quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

A PAZ POR OBRA DO NÃO ALINHAMENTO ACTIVO EM PLENO SÉCULO XXI – I




1 – A fluidez do Não Alinhamento activo não desapareceu na voragem do tempo, sobrevivendo ao fim da Guerra Fria, por que a “Nova Ordem Global”, na perspectiva e via da hegemonia unipolar, tem sido determinante em relação à sua firmeza, coerência e vitalidade. 

Essa fluidez socorre-se da lógica com sentido de vida, sem se deixar equivocar nos termos duma consciência dialéctica alicerçada em factores de ordem histórica, antropológica e sócio-política, no que ao homem diz respeito, como em factores essenciais resultantes dos aspectos físico-geográficos-ambientais que estão na base do respeito que a todos deve merecer a Mãe Terra.

Por isso muitas das minhas correntes análises, assumem aspectos filosóficos que se prendem à matriz dessa extraordinária amplitude que nos contempla e nos mobiliza.

2 – O equacionamento dos factores físico-geográficos-ambientais no seu inter-relacionamento com o homem mereceu algumas apreciações minhas em séries como “A LÓGICA COM SENTIDO DE VIDA”, ou “O LABORATÓRIO AFRICOM” e estão presentes em muitos outros trabalhos por mim produzidos e mesmo em muitos comentários e intervenções que tenho feito.

Por isso parece-me que, ao abordar o presente tema, “A PAZ POR OBRA DO NÃO ALINHAMENTO ACTIVO EM PLENO SÉCULO XXI”, há apreciações sobre África e América Latina que, por mérito próprio no que à paz diz respeito, merecem especial atenção.

Destaco desde logo os papéis de vanguarda da Revolução Cubana no espaço da América Latina e do Movimento de Libertação em África, com relevância para o protagonismo do MPLA no que ao continente-berço diz respeito, algo que corresponde a uma simbiose que nutre as opções mais saudáveis a sul e de acordo com as sensibilidades sócio-político-culturais do sul.

3 – Não se julgue que esse processo civilizacional de veias abertas, desperdice coerência substantiva: elas, as veias abertas, estão a ser tão poderosas no que a inteligência diz respeito, que há um espaço de tal maneira intenso e imenso de sua responsabilidade por dentro da coerência da multipolaridade que promove a possibilidade dum amplo renascimento, ao ponto de, por exemplo, até o Vaticano conforme expressão do actual Papa Francisco, um Papa vindo das pampas argentinas, favorecer a alternativa desse renascimento, que se vai erguendo a pulso do pântano premeditado do caos.

A paz nos termos do Não Alinhamento activo em pleno século XXI, tem também a ver, entre muitos outros ventos bonançosos favoráveis, com a Teologia de Libertação, não se reduzindo evidentemente a ela.

As potencialidades da emergência multipolar animam-se também desse processo civilizacional de veias abertas decorrente a sul, com implicações desde logo profundas na América Latina e em África, pelo que se torna em algo incontornável no que à coerência e energia vital diz respeito.

Não é um processo limitado (e limitativo) ao “to be, or not to be”, conformado à gestão dum Bilderberg, com um expediente que não passa os limites de gestão controlada e de acordo com o exercício da “Nova Ordem Global”!

4 – É evidente que em relação ao ambiente de trevas que se seguiu à Guerra Fria, onde ganharam espaço até as mais abjectas monarquias feudais a ponto de se recomporem franjas de fascismo e de nazismo em reforço dos falcões do Pentágono e da NATO, há já uma ruptura que corresponde à lógica com sentido de vida na perspectiva do Não Alinhamento activo em pleno século XXI.

Desse modo a paz no âmbito dessas veias abertas é assumida face a face aos falcões, ao feudalismo, aos neo fascistas, aos neo nazis e até em relação àqueles que assumem austeridade nos exercícios que fazem em amplos espaços nacionais, regionais e continentais.

Haverá ainda alguém que não alimente esperança com essa pequena luz rompendo as trevas e nos espreita bem do fundo do túnel? 

Em saudação ao 4 de Fevereiro de 2016 em Angola.

Ilustrações e fotos: O símbolo do MPLA e a marcha de archotes em Havana, em saudação a José Marti.

Angola. FEVEREIRO, 4, HISTÓRIA, TRABALHO, HOMEM NOVO




Há 55 anos, numa heróica madrugada, o quebrar das grilhetas transformou-se num hino que ecoou de Cabinda ao Cunene e do Mar ao Leste. A 4 de Fevereiro de 1961 dá-se, em Luanda, o assalto á cadeia de São Paulo, á Casa de Reclusão e á esquadra dos aracuaras (policia colonial). Os heróis que quebraram as algemas, os Homens e Mulheres que iniciaram a luta armada de libertação nacional e combateram, sem tréguas, o colonial-fascismo, constituem raízes da nossa identidade.

Hoje temos a responsabilidade histórica de fazer prevalecer a épica caminhada iniciada pelos heróis do 4 de Fevereiro de 1961. Somos – nós, povo angolano - os heróis que marcam o 4 de Fevereiro de 2016, combatendo com o nosso trabalho, levando a cabo as tarefas do presente com o mesmo espirito patriótico que irradiava dos heróis que hoje comemoramos e que iniciaram a construção da Nação Angola. A todos nós cabe a continuação do esforço dos angolanos e angolanas que há 55 anos trilharam Angola nos valores da Paz, do Trabalho e da Liberdade. E Angola, hoje, é a prova de que esse esforço não foi em vão.

Edificaremos o Amanhã, sem colonialismo, sem neocolonialismo, livres das trapaças do imperialismo, da rapina e da guerra. Um futuro sem opressão, em Paz, com Trabalho e em Liberdade, graças ao caminho épico preconizado pelos heróis do 4 de Fevereiro de 1961 e ao esforço e abnegação patrióticos da heróica cidadania de 4 Fevereiro de 2016. E comemoraremos, sempre em Paz, Democracia, Liberdade e Justiça Social, numa Angola-Futuro, fruto do trabalho e da luta de todos nós – Povo Angolano – o 4 de Fevereiro, raiz primordial da nossa identidade. E fá-lo-emos (fruto da nossa contribuição para África – continente Mãe e Terra-Berço - e para toda a Humanidade) num Mundo melhor, Livre e Justo.

