Em meio a um intrincado jogo de
potências globais (EUA e Rússia) e regionais (Turquia e Síria), eles buscam
autonomia, enquanto combatem vigorosamente o Estado Islâmico, agora
praticamente derrotado
Ercan Ayboga, em openDemocracy | Outras Palavras | Tradução: Heval
Após a derrota do chamado “Estado
Islâmico” (EI) em solo na Síria, a geopolítica dos curdos sírios passou a ser
discutida mais do que nunca. Mais precisamente, devemos falar das Forças
Democráticas da Síria (SDF) e da estrutura política “Federação Democrática do
Norte da Síria” (DFNS), da qual Rojava (Curdistão Sírio/Curdistão do Oeste) faz
parte. O que interessa a este artigo é a crítica de alguns (muitos) círculos de
esquerda de diversos países sobre a cooperação militar com os EUA. Contudo,
isso é restringir a discussão apenas aos EUA, enquanto o conflito também
envolve a Rússia e outras potências regionais como a Turquia e o Irã.
A geopolítica dos curdos sírios
só pode ser entendida quando conectada com o Movimento de Libertação Curda
(KFM), com orientação de esquerda democrática. Começando com o Partido dos
Trabalhadores do Curdistão (PKK) no Curdistão do Norte (Bakur; parte turca) nos
1970, o movimento também se espalhou fortemente para Rojava e
para o Curdistão do Leste (Rojhilat; parte iraniana) nos anos 1990. Quando, em
2003, o Partido da União Democrática (PYD) foi fundado, aceitou como base o
conceito político de Confederalismo Democrático, fundado por Öcalan. Devido à
intensa repressão por parte do regime Baath (na Síria), seu espaço de atuação
permaneceu pequeno, mas a organização da população nunca deixou de existir.
Quando o levante contra o regime
sírio se iniciou na primavera de 2011, o PYD estava interessado em
beneficiar-se da fraqueza do regime e organizar de forma democrática e ampla a
população em Rojava e nas grandes cidades sírias. Nos primeiros meses, o objetivo
também era ampliar a capacidade de autodefesa, pois era difícil prever o
desdobramento do conflito contra o regime Baath, assim como o conflito contra a
oposição reacionária armada (“islamista”/jihadista, racista). Nos meses
seguintes, o movimento revolucionário foi organizado como TEV-DEM que, além do
PYD, inclui dezenas de organizações sociais e pessoas dos crescentes conselhos
populares em toda Rojava. O ENKS, bloco partidário conservador curdo em Rojava,
ligado a Barzani, permaneceu fraco enquanto o TEV-DEM tornou-se o principal
grupo político em na região. Na primavera de 2012, quando ficou claro que a
guerra se intensificaria cada vez mais pela oposição reacionária, começaram os
preparativos para a libertação de Rojava. O movimento precisava estar pronto
para quando chegasse o momento certo.
Diante do momento crucial, o
TEV-DEM viu-se frente a duas decisões fundamentais. Ou Rojava seria defendida
por forças próprias ou teria que ser abandonada. A segunda opção significaria
que o controle de Rojava passaria para outras forças como o ENKS e/ou à
oposição síria. É preciso compreender que as condições para defender Rojava são
muito mais desafiadoras do que em outras partes do Curdistão. O primeiro motivo
é territorial, pois Rojava é majoritariamente plana e não é compacta
territorialmente falando. O segundo é que muitas potências internacionais e
regionais abasteceram todos os lados da guerra na Síria com muito armamento.
Somente o TEV-DEM e alguns pequenos grupos democráticos não armados na Síria
não receberam apoio do exterior. No entanto, o TEV-DEM afirmou que é seu dever
defender Rojava, do contrário haveria um grande revés do Movimento de
Libertação Curda (KFM) em todas as partes do Curdistão. A decisão foi defender
a atual revolução e extrair lições das revoluções anteriores que ocorreram no
mundo.
Os ataques a Rojava se tornaram
sucessivamente mais fortes após o início da libertação bem sucedida de cidades
da região, em julho de 2012. Primeiro, foram alguns grupos da FSA e Al-Nusra,
que foram derrotados pelas próprias forças de defesa dos curdos, YPG (Unidades
de Proteção Popular) e YPJ (Unidades de Proteção da Mulher). Então, o Estado
Islâmico chegou à Síria, que também poderia ter sido derrotado logo no início
de sua ocupação (verão de 2013 até maio de 2014), mas, após terem ocupado
Mossul, ganharam enorme poder expulsando até mesmo os exércitos de Estado. Não
podemos esquecer do regime Baath, que atacava seletivamente a região de tempos
em tempos – o qual também era motivado pelo regime iraniano.
Atualmente a maior ameaça é o
exército turco, que ataca Rojava desde outubro de 2015, quase que diariamente
nas fronteiras e nas linhas de frente. Nenhum poder regional e internacional
tem interesse que uma força independente e democrática na Síria se torne forte.
