Manuel Carvalho da Silva | Jornal
de Notícias | opinião
O tema central e absolutamente
prioritário na agenda política nacional é, no meu entender, a definição de
medidas concretas que permitam travar a emigração, que mobilizem para o retorno
milhares de jovens que saíram do país nos últimos anos, que integrem o melhor
possível os migrantes que estão a chegar a Portugal, inclusive de ascendência
portuguesa. Sem estas respostas não é possível definir e assegurar um rumo
estratégico de desenvolvimento da sociedade portuguesa e de modernização do
país.
De acordo com a previsão do
Relatório sobre Envelhecimento 2018, publicado pela Comissão Europeia (CE), em
2070 a população portuguesa será de 8 milhões de pessoas, isto é, menos 2,3
milhões do que em 2016. Em 2008, o mesmo relatório previa que a população iria
aumentar para chegar aos 11,4 milhões em 2050. Entretanto, há entidades
nacionais que trabalham propostas em várias áreas de políticas com cenários
demográficos que preveem quebras da população ativa entre 20% a 30% para o
mesmo período.
O que aconteceu entre um e outro
relatório da CE que justifique uma tão radical alteração das previsões?
Aconteceu, fundamentalmente, um "ajustamento" da troika e a
imposição, pelo Governo PSD/CDS, de políticas desastrosas que aumentaram o
desemprego para níveis sem precedentes. Foi interrompida e revertida a
imigração que se registava em períodos anteriores e foram empurrados para o
estrangeiro, à procura de trabalho, centenas de milhares de portugueses, a
maioria jovens. Num espaço de tempo muito curto, o país viu-se privado de uma
parte substancial da população em idade ativa e fértil.
O que as previsões refletem é,
pois, a consequência projetada a longo prazo dessa sangria demográfica.
Esperemos que aquelas projeções estejam erradas, como muitas vezes tem
acontecido com previsões demográficas e que sejamos capazes de trabalhar
soluções novas. Não podemos dar por inevitáveis estes cenários catastróficos. O
país sem pessoas e ao abandono arde, seca, não tem trabalhadores para as
atividades que o podem desenvolver. Temos mesmo de dar a volta ao fado daquelas
projeções demográficas.
Para isso, é preciso, em primeiro
lugar, criar emprego. Há hoje mais 350 mil postos de trabalho do que em 2013,
quando se atingiu o nível mais baixo, mas ainda estamos com cerca de 350 mil a
menos do que tínhamos em 2002. E o desemprego jovem é ainda elevadíssimo (22%).
Contudo, não basta criar emprego: é indispensável que ele tenha qualidade. O
salário e as condições de trabalho contam muito para esse objetivo. Para a
maior parte dos jovens, sobretudo para os mais qualificados, as fronteiras do
mercado de trabalho têm cada vez mais uma escala europeia e até mundial e falta
fazer-lhes um apelo forte para que não desistam do seu país. Não é com salário
mínimo, ou valores perto dele, não é com contratos precários que se evita a
emigração de jovens qualificados e se incentiva o retorno dos que saíram. As
empresas que se queixam de falta de mão de obra qualificada sabem que é assim,
mas têm sido lentas a melhorar a oferta.
Há outras políticas que também
contam e muito. Habitação a custo compatível com os rendimentos e onde seja
possível viver bem e ter os filhos desejados. Acesso dos filhos ao Pré-Escolar.
Bons transportes. Cuidados de saúde acessíveis a todos. Pensões dignas.
A atração da população jovem com
medidas de apoio ao retorno deve envolver também uma política de imigração que
combata a ilegalidade, a clandestinidade e a exploração dos sem-papéis. Há que
garantir os direitos laborais dos imigrantes em pé de igualdade com os de todos
os trabalhadores e combater a discriminação.
No atual contexto de globalização
e concorrência que tanto se invoca, um país como o nosso, que tem capacidade de
formação e qualificação da sua juventude, jamais será competitivo comprimindo
mais e mais os chamados custos salariais e os direitos laborais e sociais. Por
essa via corre o risco de se despovoar, de definhar. O sol e o mar continuarão
cá, mas para serem rentabilizados precisam de pessoas para trabalhar. E o
desenvolvimento implica mais inovação, mais industrialização, mais diversificação
da economia.
*Investigador e professor
universitário
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