
“Há sempre alguém que nos diz,
tem cuidado”. Pois. Assim mesmo, o dito é cantado e faz parte da imensa
panóplia de qualidade dos Trovante, “
Saudade” é o título. Cuidado, pois claro.
Muito cuidado com as jigajogas do futebol de elite – que não é bom exemplo para
ninguém. E o FC Porto… Oh, o Porto. Oh, o Papa da Costa. Oh, e os tais Três
Grandes… Oh, e agora o Estoril, pequenino e atrevido. Oh, e outros. É uma soda
estragada estas coisas do futebol dos milhares de milhões e de elite que
encerra vigarices e golpadas, ditos e mexericos, imoralidades e nojeiras. Terreno
próprio da antidemocracia e albergue de luxo de ditadores que brincam e
engordam financeiramente à custa dos papalvos ingénuos que dão milhões para
verem uns quantos aos pontapés a uma bola que só falta possuir um dispositivo
teleguiado para entrar na baliza ou não, conforme os acordos e as verbas da
compra disto e daquilo… Talvez a isso cheguem, no cumulo da falta de verdade do
tal futebol précozinhado e de elite. Pois por isso há sempre alguém avisado que
nos diz: “tem cuidado”.
O tema nem é caricato. Admira que
tenha vindo a público. Então não é que se entende que o FC Porto comprou o
Estoril para ter um resultado satisfatório, pelo lido. Verdade que os jogadores
do Estoril naquela segunda parte do jogo só pareciam que ali estavam pela
bodega que faziam, não sendo nem sombra de jogadores experimentados. Pois. Ora,
aconteceu, às vezes é assim… Pois.
O Estoril comprado? Que não,
dizem os mais que tudo naqueles clubes. Claro. Não. Pois não. Ora, pode lá ser.
Afinal o FCP só pagou a dívida que tinha para com o Estoril. Que bem. E todos
os que ouvem, vêem os alegados responsáveis declarar isso mesmo, lêem,
acreditam. O quê? São todos gente de bem, muito honestos. Muito do futebol
transparente. Os mal intencionados é que duvidam destas coisas tão honestas de
pagar as dívidas de mais de 700 milhares de euros. Pois. E sujam bons nomes de
dirigentes desportivos em conformidade com as suas clubites. Está mal. Errado.
Deixemos o caso para a justiça no
Ministério Público. E depois… Arquivado ou até improcedente. Isso ou qualquer
outro palavrão dos nossos sábios das leis e ilhargas das mesmas. Ou talvez não.
Para ficarem mais sabedores das
tricas e laricas, recomendamos, por exemplo, que leiam a “novela” aqui, no
Diário de Notícias. Mas leiam também o Curto do Valdemar que vem a seguir, do Expresso do tio Balsenão... Perdão, Balsemão.
Caríssimos. Este é o balanço para
o Expresso Curto que às vezes incluímos no PG. Bom dia e boa sexta-feira. Bom fim-de-semana.
Boa saúde. Boa digestão dos sapos que engolirem. E nem por sombras pensem que o
futebol de elite é um logro… Pois. Que coisa! Inté. (MM | PG)
Bom dia este é o seu Expresso
Curto
A parábola do elefante e os
massacres na Síria
Valdemar Cruz | Expresso
Um dia, um príncipe indiano
chamou ao seu palácio seis cegos de nascença. Reuniu-os num pátio e de
seguida mandou trazer um elefante, animal cuja existência ignoravam. De
seguida convidou-os a apalpá-lo. Cada um ateve-se a uma parte do corpo do
paquiderme. Quando tiveram de descrever como era o elefante, as opiniões
dividiram-se conforme a parte que cada um tocara. A discussão assumiu
proporções inesperadas, ao ponto de uns começarem a acusar os outros de desonestidade.
O príncipe interrompeu a algazarra criada para lhes dizer que nada do que
cada um deles dizia era mentira. Porém, constituía apenas uma parte da verdade.