Nem os Estados ocidentais, que simplesmente ignoraram o TEV-DEM, nem a Rússia
que teve algumas reuniões com o TEV-DEM, mas sem planejar ações em comum. Mesmo
a Turquia, a Síria e o Irã se encontraram com o TEV-DEM (mais tarde, a
Autoridade Democrática, DSA, fundada em janeiro de 2014 como um bloco
democrático expandido), mas com o único objetivo de incorporá-lo ao seu próprio
bloco.
Voltemos ao verão de 2014, quando
o EI teve seu pico de poder. Quase todo o mundo estava chocado e o EI foi
considerado a nova grande ameaça pela maioria das pessoas no Oriente Médio e no
mundo. Neste momento foram as forças do KFM que resistiram contra o EI em
Shingal, o principal assentamento dos yazidis curdos em Başur. No início de
agosto de 2014 tanto o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) como as
forças YPG/YPJ resgataram cerca de 80.000 yazidis e impediram que seu genocídio
fosse maior. Não foi a “comunidade mundial” que fez isso, mas os “curdos
livres” que até então eram considerados “terroristas”, quando não ignorados.
Desde então, a visão sobre os curdos em geral, particularmente em Rojava, e
sobre o PKK, começou a mudar. Logo após essa resistência, formou-se uma
coalizão global liderada pelos EUA contra o EI. Num primeiro momento esta
coalizão estava focada apenas no Iraque.
Foi quando, em setembro de 2014,
aconteceu o grande ataque do EI a Kobane. Os curdos resistiram com tudo o que
tinham. Dezenas de milhares de pessoas em Bakur reuniram-se continuamente na
fronteira com Kobane, a fim de mostrar solidariedade e protestar contra o apoio
do Estado turco ao EI. Milhares de pessoas cruzaram a fronteira para lutar do
lado curdo. Por causa da ameaça global e da resistência bem sucedida em
Shingal, a imprensa internacional também estava presente na fronteira. Nunca
antes na história os curdos estiveram tanto na agenda mundial, que reconhecia
não só o sofrimento, mas também a resistência curda. A maioria do público
mundial teve conhecimento e apoiou a resistência em Kobane!
Embora os curdos estivessem
resistindo fortemente, foi muito difícil ter sucesso na resistência diante de
milhares de soldados de elite do EI. Por causa do embargo da Turquia, as
Unidades de Proteção Popular (YPG) e as Unidades de Proteção da Mulher (YPJ) da
Cizîre, a maior região de Rojava, não puderam se juntar à resistência. Caso
contrário, haveria um equilíbrio que dispensaria o apoio internacional que
necessitaram. Este aspecto é muitas vezes ignorado nas discussões atuais.
Enquanto nos primeiros dias de
outubro de 2014 os EUA diziam publicamente que não viam esperanças, embora já
tivessem começado a bombardear o EI na Síria, poucos dias depois começaram a
bombardear sistematicamente o EI na cidade de Kobane e seus arredores. A
resistência em Kobane, uma grande revolta em Bakur/Turquia e o pedido público
mundial por apoio a Kobane foram os principais motivos para isso. Não houve
longas negociações entre os curdos sírios e os EUA para esse apoio aéreo,
talvez alguns dias. Esta intervenção em Kobane começou sob condições políticas
específicas e não ficou claro seu tempo de duração. Mais tarde, foram
realizadas negociações mais sérias.
Motivações para os EUA e os
curdos sírios
Os EUA podem ter visto na derrota
do EI em Kobane uma oportunidade na estratégia contra o grupo na Síria e no
Iraque. Na verdade, Kobane tornou-se o Stalingrado do EI. Para a revolução de
Rojava, a defesa de Kobane era crucial, caso contrário poderia ser
marginalizada na Síria. Dessa forma, entre o KFM e os EUA houve uma
coincidência de interesses a curto prazo, onde as duas forças permanecem ideologicamente
em posições contrárias. Bom lembrar que os EUA apoiaram ativamente a Turquia
contra o KFM e, em 1999, sequestraram Öcalan, que está presente em todos os
lugares em Rojava.
O bombardeio do EI levou os EUA a
encontrar um parceiro forte na Síria. Por muito tempo os EUA apoiaram, em
cooperação com a Turquia e os Estados do Golfo, a oposição armada contra o
regime Baath. Mas essas forças armadas nunca conseguiram derrubar o regime e
perderam força. Elas também sofreram uma transformação “islamista-reacionária”
e tornaram-se menos comprometidas com os estados ocidentais (mas com a Turquia
e os Estados do Golfo), o que os EUA viram com suspeita. Então, em cooperação
com a YPG / YPJ, os EUA poderiam ter influência na Síria, onde querem ser uma
parte atuante na reconstrução política do país.
