O avanço da chamada Cooperação
Estruturada Permanente (PESCO) da UE é mais um enorme passo no sentido da
criação de um exército europeu. E, como o autor observa, esse exército UE, mais
do que um pilar do federalismo é um pilar de um único estado “europeu”.
O actual presidente da Comissão
Europeia quere-o. O mesmo acontecia com os seus antecessores. E agora toda a UE
está a avançar no sentido da criação de um Exército europeu unificado,
juntamente com um sistema unificado de investigação em defesa.
Desde que votámos pela saída
[Brexit], o aparelho da UE tem-se movimentado rapidamente para a instalação de
um exército UE com um único comando central, sem qualquer controlo nacional ou
democrático. Tendo em conta as passadas agressões da UE – veja-se Kosovo, Ucrânia,
e a belicosa atitude contra a Rússia – trata-se de uma perigosa evolução.
Proporcionaria à UE, actuando como um bloco, as mãos livres para fazer soar os
tambores da guerra onde quer que escolhesse em qualquer parte do mundo.
Também os nossos governos actuam
agressivamente, está claro. Mas estão sujeitos a controlo por parte do povo,
quando optamos por o fazer. O Brexit deveria trazer consigo uma
consciencialização acrescida e o exercício do nosso poder de controlar.
Antes do referendo, os apoiantes
da UE vieram dizer-nos que a afirmação por parte do lado favorável à saída de
que existiam movimentações no sentido da unificação das forças armadas
europeias “não passava de fantasia,” como a colunista do Guardian Jennifer
Rankin.
Escreveu em 27 de Maio de 2016. O
Lord Ashdown disse que a ideia de um exército UE era um “disparate”. No decurso
da campanha, a Comissão Europeia nada disse sobre questões de defesa. Obedecia
a instruções estritas no sentido nada fazer nem dizer que pudesse ser favorável
ao voto pela saída. Uma vez consumada a votação, a UE mostrou-nos a sua
verdadeira intenção.
A ministra da Defesa alemã,
Ursula von der Leyen, aproveitou a oportunidade para deixar as coisas bem
claras em Setembro de 2016, durante uma visita à Lituânia – que neste momento
acolhe um grupo de combate alemão com cerca de 1.000 efectivos. “É tempo de
avançarmos para uma união europeia de defesa, que basicamente é um ‘Schengen de
defesa’,” disse.
Um mês mais tarde a Comissão
Europeia revelou o seu Plano de Acção de Defesa UE. “Uma defesa europeia mais
forte requer por parte dos Estados Membros a aquisição, desenvolvimento e
reserva conjunta de um largo espectro de disponibilidades em terra, no ar, no
espaço e no mar.”
A UE tem de há muito delineado um trajecto no sentido da união de defesa e criou uma ´serie de instrumentos com esse objectivo: um Plano de Desenvolvimento de Segurança e Defesa, a Agência de Defesa Europeia, um Plano de Acção de Defesa, o Programa de Desenvolvimento de Industria de Defesa, um Programa Europeu de Investigação em Defesa…e a lista prossegue.
Tudo isto é empreendido para
expandir a “soberania da UE” – nas palavras do Presidente Juncker – em termos
de defesa, o que constitui a ambição da UE desde o início. Problemas políticos,
o menor dos quais não será certamente a recusa por parte da opinião pública
britânica em aceitar a absorção das forças armadas britânicas num EuroExército,
fizeram com que o processo se arrastasse por décadas. O Brexit veio clarificar
essa objecção.
O nosso voto pela saída da UE
constituiu um factor chave para o desencadear das iniciativas UE. Quatro dias
depois, os ministros dos Negócios Estrangeiros francês e alemão pressionaram no
sentido de uma União de Segurança Europeia. Os Planos vinham sempre embrulhados
numa nuvem de desmentidos, mas o objectivo de longo prazo era claro, como
Romano Prodi, então Presidente da Comissão Europeia, disse em 2000: “Quando
falava de um exército europeu, não estava a brincar. Se não querem chamar-lhe
exército Europeu, não lhe chamem exército Europeu. Podem chamar-lhe
‘Margarida’, podem chamar-lhe ‘Mariana’, podem chamar-lhe o que quiserem.”
A UE planeia integrar as tropas
dos estados membros em unidades conjuntas UE através do desencadeamento de uma
coisa chamada Cooperação Estruturada Permanente (Permanent Structured
Cooperation, ou PESCO). Em Junho de 2017 o Conselho Europeu apelou a que ela
fosse “inclusiva e ambiciosa”. A Comissão é franca acerca dos seus objectivos:
“PESCO é ao mesmo tempo um enquadramento permanente para uma cooperação mais
próxima e um processo estruturado no sentido de aprofundar gradualmente a
cooperação de defesa no interior do quadro europeu.”