Angola. Huíla. UMA CRIANÇA MORRE TODOS OS DIAS DE SUBNUTRIÇÃO



Quase 400 crianças morreram o ano passado, revelam dados oficiais

Teodoro Albano – Voz da América

A subnutrição faz mortes na Huíla. Pelo menos uma criança perde a vida por dia.

Em 2015, foram diagnosticados na província 2.761 casos de subnutrição, tendo 396 crianças morrido.

As autoridades sanitárias da província atribuem a chegada tardia das mães aos hospitais como a principal causa de morte de crianças, por má nutrição.

Para travar as mortes por má nutrição, a chefe do departamento de saúde pública e controlo de endemias, Telma Diogo, fala de uma estratégia que incluem o reforço da distribuição de micronutrientes e o estabelecimento de um sistema de vigilância nas comunidades.

A introdução de novos alimentos a partir dos seis meses e a promoção do aleitamento materno exclusivo também se enquadram na estratégia.

Diogo acrescenta que o programa será mais forte se for reforçada a participação comunitária.

Angola. Kalupeteka. Tribunal ouve descrições de tiroteio e ataque com catanas no Monte Sume



Confrontos começaram quando agentes se preparavam para prender Julino Kalupeteka. Julgamento recomeça Sexta-feira no Huambo

Coque Mukuta – Voz da América

O tribunal provincial do Huambo ouviu esta semana descrições dramáticas dos confrontos, no Monte Sume, entre a polícia e fiéis da seita “ A Luz do Mundo”, de Julino Kalupeteka.

Tal aconteceu numa altura em que fiéis da seita alegam que continuam as perseguições pelas autoridades. Alguns foram detidos esta semana.

Kalupeteka e vários dos seus seguidores são acusados de vários crimes na sequência dos confrontos em que terão morrido polícias e civis.

O número concreto de vítimas permanece por esclarecer. As autoridades dizem que morreram nove polícias e 13 civis, mas a oposição e outras organizações afirmam que centenas de pessoas foram massacradas.

Kalupeteka negou responsabilidade pelos confrontos.

O agente João Chissinge, em declarações lidas no tribunal, afirmou ter recebido ordens para prender Kalupeteka, mas “não tinha algemas”.

“O agente da policia Abel do Carmo disponibilizou as algemas que trazia, prendeu um dos braços do Kalupeteca; Kalupeteca apresentou resistência,” disse Chissinge, na sua declaração lida em tribunal.

Ele acrescentou que “naquele mesmo momento ouviu um disparo, mas não sabe dizer quem o fez. A partir daí os tiros se generalizaram”.

Julino Tito, filho de Kalupeteka disse à VOA que, na terça–feira, um outro declarante tinha descrito ao tribunal como Kalupeteka tinha sido interpelado pelo “chefe Abel do Carmo” e que em seguida lhe tinha virado as costas.

Os fieis teriam depois atacado Abel do Carmo com catanas e outras armas e ”cortejaram-no”.

O declarante disse ter  conseguido tirar a sua arma e disparar três tiros, tendo depois fugido “e caído num buraco em baixo de uma bananeira”.

O filho do líder da seita disse que até agora “ninguém falou da morte dos fiéis”.

“É a coisa mais complicada, porque ali só se está a falar da morte dos efectivos da polícia”, disse.

Tito denunciou novas perseguições dos fiés da seita na província da Huila. “No Kakonda, município do Lubango, o comandante acusou o mais velho João, de que tem feito estudo bíblico".

O referido João terá sido detido na companhia do filho, que foi solto.  

O julgamento recomeça na próxima sexta-feira.

QUANDO UM PAÍS É POBRE…



A União Europeia, consciente de que Angola é um país… pobre e que, por isso, não tem meios para acudir às necessidades do seu Povo (e os muitos meios que tem são para sustentar o clã presidencial) vai atribuir 1,3 milhões de euros para apoiar mais de 190 mil pessoas, sobretudo crianças, de comunidades afectadas pela seca das províncias do Cunene e da Huíla.

Em nota de imprensa, a União Europeia refere que a verba, a ser aplicada pela organização não-governamental Visão Mundial e o departamento nacional de nutrição do Ministério da Saúde de Angola, visa reduzir a mortalidade e morbilidade infantil causada pela desnutrição.

Com o referido valor vai ser proporcionado, durante um ano, a assistência nutricional a crianças com sintomas de malnutrição aguda ou moderada, nomeadamente menores de cinco anos.

A intervenção vai também permitir um aumento da capacidade de resistência das populações rurais, bem como do seu conhecimento das melhores práticas para a prevenção e tratamento da desnutrição infantil no futuro.

A União Europeia considera “alarmante” a situação de insegurança alimentar que enfrenta o sul de Angola, há alguns anos devido à falta de chuvas, particularmente as províncias do Cunene e da Huíla.

O apoio financeiro visa igualmente adquirir e distribuir alimentos terapêuticos e suplementares para os centros de nutrição, além das sessões de formação para o pessoal sobre a identificação e tratamento de crianças malnutridas.

Essa intervenção de emergência, adianta ainda a nota, vai ser complementada com actividades de desenvolvimento previstas no 11º Fundo Europeu de Desenvolvimento, o maior instrumento de cooperação e financiamento da União Europeia em Angola, que se prolonga até 2020.

Com um financiamento total de 195 milhões de euros para intervenções nos sectores da agricultura, água e saneamento e educação superior, a União Europeia pretende apoiar o Governo angolano no reforço da segurança alimentar e nutricional em Angola, dentro da sua estratégia global para acabar com a desnutrição infantil crónica mundial.