No início da cooperação militar,
os EUA planejavam subordinar militarmente Rojava ao governo de Başur. As notas
das conversas realizadas em 14 de março de 2015 entre vários deputados do
Partido Popular Democrático (HDP) e o líder do PKK preso, Abdullah Öcalan,
afirmam que os EUA pressionaram o YPG / YPJ para aceitar fazer parte da
estrutura de comando PDK-Peshmerga e que Öcalan se opôs a isso. O acordo não
aconteceu, mas a cooperação continuou.
Sem dúvida existem outras
motivações a longo prazo para que os EUA iniciem a cooperação militar com
YPG/YPJ/SDF. Um deles é retornar à cena política do Oriente Médio como o
principal poder a ser considerado após as ocupações no Iraque e no Afeganistão.
As críticas aos EUA aumentaram significativamente entre a população no Oriente
Médio após essas ocupações, tanto que se tornaram uma força indesejada em quase
todos os principais estados muçulmanos.
Esse engajamento militar também
ocorreu com o interesse de limitar a influência do Irã no Iraque, que cresceu
principalmente nos anos anteriores a 2014. O novo primeiro-ministro do Iraque,
Haider al-Abadi, designado em julho de 2014, é mais próximo aos EUA do que seu
antecessor, Al-Maliki. O interesse estadunidense em limitar o Irã no Iraque,
assim como na Síria, ganhou destaque após a eleição de Trump para presidente
dos EUA. Irã voltou a ser um dos principais alvos de sua política externa, o
que reforça a motivação dos EUA para continuarem a cooperação militar com a SDF
depois de derrotar o EI na Síria.
Outra razão para essa atuação dos
EUA na região é exercer uma pressão sobre o governo turco, que nos últimos anos
tem se posicionado cada vez mais distante dos estados ocidentais. A Turquia
tenta se beneficiar das contradições entre os poderes internacionais,
particularmente entre EUA e Rússia, para aumentar sua influência no Oriente
Médio. O apoio à Al Nusra e ao EI foi parte desta estratégia. Por outro lado, a
Turquia contornou o embargo ao Irã promovido pelos EUA. Por anos, a OTAN vem suspeitando
dessa política de seus aliados. A maior preocupação da Turquia em política
internacional são os curdos.
Outra motivação, relacionada
diretamente aos curdos como um todo, é o apoio ativo dos EUA aos grandes
partidos PDK e YNK (PUK) em Başur desde 1991, o que conduziu a sua autonomia.
Entre muitas expectativas havia a que os dois partidos se tornassem dominantes
nas outras três partes do Curdistão e enfraqueceria o KFM. Mas eles falharam e
ainda se corromperam e levaram Başur a uma grande crise econômica e política.
Além disso, o PDK tem sido muito influenciado pelas políticas turcas, como por
exemplo na venda de petróleo através dos oleodutos turcos.
Por outro lado, os princípios
visionários de Öcalan são inspirações para uma nova abordagem democrática e
inclusiva. O Confederalismo Democrático é o conceito democrático mais poderoso
no Oriente Médio com chance de implementação por milhões de pessoas em Bakur e
Rojava. Exitosas coalizões pela democracia são formuladas com turcos,
árabes, assírios, entre outros. Nem os Estados Ocidentais nem o bloco
russo-chinês conseguem propor algo para a crise multidimensional no Oriente
Médio – faltam-lhes ideias. A discussão é praticamente apenas sobre “derrotar
terroristas, estabilidade e construção de muros contra refugiados”. Em relação
aos Estados regionais, todos querem a restauração como foi o Congresso de Viena
de 1815 para a Europa. Governos fundados no Islã, que alegam ser um
“alternativa”, continuam antidemocráticos, anti-mulher e acabam por ser
entidades políticas extremamente repressivas.
Se os EUA, a curto ou médio
prazo, acharem que compreenderam o KFM e podem torná-lo dependente, eles o
instrumentalizarão tendo em vista seus próprios interesses. O que isso poderia
representar ainda é difícil de se descrever em detalhes, mas é possível que os
EUA queiram tanto colocar todo KFM “na linha”, quanto desconectar Rojava
das demais partes do KFM. Essa última possibilidade se daria por meio da oferta
de mais apoio, tanto militar quanto na política internacional, com a promessa
de fortalecer seu status político dentro da Síria. Em troca a DFNS precisaria
recusar Öcalan como seu líder ideológico, rejeitando qualquer
solidariedade e relações com o KFM em Bakur (que poderia também significar um
distanciamento do PKK). Isso daria também espaço em Rojava para o PDK de
Barzani e o YNK. Contudo, desde o começo da cooperação militar, em outubro de
2014, não se desenvolveu essa relação de dependência e a balança dessa relação
não unilateral não se alterou significativamente.
