão Nataniel Chissonde, para a compra de
combustível para a iluminação pública.
José
Arão Nataniel Chissonde determinou ainda que o aluno que não efectuasse o
pagamento do imposto até ao dia 11 de cada mês ficaria impedido de assistir às
aulas.
No
mesmo encontro, depois de ter notado a ausência do director da Escola de
Formação de Professores (EFP), Abel Pedro, que foi representado por um
professor por ele indicado, resolveu o administrador suspender toda a direcção,
sem que os seus elementos fossem ouvidos.
“O
administrador mandou um recado, dizendo que o director não voltasse à referida
escola. Terminado o encontro, dirigiu-se à escola, levando consigo uma nova
direcção e apresentando-a aos alunos, tendo reforçado que o director anterior
nunca mais voltava a pôr os pés na instituição, nem que fosse pintado de ouro”,
relata o contacto do Maka Angola no município.
“Caso
o dito director voltasse, ele próprio deixaria de ser administrador do
município”, indica o relatório, referindo-se ao conteúdo das declarações feitas
no local.
Após
o anúncio referente à nova propina obrigatória e perante a exoneração da
direcção, os alunos, pela voz do presidente da associação de estudantes,
solicitaram esclarecimentos. O administrador José Arão Nataniel Chissonde
limitou-se a responder que a decisão já estava tomada e “que não havia
explicações a dar a ninguém”.
Foi
na sequência desta atitude autoritária que os alunos se revoltaram e decidiram
protestar contra a nova direcção, exigindo o regresso dos responsáveis que
tinham sido afastados de modo arbitrário.
Diante
desta reacção dos alunos, a nova direcção não aceitou ser empossada.
Consequentemente, os presidentes das associações de estudantes dos cinco
estabelecimentos de ensino do II Ciclo e Técnico Profissional reuniram-se e
decidiram protestar frente à administração municipal de Caluquembe.
No
dia em que se registaram os incidentes e o episódio de violência policial,
segunda-feira, 11 de Abril, o administrador José Arão Nataniel Chissonde
ameaçou expulsar da escola um professor de Geografia, simplesmente “por ser do
SINPROF e coordenador de actividades extra-escolares”. Logo de seguida, teve
início a manifestação pela abolição do imposto e que apelava ao regresso da
anterior direcção.
Portanto,
o episódio do professor foi o gatilho de uma legítima reacção da sociedade
civil, que se sentiu lesada pela tomada de decisões arbitrárias e
injustificadas por parte de José Arão Nataniel Chissonde. O resultado: carga
policial em excesso e sem justificação, não se conhecendo ainda todas as
consequências deste acto.
Foto
do Folha 8/Arquivo
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