É fartar vilanagem

Perto de 28 milhões de pessoas da CPLP são desnutridas, sendo Angola, Moçambique, Guiné-Bissau e Timor-Leste os países mais problemáticos, com 44%, 37%, 31% e 23% da taxa de desnutrição, respectivamente. E, como se sabe, com excepção de Angola, todos os outros países referidos são ricos, muito ricos…

“Não basta aprovar leis e estratégias. É preciso ir ao cerne do problema. É preciso produzirmos comida suficiente para alimentar os nossos povos”, dizia em 2012 a directora da organização moçambicana Mulher Género e Desenvolvimento (MuGeDe), Saquina Mucavele, falando em nome da Rede de Organizações para a Soberania Alimentar (ROSA).

Tinha e tem razão. Mas, é claro, é preciso dar tempo ao tempo e compreender que no caso de Angola, por exemplo, o MPLA só está no poder desde 1975, que o país só está em paz total há 14anos, e que o presidente da República só está no cargo – sem nunca ter sido nominalmente eleito – desde 1979.

Ora, para que deixem de existir cerca de 70% de pobres em Angola é preciso que o MPLA se mantenha no poder aí durante mais uns 30 anos.

Saquina Mucavele disse também que a segurança alimentar e nutricional depende, em larga medida, de investimentos na agricultura, particularmente nos países pobres, onde a produção de alimentos ainda é muito baixa, apelando aos governos para alocarem mais investimentos para a produção de comida.

Essa recomendação, como é óbvio, não tinha nem tem cabimento em Angola. As preocupações do regime estão viradas para outras latitudes. Aliás, o Povo pode muito bem alimentar-se da mandioca que encontre nas lavras ou de farelo.

Por sua vez a Coordenadora da Organização Mundial da Agricultura e Alimentação (FAO) para o direito à Alimentação, Bárbara Ekwall, disse na mesma altura que a questão que se coloca é que a produção mundial de comida aumentou nos últimos anos mas, paradoxalmente, há cada vez mais pessoas padecendo de fome.

Angola é um dos países lusófonos com a maior taxa de mortalidade infantil e materna e de gravidez na adolescência, segundo as Nações Unidas.

Importante é a riqueza de Isabel dos Santos

Mas o que é que isso importa? Importante é saber de facto que a filha do presidente, Isabel dos Santos, soma e segue, mesmo quando se sabe que o regime é um dos mais corruptos do mundo. Ou será por isso mesmo?

Aliás, muitos dos angolanos que raramente sabem o que é uma refeição, poderão certamente alimentar-se com o facto de a filha do presidente vitalício ser também dona dos antigos colonizadores.

O investimento público e o aumento da produção de petróleo vai permitir a Angola, ou seja ao regime, ou seja ao clã Eduardo dos Santos, que continue, com ou sem crise, a aumentar o seu enorme pecúlio.

Os pobres também vão aumentar, mas esses não contam para as análises das impolutas instituições internacionais nem para as estatísticas dos países que têm relações submissas com Angola. O que conta é, agora e sempre, o poder económico de Angola.

Tudo, é claro, graças ao ouro negro. De facto, o petróleo representa mais de 50% do Produto Interno Bruto de Angola, 80% das receitas estatais e mais de 90% das exportações.
É claro que, segundo a bitola gerada pelo Ocidente, há bons e maus ditadores. Muammar Kadhafi passou a ser mau e Eduardo dos Santos continua a ser bom. Amanhã se verá.

Portugal continua de cócoras perante o regime de Luanda, tal como estava em relação a Muammar Kadhafi que, citando o ex-primeiro-ministro José Sócrates, era “um líder carismático”. Talvez um dia se chegue à conclusão que, afinal, Eduardo dos Santos também é um ditador. Não sabemos, contudo, se alguma vez alguém o vai dizer. Tudo porque, de dia para dia, o clã do presidente angolano torna-se dono das ocidentais praias lusitanas.

Alguém ainda se recorda, por exemplo, que em Março de 2009, no Palácio de Belém, em Lisboa, só dois jornalistas de cada país tiveram direito a colocar perguntas a Cavaco Silva e a Eduardo dos Santos?

Recordam-se que um deles, certamente no cumprimento da sua profissão mas, é claro, à revelia das regras dos donos dos jornalistas e dos donos dos donos dos jornalistas, questionou Cavaco Silva sobre esse eufemismo a que se chama democracia em Angola?

Recordam-se que Cavaco Silva se limitou a… não responder?

Recordam-se que no dia 3 de Setembro de 2008, quando o mesmo Cavaco Silva falava na Polónia a propósito das eleições em Angola, disse o óbvio (uma das suas especialidades): “Desejo que as eleições ocorram com toda a paz, sem qualquer perturbação, justas e livres como costumam dizer as Nações Unidas nos processos eleitorais”?

Recordam-se que, nessa altura, como sempre, Cavaco Silva nada disse sobre o facto de quatro órgãos de comunicação social portuguesa – SIC, Expresso, Público e Visão – terem sido impedidos de entrar em Angola para cobrir as eleições que foram tudo menos justas e livres?

Afinal, hoje, Cavaco Silva, embora mais comedido, continua a pensar da mesma forma que José Sócrates, Passos Coelho, Paulo Portas e António Costa, para quem Angola nunca esteve tão bem, mesmo tendo 70% dos angolanos na miséria.

De facto, os portugueses só estão mal informados sobre o que se passa em Angola porque querem, ou porque têm interesses eventualmente legítimos mas pouco ortodoxos e muito menos humanitários.

Custa a crer, mas é verdade que os políticos, os empresários e os (supostos) jornalistas portugueses (há, é claro, excepções) fazem um esforço tremendo (se calhar bem remunerado) para procurar legitimar o que se passa de mais errado com as autoridades angolanas, as tais que estão no poder desde 1975.

Alguém, pergunta-se, ouviu Cavaco Silva recordar que 70% da população angolana é afectada pela pobreza, que a taxa de mortalidade infantil é a terceira mais alta do mundo, com 250 mortes por cada 1.000 crianças? Não, ninguém pergunta até porque ele não responde.

Alguém o ouviu recordar que apenas 38% da população tem acesso a água potável e somente 44% dispõe de saneamento básico?