Sugeriu-lhes a humildade de experimentarem juntar a experiência por cada um
deles vivida para, então sim, conseguirem imaginar como a junção daspartes
poderia formar o todo que é o elefante.
Não deverá haver, na história recente, conflito ao qual com tanta e
dolorosa veemência se possa aplicar a parábola dos cegos e do elefante como
a tragédia vivida na Síria desde há vários anos. Todos os dias, a todas as
horas, são disparadas bombas letais, responsáveis por incontáveis mortes de
homens, de mulheres, de crianças.
Quando o sofrimento é tanto, quando a dor é tão indescritível, quando a
indiferença é tão cruel, quando a morte é o banal respirar de um quotidiano
rasgado por veredas afogadas em
tanto
sangue, tanta raiva, mais absurda se torna ainda a outra guerra, a decorrer
em simultâneo. Não no longe de uma Síria devastada. Mas frente ao nosso olhar.
Muito perto. À distância de um ecrã de televisão, de uma primeira página de
jornal. É uma guerra mediática sem espaço para a memória, sem inocência, sem
tempo para a reflexão, sem lugar para perceber como na Síria decorre “
uma
guerra com muitas guerras dentro”.
O filósofo britânico, economista e defensor do liberalismo político
Jon Stuart Mill
(1806-1873), dizia que aquele que só conhece o seu lado do problema, na
verdade não conhece nada. E a Síria é um problema com muitos lados. Demasiados
lados.
Daí a relevância desta edição do Expresso Diário. Ficará como documento. Como
registo de uma memória. Essa mesma memória que nos faz recordar a fala da
mulher em “
Hiroshima
Meu Amor”, quando diz: “Como tu, também eu tentei lutar com todas as
minhas forças contra o esquecimento. Como tu, esqueci. Como tu, desejei ter uma
memória inconsolável, uma memória de sombras de pedra”.
O esquecimento é tão poderoso como a morte. Por isso é crucial não esquecer. Já
que, como se diz no Diário, a Síria é o tabuleiro e os sírios os peões de uma
guerra de xadrez que, um dia, será lembrada como o grande conflito mundial
deste milénio. Entre motivações estratégicas, financeiras, políticas e
religiosas há todo um mapa de interesses que, direta ou indiretamente,
contribuíram para a morte de centenas de milhares de pessoas nos últimos sete
anos.
OUTRAS NOTÍCIAS (DE OUTRAS GUERRAS)
A guerra é a guerra. Mesmo quando julgamos viver um simulacro de paz, há sempre
alguém a pensar na pretérita, na presente e nas futuras guerras. Porque a
guerra não para. Nunca parou. Agora foi a vez de falar Vladimir Putin. No
seu discurso sobre o estado da Nação, o último antes das eleições, anunciou que
a Rússia possui novas e
invencíveis
armas nucleares. Garantiu ter sido testado um míssil nuclear capaz de
atingir qualquer ponto do mundo. Putin Assegurou que o novo projétil não pode
ser detetado pelos sistemas antimíssil. A guerra é a guerra. Aguardemos a
resposta. Chegará do outro lado do Atlântico. Para já, uma amostra.
Os
EUA acusam Putin de violar os tratados sobre armas de 1987. A guerra segue
dentro de momentos.
A guerra encarna muitas variantes. A económica não é das mais brandas. A União
Europeia já anunciou uma “resposta firme” às taxas de importação
prometidas por Washington sobre o aço (25%) e o alumínio (10%) que
entrem nos EUA. Jean-Claude Juncker afirmou que
a
União não ficará sentada a ver os efeitos de uma medida que, diz,
coloca “em risco milhares de postos de trabalho na Europa".
Na guerra pela independência catalã, Carles Puigdemontdá um passo ao lado,
e renuncia à investidura como presidente da Generalitat para
permitir
a candidatura de Jordi Sánchez, número dois da sua lista (Junts per
Catalunya) e atualmente em prisão preventiva.
