quarta-feira, 21 de março de 2018

Fórum Macau | “As vozes críticas ajudam-nos no caminho a seguir”


Numa altura em que o Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (Fórum de Macau) está prestes a comemorar 15 anos de existência, o secretário-geral adjunto designado pelos PLP fala das prioridades para o mandato de três anos que teve início há seis meses.

Rodrigo Brum revela ao Plataforma que uma entidade externa vai realizar uma avaliação ao Fórum, que servirá de base para um novo impulso. O fortalecimento de uma agenda comum e um maior envolvimento do Brasil sobressaem numa estratégia também marcada por laços mais fortes com a zona da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau.

- Assumiu o cargo de secretário-geral adjunto do Fórum há cerca de seis meses. Que balanço faz deste primeiro meio ano em funções?

Rodrigo Brum - Encontrei uma agenda intensa e muito preenchida o que permitiu um rápido reconhecimento dos principais parceiros e das habituais atividades desenvolvidas pelo Fórum de Macau (FM), bem como evidenciou algumas das dificuldades existentes. Realizaram-se diversas deslocações, três a Pequim (a primeira para uma reunião extraordinária em que se discutiu e definiu com as delegações dos diversos Países de Língua Portuguesa o estudo que está agora a ter início por parte de uma entidade externa contratada para o efeito, e que vai cobrir todos os países, com vista a um balanço de opiniões que permitam perspetivar o futuro do FM, a várias outras cidades e províncias chinesas (no âmbito das habituais ações de divulgação dos PLP e dos mecanismos do FM). 

- Qual foi o principal foco das suas funções? 

R.B. - No primeiro trimestre empenhei-me em desenvolver os primeiros contactos e fazer um levantamento dos objetivos do FM e do grau de execução. Iniciei também o diálogo, que pretendo venha a ser muito estreito, com os chefes das missões diplomáticas que têm assento no FM, os Embaixadores dos oito PLP. Procurei trabalhar em conjunto e concertadamente com todos os delegados junto do FM, com quem estabeleci reuniões regulares de trabalho.

Apesar da densidade da agenda e das interrupções devido às deslocações que se traduzem numa presença efetiva em Macau de pouco mais de três meses, creio que é possível considerar que este início de atividade me permitiu um forte entrosamento com a equipa do FM, quer com os colegas do Secretariado Permanente, bem como todos os delegados, quer com os elementos de apoio afetos ao Gabinete de Apoio ao Secretariado Permanente do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (GASPFM).

Isto permite-me perspetivar com otimismo o planeamento que irá estar em discussão para aprovação na 13ª reunião ordinária que se realizará no próximo dia 22. Esta reunião, em cuja preparação já estive plenamente envolvido, concretizará as ações que foram planeadas para o período de um ano que estamos a iniciar.

- Como secretário-geral adjunto em representação dos PLP, quais são as suas prioridades para este mandato de três anos?

R.B. - Disse desde o início aos delegados dos PLP e aos chefes de missão dos PLP que entendia que só cumpriria plenamente o meu mandato se contar com o apoio continuado dos países e conseguíssemos, em conjunto, encontrar uma forma de trabalhar concertada e com objetivos claros e bem identificados. Claro que o consenso não é um dado adquirido e, portanto, estamos ainda num processo de construção de alternativas para o que devemos contar com o resultado dos trabalhos da avaliação externa. Assim, digamos que o primeiro ano deveria permitir que o levantamento dos objetivos e a sua priorização deveriam resultar em dois ou três objetivos principais e outros tantos de caráter, eventualmente mais secundários. Para já um objetivo é consensual: contribuir para a participação efetiva de todos os oito PLP, e promover a sua atuação concertada. Também a consolidação do FM como entidade multilateral, envolvendo a China e os PLP, passa pela assunção de projetos multilaterais, que representem o interesse dos vários países e contem com o empenhamento de todos. Haverá que privilegiar os interesses conjuntos, sem prejuízo das vantagens que possam beneficiar interesses bilaterais. Mas não deverão ser estes o determinante das relações, nomeadamente as económicas e comerciais que são o objetivo principal do FM.

- Continuam a existir algumas vozes críticas face aos resultados do Fórum. O que poderá ser feito para elevar o papel do Fórum?

R.B. - Sou dos que considero ser uma felicidade haver vozes críticas que ajudam a por em perspetiva o caminho a seguir. Fui confrontado com generalizadas críticas de todas as partes, relativamente aos resultados ou falta deles. Algumas críticas não têm realmente origem em fracos resultados, mas sim de uma manifesta falta de capacidade de comunicar o que se tem feito e o que é o FM e quais são os seus objetivos. A confusão generalizada entre o trabalho do FM e o chamado Fundo para a Cooperação e Desenvolvimento é só um dos vários exemplos. Nesta matéria há um importante caminho a percorrer.

Mas também fui confrontado com fundamentadas razões de crítica, nomeadamente, por parte dos PLP e dos delegados junto do FM. Estamos a trabalhar em conjunto – iniciámos reuniões regulares semanais – e vamos certamente conseguir ultrapassar os problemas encontrados. Será um trabalho difícil e não necessariamente rápido. Senão já teriam sido resolvidos no passado. Mas uma correta identificação dos problemas facilitará, certamente o encontrar de soluções e novos caminhos a percorrer.

- Nem todos os países lusófonos têm representação permanente e especifica no Fórum. Acredita que a situação poderá mudar?