Alguém o ouviu recordar que apenas um quarto da população angolana tem acesso a serviços de saúde, que, na maior parte dos casos, são de fraca qualidade?

Alguém o ouviu recordar que 12% dos hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no país apresentam problemas ao nível das instalações, da falta de pessoal e de carência de medicamentos?

Alguém o ouviu recordar que a taxa de analfabetos é bastante elevada, especialmente entre as mulheres, uma situação é agravada pelo grande número de crianças e jovens que todos os anos ficam fora do sistema de ensino?

Alguém alguma vez o ouvirá dizer que 45% das crianças angolanas sofrerem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos?

Alguém alguma vez o ouvirá dizer que a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos?

Alguém alguma vez o ouvirá dizer que 80% do Produto Interno Bruto angolano é produzido por estrangeiros; que mais de 90% da riqueza nacional privada é subtraída do erário público e está concentrada em menos de 0,5% de uma população?

Alguém alguma vez o ouvirá dizer que o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder?

Não. O silêncio (ou cobardia) são de ouro para todos aqueles que existem para se servir e não para servir. E esse silêncio dará, obviamente, direito a ser convidado para passar férias na casa flutuante de Isabel dos Santos, a filha do presidente vitalício.

Folha 8

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PR GUINEENSE PROMOVE NEGOCIAÇÕES COM BASE NOS PARECERES DE PORTUGUESES



O Presidente da Guiné-Bissau, José Mário Vaz, pediu pareceres de dois constitucionalistas portugueses, Vital Moreirae Jorge Miranda, para tentar desbloquear a crise política que assola o país, disse hoje à Lusa fonte partidária.

De acordo com a mesma fonte, que tem assistido às negociações que José Mário Vaz tem promovido com as partes desavindas na política guineense, a Presidência apresentou hoje os pareceres que pediu a Vital Moreira e Jorge Miranda sobre o diferendo no Parlamento.

“Os dois pareceres foram coincidentes em assumir que tanto a substituição de deputados como a pretensa mudança na Presidência da mesa do Parlamento são atos ilegais”, disse à Lusa a fonte partidária.

Quinze deputados do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), no Governo, foram substituídos no Parlamento, depois de a direção do partido os ter expulsado de militância.

Os deputados recusaram-se a acatar a perda de mandato por a considerarem inconstitucional.

Os 15 deputados do PAIGC, apoiados pelo Partido da Renovação Social (PRS), que lidera a oposição, alegam terem assumido a presidência do Parlamento depois de terem “destituído de funções” o presidente e vice-presidente do órgão, Cipriano Cassamá e Inácio Correia, respetivamente.

A nova mesa que seria presidida por Alberto Nambeia, líder do PRS diz ter aprovado uma moção de rejeição ao programa de Governo do PAIGC e ainda uma moção de censura ao mesmo, documentos que estão na posse do Presidente guineense, para promulgação.

Perante os dois pareceres que foram lidos em voz alta por um assessor do Presidente guineense, o líder do PAIGC, Domingos Simões Pereira, disse compreender e respeitar as opiniões “dos dois ilustres professores portugueses”.

O antigo primeiro-ministro guineense entende, contudo, que aos dois constitucionalistas lusos poderão ter faltado “todos os elementos de análise” para a formulação dos pareceres.

O líder do PAIGC chamou ainda a atenção sobre o facto de as decisões de órgãos de soberania não puderem ser vinculadas a pareceres jurídicos, ainda que de técnicos credenciados, disse a fonte.

Acrescentou que Domingos Simões Pereira lembrou que no passado “houve pareceres” de constitucionalistas que alertavam o chefe de Estado no sentido de não demitir o Governo por si liderado, “mas que não foram respeitados”.

Falando aos jornalistas, o líder do PAIGC voltou a vincar a sua predisposição para o diálogo, mas sem que isso possa significar que as partes vão deixar de lado a observância da lei, disse. Afirmou entender do chefe de Estado que as partes desavindas voltarão a se encontrar na próxima sexta-feira.

Uma outra fonte que presenciou o encontro disse à Lusa que José Mário Vaz deu as partes até sexta-feira para que encontrem uma plataforma de entendimento que lhe será apresentada para análise. 

Lusa, em O Democrata

União Europeia e organização portuguesa apoiam projeto de parque urbano de Bissau



O primeiro parque urbano de natureza e de lazer de Bissau deverá ser construído até outubro, num projeto da organização portuguesa Monte e da Câmara Municipal de Bissau (CMB), anunciou hoje a delegação guineense da União Europeia (UE).

O projeto, financiado também pela UE, visa a recuperação da Lagoa de N'Batonha, situada entre o mercado central de Bissau e os terrenos da Marinha guineense.

O anúncio foi feito hoje em comunicado por se assinalar o Dia Internacional das Zonas Húmidas.

O parque vai incluir um centro interpretativo da natureza no local, um percurso pedonal, espaços para desporto, uma pista de corrida, parque infantil e cafetaria, entre outros.

Durante os meses de março e abril será definido de forma participativa "um modelo de gestão do espaço para sua manutenção" e o concurso para exploração da cafetaria e esplanada deverá ser lançado até julho.

Para o último trimestre do ano estão previstas ações de sensibilização sobre a importância das zonas húmidas, em particular, atividades de educação ambiental dirigida às escolas de Bissau.

O projeto está orçado em 395 mil euros, comparticipado a 80% pela UE.

O "Kau di Catchu ku Kau di Pecadur" visa apoiar os quadros técnicos da CMB na identificação das problemáticas associadas à gestão do território urbano, como a preservação e a recuperação de zonas de elevado interesse ecológico, potenciando os seus usos e valências.

Além da requalificação de um espaço público, prevê-se capacitar os técnicos municipais e desenvolver "um modelo de gestão, através de uma parceria público-privada" que possa ser aplicado noutros pontos da capital.

A Monte-ACE é uma organização não-governamental portuguesa criada em 1996 que tem como missão "promover o desenvolvimento sustentável e inclusivo das comunidades rurais".