É claro que seria muito mais
difícil para as SDF defenderem sua própria terra se os EUA cessassem toda a
cooperação militar imediatamente. A DFNS seria mais vulnerável aos ataques do
Estado turco e das forças do regime sírio. O EI não representa mais uma ameaça
para a existência de Rojava, mas aqui precisamos considerar que a YPG e a YPJ
têm defendido seus territórios antes mesmo da cooperação com os EUA. Agora as
SDF possuem muito mais combatentes, capacidades técnicas, motivações e, por
isso, maior capacidade de defesa. Talvez os exércitos turco e sírio possam
ocupar algumas áreas dentro de um curto espaço de tempo, mas isso implicaria em
uma grande resistência e uma guerra com resultados imprevisíveis.
Cooperação Russa com as SDF
Como dito na introdução, as
Forças Democráticas da Síria (SDF) também possuem importantes relações com a
Rússia desde 2012.
O objetivo da Rússia na relação
com as SDF/DFNS possui muitas faces que certamente são relacionadas umas às
outras. Para assegurar esses objetivos é importante que, no atual estágio das
SDF, essa cooperação militar com os EUA não se aprofundem e terminem em breve.
Um dos objetivos da Rússia é usar
essa cooperação limitada com as SDF contra a Turquia, assim como fazem os EUA.
Durante os primeiros anos do conflito na Síria a Turquia queria derrubar o
regime de Ba’ath, porém desde 2016 seu foco se voltou quase exclusivamente em
limitar o surgimento e fortalecimento de um novo projeto democrático em
Rojava/Norte da Síria. Essa abordagem do governo turco dá à Rússia a
oportunidade de explorar os medos da Turquia. Como as relações política, econômica
e militar com a Turquia foram sólidas por anos, a Rússia permitiu que o
exército turco invadisse a região do triângulo entre Jarablus, Al-Bab e Azaz,
no Norte da Síria em troca da retirada de seu apoio turco a grupos armados em
Aleppo. Essa invasão impediu que as SDF libertassem os territórios de Kobane e
Afrin pudesse ser conectada. Ao mesmo tempo, com o exército turco se
aproximando da Síria, a Rússia pode pressionar as SDF. Esse é o caso
principalmente nos arredores de Afrin, onde há constante ameaça turca. A Rússia
continua em pontos de observação de Afrin, que usa para interesses próprios
contra a Turquia e as SDF.
A Rússia também demonstra
contínuos esforços para que a DFNS encontre um caminho para um acordo com o
regime de Ba’ath e, então, seja possível um tipo de restauração do Estado-Nação
Sírio. A DFNS declarou várias vezes que buscam estrategicamente um acordo com o
regime sírio que poderia construir uma Síria democrática e federal. Se tornou
público que os dois lados se encontraram várias vezes e por muito tempo nesses
encontros o regime sírio esteve pronto para aceitar apenas direitos culturais
dos curdos e o fortalecimento das municipalidades. O DFNS insistiu que seria
aceito uma democracia ampliada no nordeste da Síria e uma democratização básica
de toda a Síria. No final de outubro de 2017, o Ministro do Exterior sírio,
Muallim Walid, declarou que as negociações sobre autonomia para as principais
regiões curdas poderiam ser discutidas, o que representa um grande avanço.
Porém é uma proposta perigosa e inaceitável pois iria dividir as principais
terras curdas das principais regiões árabes. Aqui a DFNS está em uma situação
vantajosa e continua insistindo em ser aceita pelo regime de Ba’ath como uma
região federal.
A DFNS considera suas relações com
a Rússia positivas em vários aspectos. Um deles é limitar os ataques do Estado
turco contra os territórios libertados pelas SDF. Outro é usar a influência
russa para pressionar o regime sírio a negociar uma solução democrática na
Síria e incluir a DFNS nas negociações internacionais para acabar com o
conflito armado. Ao que parece, um dos interesses da Rússia é o de não ampliar
seu envolvimento militar na Síria. Um terceiro aspecto é não aprofundar muito
as relações com os EUA e se beneficiar das contradições dos dois poderes
internacionais e regionais. Apesar disso, ambos os estados têm em suas
políticas internacionais o interesse de permanecer em contato ou até mesmo
desenvolver laços com os curdos, o que hoje inclui também o KFM – mesmo que
taticamente – e não apenas o governo do Curdistão do Sul.
O EI ser totalmente derrotado no
território do Estado sírio nos próximos meses não significa que o exército
sírio começará um ataque militar contra as SDF. Uma das razões para isso é
obviamente a cooperação SDF-EUA em curso, outra é que as SDF são bastante
fortes e uma terceira é o foco nas organizações afiliadas da Al Qaida em Idlib,
Dara e outras regiões.
