Copa do Mundo na Rússia
recompensou o futebol de seleções defensivas e que dominam o contra-ataque e
lances de bola parada. Certamente nada atraente para o torcedor, mas ainda há
esperanças para artistas da bola.
Na falta do que aplaudir,
ultimamente os torcedores de futebol podem usar as mãos para se dedicar
plenamente ao consumo de batatas chips, pipoca e outras guloseimas. O chamado
jogo bonito está praticamente morto. Na Copa do Mundo na Rússia, foi preciso um
olhar microscópico para encontrar lances brilhantes, que enaltecem a qualidade
técnica de um jogador.
O passe açucarado de calcanhar do
francês Kylian Mbappé na semifinal contra a Bélgica, por exemplo, foi uma das
exceções. Não é de se admirar que o lance tenha sido celebrado e compartilhado
maciçamente nas redes sociais, embora não tenha resultado em gol.
Outros craques, que poderiam ter
criado momentos especiais diante do gol – como os astros eleitos cinco vezes
como melhores jogadores do mundo Lionel Messi, da Argentina, e Cristiano
Ronaldo, de Portugal, ou o postulante ao trono Neymar – despediram-se da Copa
com suas seleções antes do esperado. Algo quase sintomático, pois no torneio
dominaram as defesas, e não as forças ofensivas.
Pouco espaço para criatividade
"Foi possível observar que
as equipes, incluindo aquelas consideradas menores, foram treinadas para ficar
na defensiva e fechar os espaços para as equipes adversárias",
aponta o professor Daniel Memmert, diretor do Instituto de Ciência do
Treinamento e Informática no Esporte da renomada Universidade Alemã de
Esportes, em Colônia. "Exceto por talvez um ou dois jogos da Copa do
Mundo, o lema era: não sofrer gol."
Como resultado, a Copa do Mundo
proporcionou vários jogos que apenas amantes de tática do futebol puderam
apreciar e que não corresponderam às altas expectativas em relação ao nível
técnico. Até mesmo as duas semifinais não foram exceção.
"Na maioria das vezes faltou
criatividade para furar as barreiras defensivas. Se continuamente são usadas as
mesmas armas, estas se tornam inofensivas rapidamente",
analisa Memmert. "Prova disso é que muitos gols nesta Copa do Mundo
foram marcados em jogadas ensaiadas, e não de bola rolando."
O fim do tiki-taka
Cerca de 40% de todos os gols da
Copa do Mundo de 2018 resultaram de bolas paradas, ou seja, de cobranças de
falta, escanteios, laterais ou pênaltis. No Mundial sediado pelo Brasil, em
2014, foram apenas 26%. A quarta colocada, Inglaterra, por exemplo, marcou nove
de seus 12 gols dessa forma.
Também foram bem-sucedidas as
seleções que construíram ataques rápidos a partir de uma defesa sólida, com o
bom e velho contra-ataque – atualmente chamado de transição – como receita de
sucesso.
O tiki-taka, o jogo de passes
curtos que os espanhóis aperfeiçoaram e que fora celebrado como deslumbrante
por anos, está fora de uso. As três seleções com as maiores médias de posse de
bola foram cedo para casa: Alemanha, na fase de grupos, e Espanha e Argentina,
nas oitavas de final.
A Copa do Mundo na Rússia mostrou
claramente que quem quiser ser bem-sucedido precisa, em primeiro
lugar, ser sólido defensivamente. No entanto, muitas equipes dominam isso,
e para se destacar da concorrência, é preciso mais.
"Mudanças no ritmo de jogo
estão se tornando cada vez mais importantes", afirma Memmert. "As
equipes têm que treinar como jogar de forma variável e integrar muitas ideias
em seu jogo, a fim de serem mais imprevisíveis para seus oponentes. Há muita
coisa para se fazer em termos de criatividade."
Assim, artistas da bola com
habilidades técnicas notáveis provavelmente poderão ser mais decisivos num jogo
– e fazer com que os torcedores comuns deixem as batatas chips de lado para
voltar a aplaudir o jogo bonito.
Stefan Nestler (pv) | Deutsche
Welle
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