Domingos
Andrade* – Jornal de Notícias, opinião
1. Não
há nada mais relevante na nossa vida caseira de país do que saber as contas da
Caixa Geral de Depósitos. E nada, mas absolutamente nada, justifica a ausência
de explicações sobre a necessidade de o banco do Estado precisar de uma
recapitalização de quatro mil milhões de euros, depois de duas injeções de
capital nos últimos anos num total de 3600 milhões de euros.
Não
o justifica o receio de expor as fragilidades da Caixa sob a alegação não
assumida de que tal poderia provocar uma fuga de capitais, ou uma espiral
sistémica. Depois do Banif e da sucessão de casos na banca portuguesa, não há
muito mais para onde o capital possa fugir (leia-se pequenos aforros, porque o
grande capital encontra sempre saída), nem grande risco que se corra.
Não
o justifica também o silêncio até que Bruxelas aprove a recapitalização com
base num plano que não conhecemos e que devemos conhecer. Ou sequer antes da
"avaliação profunda" que a Comissão Europeia diz pretender promover
no banco.
Mas
também não vamos lá com comissões de inquérito, cujos anúncios funcionam como
lama numa ventoinha, trazendo o banco estatal para o terreno da luta
partidária, e que para pouco mais servem do que cultivar um voyeurismo cínico.
O
que não se pode, de todo, é permitir que sob o manto do silêncio se levantem
suspeições atuais e passadas sobre a Caixa Geral de Depósitos, reinando o
palpite sobre o que vai acontecer, que passa invariavelmente pelo despedimento
de trabalhadores, o fecho de balcões e o pânico dos pequenos clientes.
Sim,
precisamos verdadeiramente de saber que atos de gestão foram praticados, em que
circunstâncias e por quem. Sem culpas solteiras. Precisamos, mais uma estafada
vez, de saber o que andou o regulador e as suas centenas de funcionários a
fazer (sim, esse, o Banco de Portugal), se é que andou a fazer alguma coisa. E
precisamos, de uma vez por todas, de pôr fim ao descalabro em dominó da banca
portuguesa.
Sem
um sistema bancário forte não há uma economia forte.
2. Nas
imagens de sexo num jardim em Paredes de Coura não choca apenas o ato ter sido
praticado sem despudor ao lado de uma criança, filha da mulher. Não, o quadro
de miséria é bem mais vasto e devia tocar-nos a todos. Choca a gravação
propriamente dita, espreitar pelo buraco da fechadura para depois expor ao
mundo das redes sociais. E sim, foi gravado para mostrar a façanha, caso
contrário teria apenas servido como prova junto de uma qualquer esquadra da
PSP. Choca o convívio pacífico de toda aquela gente a assistir, porque há
sempre alguém sem vergonha para ver. Choca a anomia que reina num país onde
passamos a conviver pacificamente com comportamentos que em nada dignificam
quem os pratica, nem quem a eles assiste impavidamente. Ah, claro, depois
ficamos todos muito incomodados quando a coisa flui nos facebooks. É um zoo
humano.
*Diretor-Executivo
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