As características da cooperação
A cooperação militar
caracterizou-se muitas vezes por tensões. Uma grande e controversa discussão
foi sobre a área de Minbic (Manbij), que as SDF queriam que fosse libertada
enquanto os EUA se concentravam em Raqqa. As SDF iniciaram as ações em Minbic
sem o apoio dos EUA. Quando já alcançavam os subúrbios da cidade de Minbic, os
EUA iniciaram o apoio, o que resultou no sucesso final da operação em 12
de agosto de 2016. Este caso evidencia que a cooperação entre as SDF e os EUA
não é unilateral.
No final de agosto de 2016, o
exército turco começou a ocupar Jarablus e durante vários dias as SDF tentaram
libertar região sul do EI e reagir ao exército turco. Embora o exército turco
tenha sofrido perdas, poderia assumir a cidade de Jarablus, já que o EI não
lutou resistiu e recuou após um dia do início da operação. No entanto, depois
de vários dias os EUA negociaram um cessar-fogo entre as SDF e o exército
turco, mas a coordenação entre as SDF e os EUA entrou em uma crise que durou
várias semanas, pois os EUA autorizaram a invasão turca.
Quando as SDF também se
deslocaram de Minbic para Al-Bab, libertando a região do EI, também lutaram sem
o apoio dos EUA que não queriam ir muito para o oeste. As SDF conseguiram
resistir com bastante sucesso contra as tropas turcas que se moviam
paralelamente. Depois que o exército turco tomou Al-Bab, atacou Arimah, uma
cidade no oeste da região de Minbic por duas duas semanas, conseguindo
conquistar apenas uma aldeia que, na verdade, havia sido abandonada por razões
militares, embora equipada com muitos tanques e armas pesadas. Os confrontos
terminaram quando, depois de algumas semanas, a Rússia e os EUA enviaram
soldados para o fronte em torno de Minbic.
O número de soldados dos EUA no
norte da Síria não deve ser exagerado, pois eles não se juntam às lutas em solo
(exceto a cidade de Raqqa) e realizam mais treinamentos ou coordenação da
chegada de equipamento e armas. Em âmbito internacional, o número de soldados
dos EUA é mais discutido do que os combatentes das SDF, que passaram de 50.000.
Às vezes, analistas falam sobre “EUA e parceiros locais” quando tratam da
Síria. Esta abordagem é uma degradação das SDF.
Um mês antes da libertação de
Raqqa, as SDF iniciaram a operação “Cizîre Storm” para libertar toda a região a
leste do rio Eufrates na província de Deir Ez-Zor. Os comandantes das SDF
declararam que o fizeram, embora os EUA não o quisessem. As SDF pressionaram os
EUA devido à urgência: o exército sírio estava avançando rapidamente em direção
à cidade de Deir Ez-Zor. Na verdade, a operação continua muito bem sucedida.
Nas primeiras semanas houve algumas tensões e confrontos com o exército sírio,
mas agora há uma pequena cooperação militar no rio Eufrates, perto da fronteira
iraquiana.
Embora a cooperação militar entre
as SDF e os EUA tenha liderado a Coalizão Global Anti-ISIS realizada
particularmente com a operação de Raqqa, não é possível falar sobre uma
cooperação política. Os Estados Unidos diferem muito claramente entre a dimensão
política e militar e não insistiram para que a DFNS fizesse parte das
negociações de Genebra. Embora o governo dos EUA tenha recusado publicamente as
acusações da Turquia de que o YPG seja terrorista e que o apoio de armas dos
EUA para as SDF seja entregue ao PKK, nunca foi dito nada positivo em público
sobre o processo político em Rojava / Norte da Síria. Apenas algumas altas
autoridades militares emitiram declarações positivas sobre as SDF. Até hoje os
EUA nunca permitiram que uma liderança da DFNS ou das SDF pudesse visitar os
EUA.
Embora a relação militar da SDF
com a Rússia seja muito menos desenvolvida do que com os EUA, politicamente a
Rússia faz declarações mais diretas e positivas sobre os curdos sírios e a
DFNS. Por exemplo, no início de 2017, a Rússia preparou um rascunho para uma
nova constituição e disse com mais freqüência do que os EUA que os curdos
deveriam estar envolvidos nas negociações internacionais. Recentemente, a
Rússia anunciou um “congresso popular da Síria” para o qual o PYD/Curdos seria
convidado.
Entendendo os antecedentes da
guerra
O KFM diz que nos encontramos
atualmente na 3ª Guerra Mundial, com foco no Oriente Médio e a Síria no centro.
Existem três linhas principais. A primeira é o imperialismo internacional
representado principalmente pelos EUA e pela Rússia. A segunda linha inclui os
poderes do status quo regional, tendo como principais atores a Turquia, o Irã e
a Arábia Saudita, que também possuem características imperialistas. A terceira
linha é a das forças revolucionárias e democráticas, liderada pela Revolução
Rojava e pelo PKK. Todas as três linhas lutam entre si, as forças da 1ª e da 2ª
linha lutam entre si. O resultado é uma complexa e contínua coalizão e
conflitos armados. Todas as forças desenvolvem relações com as que parecem
estar em contradição com o inimigo, a fim de alcançar seus interesses
estratégicos.
