O
líder da RENAMO está a contar com a agilidade do Governo para que até ao fim de
2017 haja revisão pontual da Constituição e com isso uma lei de eleição dos
governadores e a lei das finanças das províncias.
Numa
entrevista exclusiva à DW África, o líder da RENAMO, o maior partido da
oposição, revela que afinal as posições militares ainda não foram retiradas do
centro do país, conforme informou o Presidente Filipe Nyusi no último domingo
(25.06.). Dhlakama, que denuncia violações na trégua, diz: "Quem está a
aguentar com a situação sou eu.
DW
África: Em que estágio estão as negociações de paz?
Afonso
Dhlakama (AD): As coisas estão a andar, como sabe em África essas coisas
são lentas, estamos a negociar. Criamos dois grupos: um para os assuntos da
descentralização da administração do Estado e outro para questões militares.
Quanto ao da descentralização da administração do Estado nós pretendemos que
haja uma lei que permita a eleição dos governadores provinciais a partir de
2019. Do nosso lado já fizemos as propostas e queremos que as coisas sejam
feitas, já foram contratados alguns especialistas que têm estado a assessorar
os dois lados, o Governo e a RENAMO, mas sempre há demoras por parte do
Governo. Entendemos que o Governo esteja a marcar passo porque a RENAMO
pretende desmontar o que existe neste momento e que os governadores passem a
ser eleitos pelas populações das províncias. E isto não está a agradar a alguns
camaradas do Governo, mas seja qual for o assunto tornou-se público, não há
forma de impedir que isso venha a acontecer. Neste momento estamos a negociar
para que tenhamos a máxima certeza que até finais deste ano tenhamos a lei já
aprovada na Assembleia da República, isto é, a revisão pontual da Constituição,
para permitir que, de facto, haja já lei de eleição dos governadores e a lei
das finanças das províncias.
DW
África: Caso o Governo da FRELIMO continue a marcar passo até 2019, ano em
devem acontecer as eleições gerais, o que a RENAMO pretende fazer?
(AD): Não
posso adiantar alternativas, só quero acreditar que poderá ser uma pouca
vergonha para o Governo moçambicano, porque o assunto já não é apenas da RENAMO
e da FRELIMO, o assunto tornou-se tema de agenda nacional. E também interessa a
comunidade internacional, e quando me refiro a ela digo a União Europeia, os
americanos e mesmo os africanos estão de olhos postos [em Moçambique], a
observar. Aliás, chegamos a criar um grupo de contacto, com o estatuto de
observador onde estão os americanos, chineses e a União europeia. E de vez em
quando estes procuram informar-se, e querem, de facto, que já nas eleições
presidenciais e legislativas de 2019 os governadores sejam eleitos. Respondendo
diretamente a pergunta, a RENAMO não vai fazer nada, só que o mundo vai ver
quem é que não quer descentralizações e eleições livres e transparentes.
DW
África: As Forças Armadas de Moçambique terão começado a abandonar nove
posições no centro de Moçambique, segundo anúncio feito pelo Presidente Filipe
Nyusi no domingo (25.06.). Isso significa que nas negociações sobre questões
militares tudo corre dentro dos carris?
AD: Também
são lentas, eu explico: estamos a negociar agora o enquadramento de alguns oficiais
nossos, brigadeiros, coronéis e majores que estão lá dentro [das Forças Armadas
de Defesa e Segurança], mas que não estão a ocupar cargos importantes. Aqui a
situação é a mesma, de marcar passo, mas o entendimento é que até antes de
finais de setembro este assunto militar tinha de estar resolvido. Portanto,
enquadrar alguns militares nossos nos lugares de chefia e de alguns
passarem para a Polícia da República de Moçambique (PRM). Estas não são coisas
novas que a RENAMO está a exigir, isso já foi acordado em Roma, só que nestes
anos todos o Governo da FRELIMO não quis implementar. E é por isso que a PRM é
instrumento da FRELIMO aqui, faz parte dos esquadrões da morte, etc. porque
tudo está partidarizado. Então, o que estamos a tentar fazer é despartidarizar
para que passemos a ter instituições do Estado.
DW
África: A RENAMO denunciou recentemente dois casos de violação de tréguas no
centro de Moçambique. Como estão a ser geridos esses incidentes nesta fase de
maior entendimento entre a RENAMO e o Governo?
AD: Em
termos de violação já não se diz quase nada, especificamente a FRELIMO, desde
que declarei a trégua porque tudo já corre muito bem. Mas infelizmente o
Governo não consegue controlar os seus militares. E não digo que são ordens
centrais, porque não quero acreditar que o Presidente Nyusi não se envergonhe
por essa coisas. Mas os militares vão as aldeias, bebem, agridem as mulheres,
mandam parar carros nas vias públicas e exigem dinheiro. Já não é preciso dizer
que isso aconteceu hoje na Gorongosa, antes de ontem aconteceu noutro lugar,
isso é constante, acontece diariamente. Foi criado um grupo de monitoria que
sempre reporta isso ao Presidente do partido e a mim próprio. Mas não tem
havido nada, só nos prontificamos em observar e fica-se pela promessa de por
termo a isso. Mesmo assim tenho garantido ao Governo que não vou retaliar e nem
responder a provocações porque eu é que dei a trégua. Se responder vamos
reacender a guerra e a comunidade internacional vai dizer que todos não
prestam, nem a FRELIMO e nem a RENAMO. É por isso que neste momento posso dizer
do fundo do coração que quem está a aguentar com a situação, a manter a paz,
sou eu porque os meus homens não estão a responder as provocações.
DW
África: Alguns setores da sociedade civil reivindicam o direito a participar
nas negociações de paz. E para além disso receiam um acordo que venha a ser
falível, a semelhança dos anteriores. Em que momento pretendem incluir essas
vozes no processo de negociações?
AD: Minha
senhora, nunca foi prático no mundo. Ainda bem que sabe dizer o que aconteceu
em Roma. O que aconteceu em Roma foi o resultado da luta da RENAMO pela
democracia, foi preciso negociar com o Governo da FRELIMO. E hoje estamos a
negociar pendentes de Roma, como é que um partido qualquer que nunca fez parte
[do Acordo de Roma] pretende puxar a cadeira, sentar e negociar? Negociar o
que? Porque não estamos só a negociar só por negociar, temos uma agenda que a
RENAMO apresentou desde a sua luta. Agora, o que estamos a admitir, e eu
entendo como líder político, é que qualquer moçambicano, qualquer partido
político possa ter uma ideia e possa entregar aos que estão a negociar. O MDM
tentou escrever algumas coisinhae e envolveu também alguns intelectuais.
Agora, de uma forma geral que alguém reclame querer fazer parte das
negociações, achamos que não faz sentido.
DW
África: Nem sequer o MDM que representa o povo no Parlamento?
AD: O
MDM é um partido pequenino com oito deputados. E mesmo que represente não faz
parte da agenda da RENAMO e do que o partido pretende para Moçambique. E já que
é um partido que está na Assembleia da República tem direito a submeter as suas
ideias, mas não é preciso que tenha assento nas negociações. Não se trata de
exclusão.
Nádia
Issufo | Deutsche Welle
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