João
Galamba – Expresso, opinião
No dia
1 de fevereiro de 2013, poucos dias depois de Vítor Gaspar assinar o despacho
que recapitalizava o Banif com 1100 milhões de dinheiro público, o governador
do Banco de Portugal, no Parlamento, assegurava que o interesse dos
contribuintes estava salvaguardado e que o Estado até ia lucrar com o negócio.
Para
tal, era essencial garantir duas coisas: a viabilidade do banco, para minimizar
o risco de perdas para o Estado; a rápida recuperação da rentabilidade e o
regresso aos lucros, para garantir o reembolso do dinheiro público num curto
espaço de tempo e com uma remuneração elevada (10%), sem pôr em causa os rácios
de solvabilidade do banco. E Carlos Costa não foi parco nas garantias: “posso
assegurar-vos que durante nove meses o Banif foi radiografado muitas vezes e de
várias posições”. O governador chegou mesmo ao ponto de dizer que o atraso na
recapitalização do Banif se teria devido a esse longo e detalhado escrutínio. O
Banco de Portugal tinha equipas permanentes nos bancos desde 2010 e, em 2011,
fez-se um plano especial de inspecções (SIP), que incluiu uma auditoria externa
às carteiras de crédito e aos métodos de avaliação de risco. Como o SIP dá
apenas uma fotografia estática, o BDP determinou que estes testes passaram a
ser realizados trimestralmente. O Banif teve isto e mais, porque o Banco de
Portugal ainda mandou fazer duas auditorias especiais, em 2012. Era a
“supervisão intrusiva” em todo o seu esplendor. Não era infalível, mas andava
lá perto.
Sucessivas
revisões das necessidades de capital do Banif faziam antever o pior quanto á
solidez das garantias dadas por Carlos Costa. Em março de 2012, o Banco de
Portugal dizia que, de acordo com uma estimativa “conservadora e prudente”, o
Banif precisava de 440 milhões de euros. Poucos meses depois, esses 440 milhões
passaram subitamente a 1100 milhões, incluindo 850 milhões de dinheiro público.
No plano que sabemos hoje não ter sido final, o que esteve na base do despacho
de recapitalização assinado por Vítor Gaspar, os 850 milhões de dinheiro
público passaram a 1100 milhões. Numa carta a um Vítor Gaspar surpreendido com
a subida aparentemente descontrolada das necessidades de capital do Banif,
Carlos Costa inventa justificações, a mais esfarrapada das quais é aquela em
que atribui a responsabilidade da subida “inesperada” das necessidades de
capital do Banif ao longo de 2012 a uma decisão sua tomada há ano e meio (aviso
3/2011).
E
foi assim que um banco que tinha os piores indicadores do mercado e cuja
“radiografia” estava sempre a mudar foi decretado (sem fundamento) como viável
e merecedor de receber 1100 milhões de euros de dinheiro público. A alternativa
era pior, garantia Carlos Costa e acreditava e assinava Vítor Gaspar, ao mesmo
tempo que (incompreensivelmente) pedia planos de contingência que passavam por
uma resolução do banco, semelhante à que veio a ocorrer em 2015.
Ao
invés de reestruturar o banco, para assegurar a sua viabilidade antes da
entrada de dinheiro público, fez-se o oposto: meteu-se o dinheiro do Estado num
banco inviável e tentou-se reestruturar depois, quando era sabido que qualquer
reestruturação credível implicaria sempre uma nova recapitalização e, portanto,
perdas adicionais para o Estado (agora na qualidade de accionista do banco).
Pior: depois de injectar 1100 milhões de euros num banco de viabilidade, no
mínimo, duvidosa, o Estado português também ficou sob a alçada da sempre
intransigente e irrazoável Direccção-Geral da Concorrência.
A
injecção de 1100 milhões de euros num banco inviável expôs o Estado e os
contribuintes a riscos financeiros e orçamentais que cabiam ao Banco de
Portugal e ao Ministério das Finanças, no âmbito das suas funções e
competências, evitar. Aconteceu o oposto. O que não se fez no final de 2012,
antes de o Estado injectar 1100 milhões de euros, teve de ser feito, à pressa e
com uma liquidação do banco (a solução mais cara de todas) a uma distância de
horas, no final de 2015.
O
banco foi mal resolvido? O Santander comprou o Banif em saldos e fez um
excelente negócio? A resposta a essas perguntas é, com elevada probabilidade,
sim, porque vender sob pressão nunca é boa notícia para um vendedor. Mas uma
coisa é certa: teria sido tudo melhor se não se tivesse metido 1100 milhões num
banco inviável e se não se tivesse andado a empurrar o problema com a barriga durante
quase três anos para não perturbar a “saída limpa”, para não interferir com as
eleições e, sobretudo, para evitar reconhecer que havia sido cometido um grave
erro em 2012/13, com consequências orçamentais pesadas, que só pioraram com o
tempo. Tiveram quase 3 anos para corrigir o erro e minimizar custos. Aconteceu
o oposto. Tudo isto foi conhecido, com estrondo, no final de 2015, já com um
novo Governo em funções.
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