R.B. - Estou já convencido que vai mudar. Alguma da informação de que disponho, na sequência dos contactos mantidos, permitem estar confiantemente otimista. O que está verdadeiramente em causa é a compreensão das vantagens que uma plataforma de interesses comuns dos PLP em matéria de cooperação económica e comercial pode ter. Estes oito PLP estão reunidos em diversos organismos multilaterais, mas nenhum outro tem como razão de ser estes objetivos centrados no desenvolvimento das suas economias, na atividade de negócios das suas empresas, enfim, investimentos e aumento das trocas comerciais entre si. E, para mais, este fórum está precisamente situado em plena economia do século XXI, a China, que para além da iniciativa mantém presença ativa no Fórum e nas suas atividades.

- Ao longo dos anos tem havido a perceção de que o Brasil secundariza o papel do Fórum e o seu empenho em utilizar Macau como plataforma. Subscreve esta ideia? O que espera do Brasil?

R.B. - Costumo dizer que devo ser equidistante de todos os oito países de língua portuguesa que me elegeram por unanimidade e não quero elaborar sobre casos particulares. Mas estou confiante no apoio do Brasil aos futuros trabalhos do Fórum. O Brasil é o maior dos PLP com uma população de cerca de 230 milhões, significativas riquezas minerais e importantes produtos agrícolas. É já um importante parceiro da China. Mas a plataforma que o FM proporciona não deverá ser desprezada, quer para um enorme conjunto de Pequenas e Médias Empresas (PME’s) brasileiras que poderão beneficiar das vantagens da aproximação por Macau, nomeadamente à cada vez mais estruturada Zona da Grande Baía de Guangdong-Hong Kong-Macau, quer até ao desenvolvimento de negócios com os restantes parceiros do Fórum.

- Precisamente, o Governo Central tem vindo a sublinhar que Macau deve posicionar-se como plataforma entre os PLP e a zona da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau. Como é que isto se tem refletido na ação do Fórum no sentido de reforçar os laços com as nove cidades do Delta do Rio das Pérolas?

R.B. - Irá certamente conduzir a ações de reforço das ligações às cidades do Delta. O programa anual é  discutido na reunião ordinária que terá lugar ainda em março e tem, naturalmente em conta quer as necessidades de divulgação dos PLP junto das entidades e empresas chinesas nas diversas cidades e províncias, mas também a divulgação do FM e dos seus mecanismos junto dos diversos PLP. Assim, uma das importantes alterações propostas é que os oito PLP sejam beneficiários de ações do FM. Contamos que já a partir deste ano haja missões do FM a todos os oito PLP, evitando que se mantenha a situação atual em que se verifica haver  países que não são visitados há quatro e mesmo cinco anos. Pretende-se, assim, reforçar a ligação com todos e cada um dos países, melhorando o conhecimento nesses mesmos países dos mecanismos do FM e das  oportunidades existentes no mercado chinês.

- A sede do Fundo China-PLP foi transferida de Pequim para Macau, contudo  várias vozes salientam que ainda não há resultados palpáveis. Deveria o processo de decisão ter lugar em Macau para tornar o mecanismo mais eficiente como é defendido por alguns atores importantes?

R.B. - Defendi muito antes de integrar o Fórum a mudança do Fundo para Macau, pelo que não posso deixar de estar satisfeito que tal tenha acontecido. Mas a questão importante é outra. Estranhamente deparei-me com o completo desconhecimento por parte dos empresários e dos países das características do fundo e dos seus mecanismos de funcionamento. Mais uma vez a falta de informação e de divulgação se fez sentir. Ora o que se passa é que o Fundo, dito para a Cooperação e Desenvolvimento, é efetivamente um instrumento de capital de risco – venture capital puro e duro – com as características internacionalmente reconhecidas para tal: entrada no capital das empresas, com uma participação minoritária, com previsão de saída a prazo de cinco, seis ou sete anos, com retorno do capital investido e uma taxa de rentabilidade pré-estabelecida. Ou seja, é um rico instrumento de financiamento para empresas com grande dinamismo e previsão de lucros elevados e num curto espaço de tempo. Mesmo que haja lugar a um melhoramento do seu funcionamento, deverá ser utilizado como tal por projetos dinâmicos, que os haverá alguns em alguns dos países com economias mais fortes.

Mas os PLP estão muito interessados em financiamentos infraestruturantes e de desenvolvimento. E para isso é necessário pensar um instrumento alternativo. Se este elemento base for entendido será, certamente mais fácil avançarmos. Ao capital de risco o que são projetos apropriados para capital de risco, e aos projetos infraestruturantes fundos de apoio ao desenvolvimento, naturalmente também, entre outras características, com prazos mais alargados. 

- O Fórum celebra 15 anos de existência este ano. Que atividades e iniciativas estão a ser preparadas?

R.B. - A primeira terá lugar já este mês, a 21 em Macau, e será um seminário que contará com a presença de individualidades que participaram em anteriores conferências ministeriais do FM bem como antigos secretários-gerais e secretários-gerais adjuntos e visa aprofundar e discutir a evolução futura do Fórum e o papel da plataforma de Macau na relação entre a China e os PLP. De muita relevância foi a seleção de uma entidade externa para a elaboração de um trabalho de grande envergadura que irá fazer o balanço dos 15 anos de FM e nos irá ajudar a determinar os caminhos futuros a desenvolver. Estamos a trabalhar noutras iniciativas que evidenciem ao longo do ano a construção conseguida ao longo destes anos ao mesmo tempo que se pretende evidenciar e esclarecer junto de todos o papel que o FM tem vindo e pode ainda desempenhar. 

José Carlos Matias  16.03.2018 | em Plataforma (Macau)

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