O
vice-presidente da UNITA diz que Angola é uma "ditadura com capa de
democracia". De passagem por Berlim, Raúl Danda falou à DW África.
"O
fim da era dos Santos" foi um dos temas que dominou o Fórum Angola 2017.
Os desafios pós-eleitorais no país e a diversificação da economia foram o mote
para o encontro desta terça-feira (30.05.), em Berlim.
Para
a discussão, a organização não-governamental britânica Chatham House e a
Fundação alemã Konrad Adenauer convidaram as principais forças políticas
angolanas. Mas o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), o partido no
poder, não compareceu. A Convergência Ampla de Salvação de Angola-Coligação
Eleitoral (CASA-CE), da oposição, não conseguiu estar presente. E a União
Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) acabou por ser o único
partido angolano representado na capital alemã.
A
DW África entrevistou o vice-presidente do principal partido da oposição
angolana. E começou por falar com Raúl Danda sobre o regresso do Presidente
José Eduardo dos Santos a Luanda, depois de quase um mês de ausência em Espanha
para tratamento médico.
DW
África: Chega à Alemanha um dia depois de José Eduardo dos Santos ter
voltado a
Angola. Como vê este regresso?
Raúl
Danda (RD): Acho que o Presidente da República tinha de regressar de
qualquer maneira. Sou das pessoas que acham que o Presidente da República, como
qualquer outra pessoa, é apenas um ser humano. E eu acho que as circunstâncias
políticas no seio do próprio partido, o MPLA, têm estado a forçar demais a
atividade do Presidente da República, algo que o prejudica. Vê-se que o
Presidente não está muito bem. Enquanto angolano, quero que o Presidente da
República esteja bem. E é preciso que se deixe o Presidente da República
tratar-se, descansar, porque, de facto, ter estado esse tempo todo no
poder, 38 anos, com todas as situações e com todas vicissitudes, é de
facto muito forçado.
DW
África: A UNITA já tinha pedido um esclarecimento formal aos cidadãos angolanos
e tinha dito que ia ao Parlamento fazer esse pedido. Continua a achar que
é preciso uma informação oficial ao povo angolano sobre o estado de saúde de
José Eduardo dos Santos?
RD: Continuo
a pensar que o Presidente da República é o Presidente de todos os cidadãos. E a
vida do Presidente da República deixa de ser uma vida que diga respeito apenas
aos seus familiares e ao ciclo de amigos que ele tenha. E, nessa conformidade, tem
que ser um Presidente, como qualquer outro Presidente do mundo. Quando o
Presidente da República está doente, toda a gente tem de saber que está
doente. Aliás, quem se candidata a Presidente da República ou a vice-Presidente
da República nos termos da nossa lei tem de apresentar um atestado médico,
que mostre que, de facto, está em condições físicas e mentais para poder
dirigir um país. Portanto, é lógico que se saiba que o Presidente está doente e
que se vai tratar aqui ou ali e que padece disto ou daquilo. É normal que se
saiba disso.
DW
África: A UNITA tem denunciado várias irregularidades durante esta campanha
para as eleições de 23 de agosto e já foram anunciadas manifestações para esta
semana.
RD: A
manifestação vai ter lugar no próximo sábado (03.06), porque achamos que é
altura de o país ter eleições livres, justas e transparentes. Temos de sair do
discurso falado para o discurso praticado. Se o Presidente da República
apela a que haja transparência nas eleições, é preciso que ela seja efetivamente verificada.
Estamos a olhar para um comportamento da Comissão Nacional Eleitoral (CNE),
infelizmente muito refém do regime no poder em Angola, porque a Comissão
se move em função da música tocada pelo partido no poder.
DW
África: Refere-se também às duas empresas que foram contratadas para o
processo de observação eleitoral e também ao número de eleitores?
RD: Absolutamente.
Há coisas que se passam no nosso país que parecem milagrosas. Abre-se um
concurso na sexta-feira à noite, temos sábado, temos domingo e temos
segunda-feira, que é o dia 1 de maio, que é feriado, depois temos o dia 2 e no
dia 3 essas empresas já têm uma proposta, já têm documentos verificados pelas
nossas embaixadas. E as propostas nem sequer são enviadas por e-mail, mas sim fisicamente,
quando, no entanto, se parte de um caderno de encargos completamente viciado em
termos políticos, porque isso não obedece à lei.
DW
África: A UNITA também apresentou queixa contra a cobertura eleitoral por
parte dos órgãos da comunicação social estatais. Já mudou alguma coisa desde
que essa queixa foi apresentada?
RD:
Infelizmente não, porque continuamos a viver num país de regime de
partido único com uma capa de democracia, ou seja, o que normalmente chamamos
de "democratura", uma ditadura com capa de democracia.
Madalena
Sampaio (Berlim) | Deutsche Welle
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