LFO // EL - Lusa

Heritage Foundation: MpD quer Cabo Verde no top 15 do Índice de Corrupção



O Movimento para Democracia quer Cabo Verde no top 15 a nível mundial do Índice da Corrupção da Heritage Foundation. O vice-presidente do maior partido da oposição, Olavo Correia, reagia ontem às antenas da RCV ao último relatório divulgado esta terça-feira, 2 de Fevereiro, por esta instituição que mede a liberdade económica mundial e que classificou o nosso país na 57ª posição e o considera “moderadamente livre”.

Para o MpD, a localização de Cabo Verde neste índice mostra que as medidas adoptadas pelo Governo não surtiram efeito. Olavo Correia acredita que Cabo Verde tem todas as condições para equiparar-se a países como Maurícias, que ocupa a 15ª posição é “totalmente livre”. “Temos de querer estar na mesma posição das Maurícias. Temos todas as condições para formatar a nossa posição e criar uma estrutura económica e jurídica para atingirmos o top 15 a nível mundial”, assevera.

Este dirigente ventoinha defende que este é um desafio e que, para chegarmos lá, temos de centrar o nosso olhar no futuro. Esta é aliás, afirma, a abordagem do MpD. “Temos todas as condições para chegar lá. Não queremos ser um país moderadamente livre. Queremos ser um país totalmente livre. O nosso programa de governação aponta neste sentido”, realça o vice-presidente do MpD, lembrando que nos últimos quatro anos Cabo Verde melhorou apenas três posições a nível mundial.

Para melhorar o seu score e atingir objectivos mais ambiciosos, defende que o Governo tem de acompanhar o grau de exigência em relação à aquilo que acontece no mundo. “Temos de ter um sistema judicial eficiente e célere na resposta às demandas dos cidadãos, empresas e investidores, impor limites ao endividamento e às alterações oficiais, reforçar a abertura do mercado e reduzir o peso do Estado na economia. Também despartidarizar a máquina pública e garantir uma separação efectiva entre o Governo, o Estado, a Administração Pública e a sociedade civil e avançar para um estado de burocracia zero”, enumera.

O facto do relatório do Heritage Foundation considerar que Cabo Verde regista um baixo nível de corrupção, em comparação com outros países africanos também não satisfaz o MpD. Olavo Correia defende que só quando o Estado criar as condições para que todos possam ter acesso aos arquivos correntes da máquina pública e também para evitar o nepotismo, o país dará um salto em matéria de combate a corrupção.

A Semana

Cabo Verde. PR requer inconstitucionalidade de “dispositivos do Código Eleitoral”




Artigos do Código Eleitoral foram hoje enviados para o Tribunal Constitucional.

Jorge Carlos Fonseca enviou hoje ao Tribunal Constitucional um pedido de inconstitucionalidade de diversos artigos presentes no Código Eleitoral. Segundo a Presidência da República trata-se “de normas sobre a liberdade de imprensa e de informação durante períodos eleitorais, incluindo algumas sobre sondagens”.

Entre elas está o artigo 105º do código eleitoral considerado pela generalidade dos jornalistas como uma ‘mordaça’ que condiciona a liberdade de imprensa.

Veja em baixo a lista de artigos enviada pelo Presidente da República para fiscalização do Tribunal Constitucional:

- 105.º, n.º 2, alíneas c), d), e) e f) por violação dos princípios da liberdade de expressão e de informação e da liberdade de imprensa, que se extraem dos artigos 48.º e 60.º da Constituição da República;

- 106.º, n.º 1, por violação dos princípios da liberdade de expressão e de informação e da liberdade de imprensa, que se extraem dos artigos 48.º e 60.º da Constituição da República;

- 106.º, n.º 8, por violação dos princípios da liberdade de expressão que se extrai do artigo 48º, da liberdade de criação intelectual, artística e cultural prevista no artigo 54º n.º1, e do direito de participação política estabelecido no artigo 55º n.º1, todos da Constituição da República;

- 99º, n.º 1, por violação do direito à informação e à liberdade de expressão previstos no artigo 48º, e do princípio democrático, previsto no artigo 4º, e do Direito à participação livre e consciente na vida política que se extrai do artigo 55º n.º 1, todos da Constituição da República;

- 279º, por violação do princípio da tipicidade, vertente do princípio da legalidade, e do princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso (artigos 32.º, n.º4 e 17.º n.ºs 4 e 5, in fine, da Constituição da República.

Foto: Rendy Santos

EM DIREÇÃO À PAZ, SEM A OPOSIÇÃO ARMADA



Thierry Meyssan*

As negociações de Genebra3, para a paz na Síria, acabam de começar após a oposição pró-saudita se ter finalmente curvado às exortações do Departamento de Estado dos E. U. para nelas participar. Ora, observa Thierry Meyssan, enquanto Washington e Moscovo esperavam em dezembro uma paz rápida e adoptavam a Resolução 2254, os Estados Unidos têm agora a convicção que os líderes escolhidos por Riade são incapazes de exercer o poder.

As negociações previstas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas para resolver o conflito sírio deverão começar em Genebra hoje, 1 de fevereiro de 2016, com uma semana de atraso. Contrariamente ao que esperavam os neo-conservadores e os falcões liberais, no início da guerra, não se tratará de escrever a acta de capitulação da República Árabe Síria e de a substituir por um «Órgão de Transição», dominado pela Irmandade Muçulmana, mas de negociar um cessar-fogo, para depois organizar a redacção de uma nova constituição e de eleições abertas a todos.