Isso está relacionado com a
profunda crise estrutural da modernidade capitalista existente no Oriente
Médio. Não é suficiente ter uma abordagem ideológica e política como fazem
muitas organizações de esquerda e socialistas, mas uma abordagem organizacional
e militar é crucial. Sem ser dogmático, é necessário lutar contra ameaças, mas
também ser capaz de reestruturar a própria organização de acordo com as condições,
e compreender a dinâmica e as contradições de outros atores para poder se
beneficiar deles. O objetivo deve ser defender as conquistas e construir uma
sociedade forte auto-organizada e a base para fortalecer o próprio poder. A
criação de áreas de liberdade não é possível apenas com forças amigáveis. Uma
posição dogmática levará à derrota, então cada passo precisa ser bem calculado,
particularmente para os curdos que foram colonizados por quatro estados-nações.
Como o KFM atua nesta abordagem desde sua fundação, ele pôde alcançar o nível
atual de força. Na verdade, o KFM contribuiu para o caos existente através de
sua luta pela liberdade que levou à quebra do papel das potências imperialistas
que pareciam fortes. O potencial da crise é: Ou a modernidade capitalista será
restaurada no Oriente Médio e governará mais 100 anos ou serão criadas
violações da liberdade para toda a humanidade. É por isso que as potências
internacionais e regionais intervêm com tanta força. Não é apenas petróleo e
gás.
Como a população de Rojava /
Norte da Síria vê a cooperação com os EUA
Independente de todos os
acontecimentos e discussões, é muito importante ver como a cooperação militar
com os EUA afeta a sociedade de Rojava. Há duas questões principais. Primeiro,
como os ativistas políticos e a população consideram essa cooperação militar.
Em segundo lugar, como e se as estruturas econômico-político-culturais são
afetadas por essa cooperação.
Entre fevereiro e março de 2017,
o autor realizou cerca de 50 entrevistas com ativistas políticos e pessoas de
diferentes órgãos administrativos sobre seus trabalhos políticos e a situação
político-social. Exceto por uma pessoa, as demais entrevistadas consideraram a
cooperação militar com alguma preocupação. Os entrevistados disseram principalmente
que: essa cooperação surgiu devido a condições difíceis, (particularmente em
Kobane, e inúmeros inimigos), isso não inclui uma dimensão politica, a
cooperação é feita pelos EUA por interesses próprios e é uma cooperação tática.
Havia a consciência clara de que
a revolução não deveria contar com essa cooperação militar que poderia ter fim
a qualquer momento, mas deveria tentar se beneficiar dela. O mesmo é válido
para a Rússia. Estas foram importantes respostas baseadas em uma percepção
crítica e visão lúcida sobre o que acontece. Elas mostram que os ativistas
continuam a desenvolver e aprofundar seus trabalhos políticos e em na busca por
uma sociedade fortemente auto-organizada. O autor observou que, em Rojava, uma
sociedade auto-organizada e autossuficiente inclui comunas cada vez mais
fortes, conselho popular e outras estruturas políticas, uma economia comunal,
um sistema de educação e saúde independente e propagação de autodefesa em todos
os bairros, comunas e aldeias. Esta abordagem está ligada aos 40 anos de
experiência do KFM, que nunca se tornou dependente de qualquer outro poder
político. Sempre houve um compromisso forte e convicto com os objetivos
políticos.
A cooperação militar com os EUA
raramente é tema nas discussões políticas gerais
Como as outras estruturas
políticas e sociais, a imprensa de Rojava não coloca a cooperação militar no
centro das notícias. Em vez disso, dá espaço a informações sobre o projeto
político do federalismo democrático/autonomia, defesa, libertação, criação de
novas estruturas na sociedade e manifestações públicas.
Entre a população, o autor
encontrou poucas pessoas que expressaram uma grande expectativa com os EUA.
Rojava não pode absolutamente ser considerada com Başur. O silêncio dos Estados
Unidos e da OTAN quando o exército iraquiano atacou Kirkuk após o referendo em
Başur em 25 de setembro de 2017 confirmou que é necessária uma abordagem
crítica sobre essa relação.
Os esforços para construir
comunas em todo o território nunca cessaram após o início da cooperação militar
com os EUA; Em vez disso, o número de comunas dobrou. Também continuou a
criação de cooperativas; hoje existem poucas centenas de cooperativas. A
economia democrático-comunal continua a ser desenvolvida e progride através do
convencimento. A crítica à modernidade capitalista e à mentalidade capitalista
em 2017 foi ainda mais forte do que em maio de 2014, quando o autor viajou pela
primeira vez para Rojava.