A Agência de Defesa Europeia, um
braço da Comissão Europeia, vem pressionando no sentido de “um programa Europeu
de investigação de defesa a iniciar-se quando termine, em 2020, o actual
programa de financiamento”. Está a falar de um orçamento de alguns € 500
milhões o qual “…colocaria a UE entre os 4 maiores investidores em investigação
& tecnologia de defesa na Europa” – omitindo que em resultado dessa medida
muitos dos estados membros seriam forçados a abandonar a sua própria
investigação em defesa.
O que é que tudo isto tem a ver
connosco, uma vez que decidimos sair da UE? Para começar, a UE está desesperada
por controlar os nossos activos militares. A Grã-Bretanha representa um quinto
da despesa total em defesa da UE. A UE quer que nós paguemos por uma associação
próxima com a defesa UE.
A despesa anula da Grã-Bretanha
em investigação de defesa é de cerca de £1.8 milhares de milhões. Somos a
principal potência europeia em investigação de defesa, com o mais alto nível de
exportações relacionadas com investigação de defesa. Isto não é devido à
Agência Europeia de Defesa, mas sim à nossa longa história de investigação em
defesa, despesa militar e excelência científica. A ADE tem actualmente um
orçamento de apenas £27 milhões, dos quais cabe à Grã-Bretanha a segunda maior
fatia, mais de um décimo dos seu orçamento.
O Parlamento Europeu, no seu
relatório de Novembro sobre a Defesa da União, disse que a Política Comum de
Segurança e Defesa da UE “deveria conduzir, a seu tempo, ao estabelecimento das
Forças Armadas Europeias”. Vários corpos estão a ser postos em acção para
tornar isto em realidade. O Serviço de Acção Exterior da UE produziu também o
seu próprio Plano de Desenvolvimento de Segurança e Defesa, com o objectivo de
associar as capacidades de defesa da UE com a sua política externa.
A UE constata a ligação próxima
entre capacidade de defesa e política de defesa – e deseja tornar essa ligação
ainda mais próxima. O Plano Europeu de Acção de Defesa pretende tornar o
Exército europeu realidade com um objectivo de €500 milhões para despesa em
I&D militar, um mercado único para a defesa, racionalização da indústria de
defesa, capacidades conjuntas detidas ao nível UE, e compromisso UE em
segurança de abastecimento (o que implica intervenção no exterior).
O governo May aprovou estes dois
planos em reuniões do Conselho da Europa nos finais de 2016. A Comissão
Europeia disse ao governo que, uma vez que “as decisões relativas à União de
Defesa da UE são tomadas por unanimidade”, se espera que a Grã-Bretanha
“desempenhe o seu papel por inteiro enquanto permanecer como membro”.
O Foreign Office, na sua Revista
de Estratégia de Defesa e Segurança de Dezembro de 2016, propôs “a manutenção
do envolvimento na Política Comum de Segurança e Defesa da UE”. O ministro dos
estrangeiros Alan Duncan disse a deputados no Comité de Escrutínio Europeu que
existia “apoio por parte de outros estados UE no sentido da participação da
Grã-Bretanha na política de defesa da UE depois do Brexit” e que não desejava
“embaraçar tal cooperação futura”.
Mas tem havido por cá profunda
oposição, e na reunião do Conselho da Europa de 13 de Novembro o governo
realizou um dramático recuo em relação ao seu anterior consentimento aos
esquemas militares UE ao recusar integrar o acordo de união militar UE, o
PESCO.
O novo Fundo de Defesa UE será
apoiado por milhares de milhões de euros do Banco Europeu de Investimento. A
Grã-Bretanha é o maior accionista conjunto do banco, portanto a UE pretende
oferecer o nosso próprio dinheiro a empresas britânicas para elas se associarem
a projectos encomendados pela UE, dando a essas firmas um incentivo financeiro
para solicitarem a participação no “mercado único de defesa” da UE.
O impulso UE pela integração tem
um problema intrínseco. A participação em alguma parte da cooperação
industrial, tecnológica ou estratégica envolve ficar vinculado ao planeamento
militar para uma defesa comum UE, e comprometido a contribuir para fundos de
defesa UE.
A integração militar UE, uma
única política externa e de segurança, juntamente com um tesouro UE com um
único orçamento e uma única moeda em toda a UE, tudo isso tem o significado de
um único estado europeu.
Acontece que nós decidimos sair
da UE, devemos permanecer fora dos seus esquemas de defesa, e certamente que
não deveríamos comprometer-nos com eles como forma de adoçar as negociações.
No interesse da paz, devemos
manter o controlo exclusivo das nossas forças armadas, e redirecciona-las não
para a agressão mas para a defesa. Com as nossas zonas pesqueiras para proteger
e deparando com novos inimigos no mundo porque decidimos marcar a nossa independência,
não lhes falta trabalho de defesa.
*Will Podmore é livreiro e
escritor e vive em Londres. É o autor de The EU Bad for Britain – a Trade Union
View, British Foreign Policy Since 1870 e The War Against the Working Class.
Publicado em O Diário.info
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