As Nações Unidas desacreditadas

Em primeiro lugar, o próprio princípio de negociações sob a égide das Nações Unidas foi colocado em causa desde a publicação de informações sobre o papel secreto —desde 2005— do Secretário-Geral Adjunto, Jeffrey Feltman, e do seu perito, o académico alemão Volker Perthes [1]. Parece, com efeito, que as Nações Unidas não são parte neutra, mas, sim, que participam no conflito. Foram as Nações Unidas que organizaram a Comissão Mehlis e o Tribunal Especial para o Líbano, encarregues de de acusar, julgar e condenar o Presidente Emile Lahoud e Bashar el-Assad pelo assassínio do antigo Primeiro-ministro Rafic Hariri. Foram as Nações Unidas que pagaram as falsas testemunhas, criaram um tribunal, sem o fazer aprovar nem pelo Governo nem pelo Parlamento libanês, e, depois recusaram mostrar o seu relatório sobre a reconstrução do assassinato. Foram, novamente, as Nações Unidas quem redigiu, em julho de 2012, o plano Perthes-Feltman de capitulação total e incondicional da República Árabe Síria, depois fazendo arrastar as negociações na esperança de uma indiscutível vitória dos jiadistas.

O facto que a Rússia e os Estados Unidos tenham escolhido não divulgar o plano Perthes-Feltman, mas, que não tenham, no entanto, conseguido conter a ação belicosa do Secretariado-Geral das Nações Unidas, salvou, por um lado, a instituição onusina de uma crise existencial, mas também lhe fez perder toda a credibilidade, pelo menos no dossiê sírio.

De facto, os opositores da República Árabe Síria sabem que os organizadores onusinos são agora, para eles, aliados inúteis por estarem sob pressão da Rússia e dos Estados Unidos. Ao invés, a delegação síria mantêm sempre a possibilidade de recusar um acordo que lhe seria imposto com base em manobras secretas, prévias, de organizadores onusinos.

É por isso que Genebra3 aparece, agora, não mais como uma iniciativa da Onu mas como um arranjo russo-americano.

Os novos líderes da oposição marginalizaram-se a si próprios

Em segundo lugar, os Estados Unidos que desejavam, até aqui, fosse quer destruir a República Árabe Síria, fosse, no mínimo, impôr-lhe um compromisso, não têm mais interesse nisso. Como havia analisado a Rand Corporation, há já um ano, qualquer outro governo além do actual seria pior, tanto para Moscovo quanto para Washington.

Com efeito, no início da guerra a oposição estava representada por intelectuais, que a CIA havia corrompido no decurso de anos precedentes, e pelos Irmãos Muçulmanos que trabalhavam para Langley (sede da Cia-ndT), pelo menos desde 1953. Não é mais o caso, hoje em dia. Os intelectuais, que tinham capacidade para governar, tiveram que dar lugar aos senhores de guerra recrutados e financiados pela Arábia Saudita. Ora, o reino saudita é um regime tribal que só aceita laços de suserania-vassalagem tribais. Ele escolheu, pois, estes chefes de guerra em função da sua proveniência ou da sua origem tribal. Ao fim de vários anos, mesmo aqueles que provinham de famílias urbanas regrediram a comportamentos tribais. Ao fazê-lo, eles apenas podem representar os nómadas do deserto sírio-saudita. Quanto aos Irmãos Muçulmanos, eles não conseguiram conservar o poder na Tunísia e no Egipto. Por conseguinte, não mais estão considerados por Washington como aptos a governar um país.

A nomeação, em Riade, de um presidente e de um porta-voz do Comité de negociações escolhido entre os antigos ministros baathistas não chegou para mascarar a realidade dos senhores de guerra.

É, aliás, uma lição desta guerra: a aliança contra-natura dos Ocidentais com os Saud chegou a um impasse. O que era tolerável para os Saud em sua casa, não o é no estrangeiro. A expansão do wahhabismo levanta, hoje em dia, problemas no seu próprio solo aos Europeus, a do tribalismo no Próximo-Oriente Médio seria uma catástrofe para todos, já que isso significaria uma «somalização» da região. Era, é certo, o objetivo dos Straussianos, mas não é mais o do Presidente Obama. Jamais se conseguirá sublinhar o bastante a incompatibilidade dos Estados modernos com as sociedades tribais, que conduziu, aliás, todos os Estados modernos a sedentarizar a sua população.

Damasco, poderá chegar à reconciliação sem Genebra 3 ?

Em terceiro lugar, a República Árabe Síria que havia sido forçada a negociar, em 2012, para sobreviver, não o é mais hoje em dia. No terreno, por todo o lado, salvo no Nordeste, o Exército Árabe Sírio reconquista o território que havia perdido. Ela só vai a Genebra por estar convencida da necessidade de se reconciliar com os 10% da sua população que apoiou os Irmãos Muçulmanos.

Considerando a ausência da delegação da oposição durante toda a semana passada, Damasco interrogou-se de novo sobre as suas outras opções. Ela não teve necessidade das Grandes potências para concluir localmente acordos de reconciliação, e poderia, provavelmente, conseguir isso também no plano nacional se a oposição admitisse renunciar a «derrubar o regime».

Em conclusão, as negociações de Genebra não podem senão levar a mais que a integração das facções da oposição no seio de um governo de união nacional. Ora, isto é impossível tendo em conta as posições dos padrinhos desta oposição (Arábia Saudita, Turquia e Catar). No seu formato actual, nada pode pois resultar destes solilóquios.

A reter: 

- A equipe de negociadores das Nações Unidas (Jeffrey Feltman, Staffan De Mistura e Volker Perthes) perdeu a sua aparência de neutralidade desde a revelação do seu envolvimento secreto contra a República Árabe Síria.
A oposição patrocinada pela Arábia Saudita, apesar de duas figuras de fachada, é agora apenas composta de chefes de guerra saídos de tribos sírio-sauditas, o que a impede de pretender representar o conjunto dos Sírios.
- A Síria não precisa mais das Grandes potências para chegar à reconciliação nacional.

[1] “A Alemanha e a ONU contra a Síria”, Thierry Meyssan, Tradução Alva, Al-Watan (Síria), Rede Voltaire, 28 de Janeiro de 2016.

Thierry Meyssan* – Voltaire.net - Tradução Alva

*Intelectual francês, presidente-fundador da Rede Voltaire e da conferência Axis for Peace. As suas análises sobre política externa publicam-se na imprensa árabe, latino-americana e russa. Última obra em francês: L’Effroyable imposture: Tome 2, Manipulations et désinformations (ed. JP Bertrand, 2007). Última obra publicada em Castelhano (espanhol): La gran impostura II. Manipulación y desinformación en los medios de comunicación(Monte Ávila Editores, 2008).

