sábado, 28 de abril de 2018

"O povo quer melhorias concretas em Angola", diz economista


A perspetiva económica em Angola melhorou devido à subida do preço do petróleo e o apoio do FMI, segundo a agência Fitch. Mas o povo ainda espera mudanças no país, diz um economista ouvido pela DW África.

A perspetiva económica de Angola passou de "negativa" para "estável". Quem diz isso é a agência de notação financeira Fitch, que, entretanto, manteve o rating da dívida angolana no nível "B", abaixo da escala de investimento. Entre os motivos para a nova perspetiva do país, apontou a Fitch, está o aumento do preço do petróleo no mercado internacional.

Para o economista angolano Yuri Quixina, professor de Macroeconomia do Instituto Superior Politécnico de Angola,  a perspetiva "estável" de Angola poderá atrair mais investimentos externos. Mas isto dependerá, também, de outros fatores, como a sustentabilidade da dívida pública e a transparência das contas do Estado, afirmou o economista.

Em entrevista à DW África, Quixina também falou do Plano de Reforma Estrutaral implementado pelo Governo, que terá o apoio do Fundo Monetário Internacional (FMI), e ressaltou que o povo angolano está à espera de melhorias concretas no país.
DW África: O que significa, de facto, essa mudança na perspetiva económica de Angola?

Yuri Quixina (YQ): Esta notação de perspetiva "estável", no meu entender, deriva mais da recuperação do barril de petróleo no mercado internacional. Se os preços continuarem a subir nessa trajetória de aumento, significa que futuramente as receitas do Estado podem aumentar e, naturalmente, Angola poderá honrar com os seus compromissos a nível internacional e pagar o endividamento externo através de divisas. Em segundo lugar, outro elemento que eu acho que a Fitch levou muito em consideração é a tentativa de implementação do Plano de Reforma Estrutural, que seguramente as autoridades estão a implementar. A equipa económica apresentou algumas derrapagens do ponto de vista da aplicação e só foram concluídas 37 das 144 medidas. E, com certeza, o Presidente da República achou melhor recorrer ao FMI para redesenhar o Plano de Reforma Estrutural. Entretanto, o facto de o FMI vir para Angola, isso também desperta segurança dos investidores a nível internacional. Portanto, esses três elementos são fundamentais para a que Fitch atribuísse uma perspetiva "estável".

DW África: Essa nova avaliação da economia seria um reflexo das políticas económicas que vem sendo aplicadas pelo Governo de João Lourenço. O cidadão comum já sente no dia a dia os resultados dessas novas políticas?

YQ: Seguramente os cidadãos sentem essas expetativas, se bem que, efetivamente, o povo quer mais, quer na prática, do ponto de vista do "pão na mesa". O primeiro trimestre já foi. Os indicadores, provavelmente, vão mostrar uma estagnação, a inflação ainda é considerável, o desemprego também é considerável, a pobreza continua extrema, a saúde... Já nem podemos mais falar sobre a saúde. Mas ainda é muito cedo. É uma economia que está muito bagunçada, mas a expetativa é alta.

DW África: Uma das justificativas para evolução do rating de Angola é a subida do preço do petróleo no mercado internacional, já que a matéria-prima ainda é responsáveis por mais de 90% das exportações angolanas. Mas essa dependência não será, na verdade, um risco?

YQ: Com certeza foi e continua a ser um risco. O petróleo fez ruir muito as equipas económicas que passaram na governação de Angola. Eu tenho dito que quem faz um país não é o Presidente da República, mas toda uma equipa. E as equipas criaram uma matriz económica virada para o consumo. Importávamos muitos produtos no mercado internacional, e quem importa muito, naturalmente, depois vai sofrer um revés quando não aumenta a base de exportação.

DW África: A elevada carga da dívida angolana é um dos fatores citados pela agência, que manteve o país na categoria de "lixo”, embora tenha passado para uma perspetiva "estável".  Como avalia a sustentabilidade da dívida de Angola?

YQ: A dívida angolana continua a aumentar, então vai gerar o aumento do imposto amanhã. E o imposto é também custo de produção, isso não atrai investimento estrangeiro, que procura um país cujo o pacto fiscal é mínimo. Então a dívida pública, no meu entender, é muito preocupante e pode contrair a atividade económica de Angola.

DW África: A oposição angolana já cobrou no Parlamento a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para analisar a dívida pública, mas sem sucesso. Acha que o Governo tem interesse em tornar as contas mais transparentes?

YQ: Se efetivamente queremos mudar de modelo económico, portanto, "abrir o livro", "abrir as portas", pode influenciar [positivamente] nos investimentos estrangeiros em Angola. Eu acho que este Presidente tem vontade em fazer com que Angola seja mais transparente.

Thiago Melo | Deutsche Welle

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