Nas discussões com os membros do
YPG e do YPJ, não houve supervalorização das relações com os EUA. Na verdade
isso quase não era objeto de discussão, caso o autor não perguntasse. Foi
afirmado várias vezes no Norte da Síria que a cooperação tem uma série de
vantagens, como o acesso a maior número e tipos de equipamentos e armas
militares, mas que é preciso enfatizar que o ser humano é sempre a arma mais
forte em uma guerra.
Um membro do YPG com relações
diretas com comandantes em todas as áreas, informou que os militares dos EUA
nunca tentaram impor algo diretamente ou intervir na vida ou no modelo
político-social-econômico. Ele acrescentou que as SDF e a DFNS nunca aceitariam
qualquer tipo de intervenção nas próprias políticas internas o que os EUA estão
bem cientes disso. Em seguida informou que em cada reunião com os EUA os
membros das SDF estavam sempre preparados e faziam propostas para novas
estratégias e operações de libertação. Muito antes de qualquer cidade com a
área circundante ter sido libertada, a DFNS preparou um conselho civil composto
por pessoas da região local. Segundo ele, a delegação dos EUA não poderia dizer
nada mais do que concordar. No final de 2016, os militares dos EUA queriam
encontrar a coordenação do Conselho Civil de Minbic e ver com seus próprios
olhos como isso funciona. Dito isso, devemos nos lembrar que em cada país ocupado
pelos EUA, uma espécie de governo nacional /civil foi instalado, mas quase
todos falharam, particularmente no Iraque e no Afeganistão.
No final da conversa, o membro do
YPG enfatizou que eles se organizam de modo que estejam preparados para o fim
da cooperação militar com o exército dos EUA a qualquer momento. Segundo ele, a
cooperação tem algumas vantagens importantes, mas também traz riscos.
Particularmente o risco de se acostumarem com o apoio dos EUA ao longo do
tempo, e isso precisa ser discutido permanentemente, e ao qual o YPG precisa
tomar medidas. Outro desafio é que, devido à presença dos EUA na Síria, as
disputas com o regime sírio não devem acabar em uma grande guerra porque a DFNS
quer chegar a um acordo mútuo e respeitoso com o regime Ba’ath. A resposta à
pergunta se a coordenação das SDF não teme que a cooperação possa mudar o
interesse a médio prazo e a visão política dos combatentes das SDF foi muito
interessante: “Acreditamos que temos um forte projeto político com o
Confederalismo Democrático, que é uma ferramenta inspiradora para nós. Que tipo
de ideias nos oferecem os Estados Unidos ou outros estados? Temos uma
democracia mais forte, direta e inclusiva e uma liberdade de gênero em rápido
desenvolvimento. O mais importante, temos a visão para uma nova vida das
pessoas da região maior. O que os estados capitalistas têm é dinheiro, armas e
democracia em crise estrutural. Nada mais”.
Outro aspecto da discussão é que
o número de internacionalistas (pessoas de diferentes partes do mundo que se
juntam à revolução) se manteve alto em 2016 e 2017. Particularmente os jovens
sentem o espírito revolucionário e querem fazer parte da fase de construção ou
defesa e querem entender o processo. O autor pôde falar com dezenas dessas
pessoas, principalmente da Europa ou da América do Norte. Todas elas tiveram
uma visão positiva sobre o desenvolvimento no Norte da Síria e queriam ficar
mais tempo. Houve algumas exceções: o autor conheceu um pequeno número de
homens com idade entre 45 e 55 anos que estavam saindo de Rojava porque não
conseguiam lutar muito no campo de batalha. Eles disseram que vieram apenas
para lutar contra o EI e nada mais.
Os internacionalistas em Rojava
foram atraídos pela maneira como as pessoas se organizam, como discutem e
como elas compartilham entre si o que têm. Mais adiante, eles querem entender
quais são as principais discussões e os principais valores revolucionários. O
objetivo é entender o que esse movimento revolucionário conseguiu reviver ou
desenvolver que outros movimentos revolucionários não conseguiram. Ou, em
outras palavras: o que eles podem aprender com esta revolução, a mais
inspiradora do século 21?
Os internacionalistas não
consideram a cooperação militar entre SDF e EUA como um obstáculo para estarem
comprometidos no Norte da Síria. Devemos levar em conta que existem várias
centenas de internacionalistas, não incluindo os árabes, turcos e outras
pessoas do Oriente Médio. Esse fato deve levar à reflexão quem consideram a
cooperação militar entre as SDF e a liderança global liderada pelos Estados
Unidos como traição e não veem todos os outros desenvolvimentos revolucionários
e sociais profundos no Norte da Síria.
Resumo e Discussão
Em 2014 a cooperação militar
entre as SDF e os EUA liderou a coalizão global anti-ISIS contra o EI que teve
início porque praticamente não havia outra alternativa para ambos os lados.