POR UM IMPOSTO SOBRE TRANSAÇÕES FINANCEIRAS



Prabhat Patnaik [*]

O senador Bernie Sanders que se considera um "socialista" e está a fazer campanha com algum êxito pela nomeação como candidato do Partido Democrático nas próximas eleições presidenciais dos Estados Unidos, saiu-se com uma proposta de um Imposto sobre Transacções Financeiras, cujas receitas serão utilizadas para tornar a educação em faculdades gratuita para todos os estudantes em instituições públicas. Uma vez que desta vez a campanha no interior do Partido Democrático está a centrar-se no controle sobre a Wall Street, a proposta de Sanders, que a afecta directamente, adquire grande significado.

Um Imposto sobre Transacções Financeiras tem afinidade com um imposto sobre vendas de "commodities financeiras". Isto pode cobrir um vasto conjunto de transacções financeiras, desde serviços bancários a transacções com moeda estrangeira, acções, derivativos e commodities de "futuros". Destes, o imposto sobre transacções no mercado de acções, como distintas de outras transacções, incluindo transacções de divisas sobre as quais o conhecido economista James Tobin sugerira há alguns anos cobrar um imposto para restringir a actividade especulativa, é o que está actualmente a atrair a atenção devido ao seu maior potencial para a geração de receita. E é com isto que me preocuparei, no que se segue.

Tal como no caso de quaisquer impostos sobre vendas, as taxas de imposto sobre transacções no mercado financeiro irão naturalmente variar conforme os activos. Mas tem sido estimado que mesmo se as vendas de acções forem tributadas a uma percentagem nominal de 0,1 por cento e as de derivativos a uma ainda mais minúscula percentagem de 0,01 por cento, então, nos Estados Unidos, a receita gerada será de US$130 mil milhões em um ano e de US$1,5 milhão de milhões ao longo de uma década, o que é uma soma enorme.

A ideia de utilizar receitas de impostos sobre transacções financeiras para despesas de bem-estar social tem sido discutida a fundo desde há algum tempo. Alguns sugeriram mesmo um imposto sobre transacções financeiras globais para atender as necessidades de saúde em países subdesenvolvidos e outros argumentaram em favor de um esquema de pensões de velhice global pago por um imposto global sobre transacções financeiras.

Mas um imposto sobre transacções financeiras é advogado não apenas devido ao seu potencial de receitas. Supõe-se que ele também reprima flutuações amplas no mercado de acções, ao eliminar todo um conjunto de negócios de curto prazo, os quais não só são extremamente inflados em relação à economia real nas economias capitalistas contemporâneas como em comparação estão mesmo a crescer mais rapidamente. Aparentemente, mesmo o FMI agora acredita que um sector financeiro demasiado inflado actua como um travão à taxa de crescimento da economia real e inclina-se a favor de uma redução da sua dimensão relativa. Um imposto sobre transacções financeiras pode ser um instrumento para alcançar este objectivo.

OLIGARQUIAS CORPORATIVO-FINANCEIRAS OPÕEM-SE À PROPOSTA DE IMPOSTO 


Como era de esperar, tais propostas de imposto invariavelmente despertaram oposição maciça das oligarquias corporativo-financeiras de todo o mundo. Mesmo na Índia, quando um imposto sobre transacções de acções foi introduzido, e isso com uma taxa absurdamente modesta, ele ainda desperta tal hostilidade que a taxa teve de ser reduzida ainda mais. Também nos Estados Unidos, a proposta de Bernie Sanders provocou uma vasta condenação dos porta-vozes das corporações, os quais repetiram números absurdos e sem base sobre quanto a taxa de crescimento da economia estado-unidense sofreria se um tal imposto fosse aplicado.

Mas deixando de lado tal exagero, o cerne do argumento dos oponentes do imposto sobre transacções financeiras é como se segue: o argumento para o imposto com base na receita, eles mantêm, contradiz o argumento para o imposto baseado no "efeito estabilizador", isto é, se o imposto realmente tiver êxito em reduzir a especulação e transmitir estabilidade ao sistema, então ele não renderia muita receita. Isto porque a estabilidade pode ser introduzida só através de uma redução do número de transacções que se verificam no presente. Mas se houver uma tal redução no número de transacções então a base do imposto contrai-se em correspondência e, assim, a receita fiscal. Segue-se portanto que os benefícios do imposto são muito exagerados pelos seus proponentes. E uma vez reconhecido este facto, e a modéstia dos mesmos benefícios enfatizada pelos seus proponentes, então tal imposta cessa de ser uma medida valiosa em vista dos seus efeitos indubitavelmente adversos sobre o incentivo dos capitalistas a investir ("espíritos animais").

Este argumento é semelhante àquele que se encontra na defesa dos impostos indirectos sobre commodities, nomeadamente que se a taxa do imposto indirecto for aumentada no caso de alguma commodity particular para desestimular o seu consumo, então ela não pode ser simultaneamente advogado como uma medida destinada a gerar receita.

Contudo, tal argumento baseia-se numa falácia lógica. Suponha-se, como tem sido estimado para os Estados Unidos, que a elasticidade-preço da procura por commodities financeiras é a unidade, o que significa que se o custo de transacções financeiras for duplicado então o volume de transacções é cortado pela metade, deixando intacto o valor total das transacções. Agora, vamos supor que um Imposto sobre Transacções Financeiras duplique o custo das mesmas, isto é, enquanto activos financeiros no valor de Rs100 cada foram vendidos na quantidade das 100 unidades anteriores, com um valor total de vendas montando a Rs10.000, agora o imposto aumenta o custo de cada activo para Rs200, devido ao que o volume de activos transaccionados desce para 50, com o valor das vendas totais permanecendo nos Rs10.000 como antes. Nesta nota situação, contudo, ainda haveria Rs5.000 de receita fiscal gerada (isto é, Rs100 vezes 50), o que significa que houve uma queda substancial no volume de transacções e ainda um aumento na arrecadação de receita fiscal.

