quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

PORTUGAL | As mulheres da fábrica da Triumph

Mariana Mortágua | Jornal de Notícias | opinião

Desde o dia 5 de janeiro que centenas de trabalhadoras da antiga Triumph, em Sacavém, às portas de Lisboa, guardam dia e noite a fábrica a que deram vida e que agora são forçadas a abandonar. A fábrica pertence-lhes, é muito mais delas que da empresa de fachada (TGI-Gramax) que a comprou há um ano para abrir falência logo a seguir. E, ao contrário do ministro da Economia, que foi na conversa dos grandes investimentos, quem lá trabalha nunca teve dúvidas: a Triumph deslocalizou a produção para um lugar de mão de obra mais barata e encontrou um cangalheiro para se desfazer do que deixou para trás. E para trás ficaram elas, as suas famílias, os anos de trabalho dedicados a fazer o melhor possível da unidade portuguesa de fabrico da multinacional do têxtil.

A fábrica pertence-lhes, e por isso a guardam sem deixar que, depois de tudo, lhes levem também a dignidade. Garantem que haveria clientes, houvesse também uma administração capaz de conduzir o negócio e de estar à altura da qualidade do trabalho ali feito. Protegem a fábrica porque sabem que, se não o fizerem, a TGI-Gamax virá limpar o que resta. Tratará de vir buscar as máquinas e o produto acabado, ou seja, aquilo que ainda lhes pode pagar os salários em atraso. Até lá, enfrentam o cansaço, o frio, e a falta de dinheiro que começa a sentir-se em casa.

Em tempos de afetos e solidariedades tão mediatizados, estas mulheres resistem para que as suas reivindicações não desapareçam na velocidade dos telejornais. Ainda não conseguiram arrancar uma visita ao presidente da República, nem do ministro da Economia que batizou o truque da Triumph há um ano, nem romper com o silêncio cúmplice de boa parte do Parlamento, incluindo do Partido Socialista.

As mulheres da fábrica da Triumph não são vítimas nem casos de glória. Querem trabalho e respeito pelos seus direitos. As mulheres da fábrica da Triumph estão a dar-nos uma rara lição de dignidade. Obrigada.

*Deputada do BE

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