Considerando seus antecedentes, é uma cooperação paradoxal. Muito provavelmente
não terminará imediatamente após a derrota total do EI na Síria, como as declarações
dos EUA e das SDF implicam; mas devido a uma série de fatores, é difícil prever
quanto tempo e de que forma pode continuar. A cooperação militar não é política
e é muito frágil. Enquanto cooperam com sucesso contra o EI, há tensões entre
os dois lados. No entanto as condições os obrigaram a continuar. Como na Síria
o fim da guerra está se aproximando e diferentes níveis de negociações se
iniciaram, provavelmente a cooperação continuará durante esse processo que pode
levar anos. A DFNS / SDF têm grande interesse em conseguir um acordo com o
regime de Ba’ath com base na ampla democratização da Síria e na aceitação da
DFNS, o que tornaria a cooperação militar com os EUA completamente
desnecessária.
No entanto, existem dois riscos
na cooperação militar em curso com os EUA. Em primeiro lugar, se os EUA
acabarem com a cooperação militar sem qualquer acordo de paz para a Síria,
deixaria o território controlado pelas SDF mais vulnerável para grandes ataques
militares do exército turco e do regime sírio; mas isso não deve acontecer.
Isso significaria uma intensificação de todo o conflito sírio com resultado
incerto. Uma outra possibilidade seria a cooperação contínua de longo prazo
resultar em uma dependência da DFNS/SDF aos EUA devido à deterioração das condições
para o Norte da Síria sem tempo hábil para a DFNS tomar as medidas certas para
evitar essa condição. O resultado seria aceitar a agenda política dos EUA. Mas
até agora não há sinal de que os EUA tenham desenvolvido qualquer predominância
nessa cooperação.
Uma abordagem usada para evitar a
dependência dos EUA é, a partir da experiência em solo no Norte da Síria,
deixar claro para toda a sociedade sobre os riscos da cooperação militar com os
EUA. Ambos os revolucionários civis e militares são conscientes disso e fazem
com que grande parte da população entenda os lados positivos e negativos,
confie na própria força para continuar seu trabalho político na mesma
intensidade e não fique “desapontada” quando a cooperação terminar.
Outro mecanismo contra uma dependência
dos EUA é se beneficiar das contradições de todos os poderes envolvidos na
guerra síria. Aqui, um foco é manter relações com a Rússia, que está
interessada em ter relações com os curdos nos estados da Síria e do Iraque a
fim de criar espaço para seus próprios interesses a longo prazo. Há ainda as
relações com o Estado Sírio, mas elas não são estáveis e, de tempo em tempo,
tem momentos críticos.
Graças à “diplomacia
revolucionária”, que faz concessões ao próprio núcleo revolucionário, foi
possível que a KFM sobrevivesse dentro da guerra síria e desenvolvesse aos
poucos um novo modelo político, primeiro em Rojava e depois em outras partes do
Norte da Síria, reverberando para pessoas progressistas em todo o mundo. A
diplomacia revolucionária inclui também uma avaliação permanente sobre os
riscos futuros, bem como iniciativas para atuar nessas cooperações políticas e
militares.
Outro mecanismo importante – e
claro, também um princípio – é desenvolver a solidariedade internacional com a
revolução de Rojava e, de forma mais ampla, com a KFM, a maior força
revolucionária no Oriente Médio. Uma das frentes estão os vários
internacionalistas em Rojava que têm o papel histórico de transferir a
revolução para seus países, outra frente é o trabalho político contínuo a nível
internacional. A resistência em Kobane estimulou uma grande solidariedade em
todo o mundo, mas não é suficientemente forte para dar grande visibilidade a
nível internacional. A solidariedade internacional não deve ser subestimada à
medida que as forças antirrevolucionárias fazem lobby contra a revolução em
todas as etapas. Apenas uma forte solidariedade internacional – também no
Oriente Médio – tornará os revolucionários menos dependentes de cooperações
militares como com os EUA.
Cada dia que passa aumenta a
adesão de mais pessoas na Síria à DFNS e ao conceito político de uma nação com
Confederalismo Democrático. Quanto mais a revolução viver, mais sírios farão
parte da mudança revolucionária e da sua possibilidade de sobreviver no inferno
entre os estados-nações e as forças fascistas do Oriente Médio.
Se a revolução de Rojava falhar,
provavelmente representaria um revés para as forças democráticas e
revolucionárias no Curdistão, na Síria e também no Oriente Médio ao longo de
décadas, afetando negativamente a política em todo o mundo. A sobrevivência e o
desenvolvimento do processo revolucionário, ou seja, de uma nova perspectiva
democrática, tem o grande potencial para mudar as mentalidades de dezenas de
milhões de pessoas no Oriente Médio.
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