A guerra pela igualdade humana é feita de avanços e recuos. (Veja em baixo O
que ando a ler). O Guardian publica um artigo de fundo intitulado “
O
indesejável regresso da ‘ciência da raça’”. É, de alguma forma,
a mancha
humana de que também falava Philip Roth. O texto explora a defesa que tem
vindo a ser feita por alguns antropólogos, psicólogos, ou investigadores,
segundo os quais algumas raças são, por inerência, mais inteligentes que
outras. Os autores da tese intitulam-se a eles próprios “nobres dissidentes”.
POR CÁ
Mais de 73% dos trabalhadores da Autoeuropa aprovaram em referendo o novo
acordo laboral, que prevê aumentos salariais de 3,2%, com um mínimo de 25
euros.
O
pré-acordo abrange várias questões que faziam parte do caderno reivindicativo da
Comissão de Trabalhadores, mas nada adianta em relação aos novos horários de
trabalho que entram em vigor a partir de agosto, quando a fábrica passar a um
regime de laboração contínua.
A EDP continua a dar lucro. Mas é um lucro que já não reverte a favor dos
cofres do Estado português. Isto é, de todos nós. Fechou 2017 com um
lucro
de 1113 milhões de euros, mais 16% do que em 2016, naquele que foi o
melhor resultado dos últimos seis anos.
É a principal notícia do JN. Milhares de trabalhadores portugueses foram
burlados
com a promessa de empregos falsos no Qatar. Há um réu a ser julgado no
Tribunal de S. João Novo, no Porto. A pretexto do Mundial de Futebol de 2022 no
Qatar, prometia ordenados entre quatro e seis mil euros. Pelo caminho
exigia uma joia de inscrição aos candidatos. O burlão, que usava
identidades falsas, tem 15 processos em todo o país.
Já conhece a
Biblioteca de
Literacia em Saúde? O objetivo é promover o acesso à informação sobre
saúde, de modo a podermos ser mais autónomos em relação à nossa saúde e
à dos que nos rodeiam. Permite pesquisa por vários temas e abre logo com uma
seleção de seis grandes grupos de interesse: nascer com saúde; crescer em segurança;
juventude à procura de um futuro saudável; vida adulta produtiva;
envelhecimento ativo e fim de vida.
Se gostava de possuir uma aldeia, tem aqui a sua oportunidade. Foi posta
à venda uma aldeia na zona de Arouca, que tem o Geopark
como Património Geológico da Humanidade, a Serra da Freita ou a muito visitada
Frecha da Mizarela. O património em venda é constituído por 11 casas típicas,
algumas destinadas a reconstrução. Porventura o único óbice para o comum dos
leitores será o preço: 600 mil euros.
PRIMEIRAS PÁGINAS
Portugueses da Califórnia zangados vão ter Costa mas queriam Marcelo – DN
Desemprego real é o dobro do que mostram os números oficiais – Público
Altice acusa Vodafone de colocar pessoas e bens em risco – I
Milhares de trabalhadores burlados com empregos falsos no Qatar – JN
Putin declara-se na posse de um arsenal invencível - El País
Governo sem dinheiro para pagar a professores – Correio da Manhã
Hospitais privados e ADSE chegam a acordo parcial – Negócios
Quarto clássico entre Dragões e Leões aquece a corrida ao título – O Jogo
O clássico é redondo – A Bola
Fome de Título – Record
FRASES
"Não há nenhuma aproximação ao PS, a aproximação é a mesma que há ao CDS”. Rui
Rio, presidente do PSD, após almoço com Assunção Cristas
"Este grupo parlamentar foi insultado, maltratado e desrespeitado”. Paula
Teixeira da Cruz, deputada do PSD
“Todos nós fizemos uma catarse”. Fernando Negrão, líder da bancada do
PSD após ter pedido desculpa aos deputados por algum excesso de linguagem
“Vieira da Silva foi de longe o ministro com quem avançámos com políticas de
‘direita’”. Francisco van Zeller, ex-presidente da CIP em entrevista
ao Negócios
O QUE ANDO A LER
Não somos racistas. Não somos racistas? Ou será que gostamos de
acreditar que não carregamos a mancha, mesmo se a mancha anda por aí? A relação
dos portugueses com o racismo e a ideia muito generalizada de que não
alimentamos o gérmen racista é um dos maiores mitos urbanos com o qual
convivemos no dia-a-dia.
