Mariana Mortágua* | Jornal de Notícias
| opinião
No Bloco de Esquerda nunca vimos
o acordo com o PS ou a maioria parlamentar como um embaraço ou uma
contrariedade. O programa de Governo do PS, tal como a sua atuação, estão muito
longe do que achamos necessário para construir um futuro melhor para o país.
Mas, em 2015, fomos confrontados com dois desafios, que aceitamos: i) começar a
responder às urgências sociais deixadas pela Direita, e ii) usar a relação de
forças existente para negociar avanços em áreas essenciais: combate à
precariedade, justiça fiscal, liberdades individuais, serviços públicos, etc.
Durante estes três anos, e em
três orçamentos, fomos uma força empenhada em cumprir ambos os desafios.
Propusemos e formamos grupos de trabalho com o PS; negociamos medidas ao
cêntimo, às vezes durante meses. Sempre que possível, como na precariedade ou
na reforma do IRS, fizemos compromissos, por vezes longe do nosso ponto de
partida. Noutras matérias, como na venda de bancos ou no acordo com os patrões
para a redução da TSU, não acompanhámos o Governo, nem o nosso compromisso
eleitoral o permitiria. Somos críticos e exigentes, mas agimos sempre com
lealdade e competência porque levamos muito a sério as expectativas criadas no
país.
Nos últimos tempos, depois da
ascensão de Rui Rio no PSD, a atuação do PS face à maioria parlamentar
alterou-se. Nas carreiras, o Governo fez tábua rasa do compromisso orçamental
sobre o tempo de serviços dos professores; na lei laboral, acordou em segredo
com os patrões medidas contrárias ao acordo com o Bloco; na saúde, colocou
Maria de Belém no caminho da elaboração conjunta de uma lei de bases proposta
por Arnaut e Semedo; no ISP ignorou o compromisso de neutralidade fiscal.
Agora, membros de topo do Governo
desdobram-se em declarações, dizendo-se vítimas de ultimato por parte do Bloco.
Não houve nem há ultimato. O que há é a exigência de ver cumpridos os
compromissos assumidos pelo Governo, para que o último orçamento seja negociado
como os anteriores - atempadamente, de forma séria e consistente. Não nos
interessam os simulacros. Estamos cá para negociar, resolver problemas e
terminar a legislatura. E tudo será mais fácil se o PS controlar o seu
nervosismo pré-eleitoral e regressar ao espaço da maioria parlamentar que
sustentou até agora o Governo. Com vontade de diálogo e de soluções que
reforcem - e não que enfraqueçam, como no trabalho ou nos professores - o
sentido dessa maioria.
*Deputada do Bloco de Esquerda
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