Jorge Rocha | opinião
Há muito que passo ao lado de
qualquer peditório para a instituição da «tia» Jonet e ajo da mesma forma para
qualquer iniciativa com propósitos assistencialistas. Recuso-me a colaborar com
quem brinca à caridadezinha, mas defendo ativamente políticas sociais, que
combatam a pobreza, cabendo ao Estado o papel de melhor distribuir a riqueza,
limitando a distribuição demasiado injusta dos rendimentos.
Mas a pobreza não está, enquanto
fenómeno sociológico, dissociado da sua raiz política. Por isso concordo no
essencial com o artigo de Jorge Cordeiro no «Diário de Notícias» em que esse
membro do Comité Central do PCP defende que “continuar a falar de pobreza
à margem da exploração, ou seja, da apropriação da mais-valia produzida pelo
trabalhador, é um exercício de cegueira política que só servirá aos que
reproduzindo o empobrecimento vão subindo uns lugares na lista dos mais ricos da
revista Forbes”.
Começando por invocar um estudo
agora publicado sob a égide do Parlamento Britânico em que se conclui que em
2030, 1% da população terá nas mãos 2/3 da riqueza mundial, ele defende que não
basta olhar para a pobreza como corolário dos baixos salários, das pensões
de reforma que não dão para viver ou do desemprego. Nem apenas para
a desigual distribuição de rendimento, a injustiça fiscal ou as opções de
política macroeconómica. A razão primeira para a existência de a grande maioria
de pobres e a minguada quantidade de ricos explica-se no que se sabe desde que
Marx o teorizou: no domínio da propriedade, nas relações de produção e da
exploração do trabalho.
E, se o filósofo alemão causa
muita azia a piedosas criaturas, que batem com a mão no peito e afiançam os
encantos da social-democracia ou da democracia-cristã (os neoliberais são mais
canhestros a defenderem os seus amanhãs cantantes), o artigo em causa cita
Rousseau ("O primeiro que, tendo cercado um terreno, se atreveu
a dizer isto é meu!, e encontrou gente suficientemente simples para acreditar
nele, foi o verdadeiro fundador da sociedade civil") ou Almeida
Garrett ("Aos economistas políticos, aos moralistas pergunto se já
calcularam o número de indivíduos que é preciso condenar à miséria (...) para
produzir um rico") para demonstrar o quão isso é evidente desde o
século XVIII.
Conclui Jorge Cordeiro que “por
mais que o recusem, a questão [da pobreza] está na crescente
desigualdade da repartição da riqueza criada entre capital e trabalho.”
*jorge rocha | Ventos Semeados
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