Duas leituras recentes ajudam a recentrar o problema. Na edição desta semana da
revista do El País há
um texto dedicado ao preconceito. Aquele preconceito
sub-reptício, do qual podemos nem ter consciência, mas que condiciona muitas
das nossas decisões. Ou seja, o preconceito que nos leva a excluir ou
marginalizar todos quantos não se enquadrem nos nossos esquemas mentais.
Como somos subjetivos, podemos socorrer-nos de mil e uma justificações, mas, na
verdade, escreve Pilar Jericó, “a maior parte das vezes movemo-nos por
critérios inconscientes”, que nos levam a tomar decisões sem fundamento. Como dar
por adquirido que os homens estão melhor qualificados que as mulheres para
cargos diretivos. Ou rejeitar alguém no acesso a um emprego devido à sua
orientação sexual”.
O preconceito leva-nos a excluir outras pessoas pelo simples facto de serem
diferentes. Como os ciganos. E isso leva-nos a dois bem mais longos textos.
Estão publicado na edição de janeiro do
Le Monde
Diplomatique, e confrontam-nos com dados arrepiantes. Daqueles capazes de
abalar consciências.
Conhece-se o contexto. Ao longo de séculos os ciganos têm vindo a ser
perseguidos. As acusações são, invariavelmente, sempre as mesmas. São
catalogados como ladrões e intrujões, desordeiros e preguiçosos. Ou então
traficantes e criminosos.
No artigo intitulado “Comunidades ciganas: consistências sociais ao longo dos
tempos”, Manuel Carlos Silva e Sílvia Gomes, sociólogos da Universidade do
Minho, responsáveis por um estudo sobre o tema em comunidades de Braga e
Guimarães, demonstram que a perseguição aos ciganos, materializada em práticas
de descriminação e racismo, é ancestral.
As comunidades ciganas vivem em pobreza relativa e, em alguns casos, em pobreza
absoluta, “pois estão sujeitas a numerosas formas de estigmatização,
marginalização e segregação socioespacial”.
Embora sejam conhecidos casos de envolvimento no tráfico de droga e haja uma
percentagem considerável de famílias a receber o Rendimento Social de Inserção,
os sociólogos concluem que “a disseminação generalizada de que as famílias
ciganas vivem exclusivamente desse rendimento e estão envolvidas no tráfico de
drogas é abusiva e estereotipada, uma vez que os dados mostram que a grande
maioria vive das suas atividades profissionais”.
Num outro trabalho, Piménio Ferreira, ativista cigano, mestre em Engenharia
Física e dirigente do SOS Racismo, defende que “o racismo institucional é
sistémico", e assegura que Portugal tem sido profícuo "em produzir leis
e decretos que perseguem explicitamente ciganos desde o século XV até ao século
XXI, inclusive. Com efeito, é possível encontrar leis ou regulamentos
anti-ciganos datados de 2015…”.
Numa nota ao texto, Piménio Ferreira especifica que o regulamento a que se
refere é a proibição de usufruto, a pessoas ciganas, das piscinas públicas
por parte da Câmara Municipal de Estremoz.
Portugal é muito mais complicado que as três sílabas que o verbalizam. Já o
dizia –
neste poema – Alexandre O’Neill.