A falácia de que acabo de falar surge devido a uma confusão entre a elasticidade da procura em relação à taxa de imposto e a elasticidade da procura em relação ao preço da commodity financeira. Mesmo quando esta última é unitária, a primeira não é. Isto acontece porque o imposto é apenas um componente, e um componente menor, do preço total. Portanto, mesmo quando uma ascensão no preço por causa do imposto leva a uma queda equi-proporcionada na quantidade procurada, isto leva a uma queda menos do que equi-proporcionada em comparação ao aumento na taxa de imposto. Eis porque a magnitude da receita fiscal aumenta com um aumento na taxa do imposto.

A oposição do capital financeiro a uma Taxa sobre Transacções Financeiras, portanto, não é baseada em quaisquer argumentos válidos: ela surge pelas mesmas razões da sua oposição ao Imposto sobre Transacções de Divisas ou à Taxa Tobin, nomeadamente que está interessada na especulação ao passo que todos estes impostos são destinados precisamente a reduzir a especulação.

John Maynard Keynes, o famoso economista britânico do século XX, argumentou que o mercado capitalista é intrinsecamente incapaz de distinguir entre "empresa" e "especulação", os quais ele definiu respectivamente como comprar um activo para "manter" e compra um activo para vender amanhã. É esta incapacidade que, segundo ele, constituía o fracasso do mercado. E ele advogou medidas que reduziriam o impacto da especulação sobre a actividade económica. O problema, contudo, é que o capital financeiro está interessado na especulação. E uma vez que qualquer coisa que reduza o impacto da especulação sobre a economia real ipso facto também reduz a especulação per se, ele opõe-se a tais medidas. Isto explica sua hostilidade ao Imposto sobre Transacções Financeiras.

UTILIZAÇÃO POTENCIAL PARA DESPESAS COM BEM-ESTAR SOCIAL 

O potencial para utilizar este imposto para despesas com bem-estar social na Índia já foi discutido num artigo anterior ( People's Democracy, 01/Novembro/2015). Para recapitular o argumento, os recursos adicionais necessários para um plano de cobertura universal da saúde pública na Índia é cerca de 1,8 por cento do PIB. O valor das transacções diárias no mercado indiano de acções nos últimos meses tem estado em torno dos Rs2 lakh crores . Isto significa que um imposto de 0,37 por cento sobre transacções no mercado de acções, o qual é ainda mais baixo do que o imposto de 0,5 por cento sugerido por James Tobin sobre transacções de divisas, será perfeitamente suficiente para a Índia financiar um esquema público de cobertura universal de saúde.

A oposição a este plano na Índia, o qual será imensamente benéfico para os milhões de pobres no país, tal como o plano de Sanders nos Estados Unidos, vem da oligarquia corporativo-financeira. Isto naturalmente é expectável, pois se reformas orientadas para o bem-estar social com magnitude de grande alcance pudessem ser efectuadas "pacificamente" sob o capitalismo então a necessidade de transcender o sistema dificilmente se levantaria. Esta necessidade levanta-se precisamente porque a oposição dos capitalistas faz com que qualquer plano assim destinado a converter o sistema numa forma de "capitalismo do bem-estar" seja uma mera fantasia, como a actual imposição de "austeridade" sobre grandes extensões da Europa a expensas dos programas de bem-estar existentes está claramente a demonstrar.

No entanto, a exigência – tal como a de Sanders – de um Imposto sobre Transacções Financeiras a fim de pagar educação pública e gratuita, é de grande importância. Se apenas uma fracção desta exigência for realizada, então é tudo para o bem público. E na medida em que não for realizada, esta exigência ainda assim desempenha o papel de uma "exigência transicional" no sentido leninista, a qual torna o povo consciente da razão precisa porque continua a penar na miséria, ignorância e má saúde, mesmo no meio da notável riqueza desfrutada por uns poucos. 

[*] Economista, indiano, ver Wikipedia 

O original encontra-se em peoplesdemocracy.in/2016/0131_pd/financial-transactions-tax

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/
 

LISBOA AVISA QUE BERLIM TEM QUE CUMPRIR AS REGRAS



“Agência Luxemburguesa de Notícias, segunda-feira, 9h13’, do nosso correspondente em Lisboa

Francisco Louçã – Público, opinião*

Fonte do Governo de Lisboa reiterou hoje a sua apreensão quanto à execução orçamental da Alemanha e às respostas do governo Merkel às autoridades europeias.

A reiterada violação dos tratados europeus pelo governo Merkel-Gabriel tem criado preocupação em Portugal, afirma essa fonte, particularmente desagradada pelo acordo entre Merkel e Hollande para que a França, pela 11ª vez em 16 anos, não cumpra as regras do pacto de estabilidade. Mas, sublinha a fonte do governo português, o problema para Portugal e para os países mais atentos às regras internacionais é que a própria Alemanha tem registado níveis de saldo orçamental sempre fora da grelha definida pelos seus compromissos, prejudicando desta forma a credibilidade dos tratados e afectando os seus parceiros europeus.

O governo português já tinha sido perguntado sobre o assunto quando se formou a actual coligação na Alemanha e foi então mais prudente, tendo o ministro dos negócios estrangeiros afirmado que “espero que os parceiros da coligação tenham consciência de que a Europa não aceita que o rumo traçado seja alterado ou prejudicado e desejo os melhores sucessos à Chanceler no cumprimento desses compromissos”. Assim, a declaração actual demonstra um escalonamento da pressão do governo português, entre outros, quanto ao Orçamento da Alemanha e à respectiva execução.

A Alemanha nunca divulgou o esboço de proposta de Orçamento que teria a obrigação de submeter a inspecção prévia em Bruxelas. No entanto, o governo alemão recusou comentar estas declarações”.

Não foi assim. E não podia ser, pois não?

*Artigo publicado em 1 de Fevereiro 2016

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