sexta-feira, 2 de março de 2018

ANGOLA | Acabe-se de vez com o outra vez!


Víctor Silva | Jornal de Angola | opinião

No momento presente o que se pede a todos os agentes políticos são, sobretudo, práticas responsáveis, quer a quem decide, quer a quem se opõe a essas decisões!

A generalidade da população angolana tem estado arredada dos “milagres económicos” que de vez em quando emergem no País. Essa mesma população vive num contexto de pobreza aviltante, e no momento presente os dirigentes tentam soluções arrojadas para que o investimento regresse de forma a inverter um desemprego que já ultrapassa, e muito, os 30% da população activa, e tenta controlar uma inflação que começa a minar a economia periclitante e com falta de dinamismo e de futuro assombrado pela inação.

Uma das soluções apresentadas pelo Executivo foi a apresentação de um pacote legislativo que possibilitasse aos cidadãos angolanos que tivessem dinheiro no estrangeiro, que o repatriassem quase sem restrições para que assim se pudessem dinamizar políticas de recuperação económica e social indispensáveis para a tentativa de esbater as diferenças abissais que há na sociedade angolana.

Com o discurso demagógico, nalguns casos a raiar a irresponsabilidade, alguma oposição vem a terreiro e pede que a penalização seja de 45%. Na realidade a falta de sentido de Estado manifesta-se neste tipo de atitudes, que num contexto em que se faz um apelo a que alguns biliões de dólares saídos de Angola sejam repatriados vêm estes “arautos da legalidade” exigir um mundo e o outro. 

Esta fórmula proposta não é virgem num conjunto de países no mundo inteiro. Em Portugal, há poucos anos, foi aplicada uma taxa de 5% sobre o dinheiro que voltasse ao país, e foi executado numa situação excepcional, num curto período de tempo, para que possibilitasse uma injecção de capital na economia. A Irlanda, Grécia, Itália e até a Espanha, em alguns períodos, trabalharam legislação específica para o retorno seguro de capitais, para fazer face à débil situação económica com que se confrontaram.

A principal força da oposição, a UNITA, além daquele valor que não é devidamente fundamentado, propõe ainda que se investigue os detentores desse dinheiro, posição que parece irreal!

Os cidadãos que voluntariamente aceitarem este repatriamento têm que merecer o respeito de todos, porque o fazem de livre e espontânea vontade e dão um contributo decisivo ao desenvolvimento do Pais e uma aposta na recapitalização de empresas angolanas de capital privado.

Não vale a pena voltar à liça, mas era bom que a UNITA se lembrasse que para se conseguir a paz em 2002, o governo de então do MPLA não andou a pedir investigação a capitais de membros do partido do Galo Negro, nem tampouco pediu uma “sindicância” aos diamantes de sangue com que se pagou grande parte da guerra.

Não é importante falar de algo que não precisa de ser lembrado, mas que os próprios deveriam ser os primeiros a não esquecer o que aconteceu nessa altura, e retirarem daí as devidas ilações, porque a política se faz também de experiências passadas, umas para evitar, outras para repetir!

Temos que saber que há momentos em que o sentido de Estado e a responsabilidade de decidir e de dar contributos razoáveis para as decisões exigem amplos consensos nacionais, e a UNITA se pretender mobilizar as pessoas para um projecto credível de alternativa ao governo, tem que assumir uma postura de seriedade, despir a demagogia e, acima de tudo, corporizar uma proposta de oposição  assente numa responsabilidade partilhada de uma angolanidade, que tem que deixar de andar à deriva e a servir interesses pessoais ou de grupo.

A licitude desta decisão sobre os recursos de angolanos no estrangeiro é sublinhada pelo ministro das Finanças, Archer Mangueira, na apresentação da proposta: “Do país saíram não apenas recursos financeiros obtidos de forma lícita, como também outros que se podem considerar estar associados à prática de ilícitos penais e de infracções administrativas de natureza fiscal, aduaneira, cambial e financeira e de outros tipos de delitos de fórum comum”. Na primeira fase da proposta, do repatriamento voluntário, será dado um período de moratória de 6 meses, e os que aderirem “não precisam de justificar a origem dos fundos”, não incidindo qualquer encargo tributário ou outro sobre os valores repatriados. Numa segunda fase, quem não repatriar voluntariamente os recursos no exterior, o Estado reserva-se no direito de accionar todos os mecanismos e procedimentos legais ao seu dispor, proceder a sanções administrativas ou penais e recuperação dos montantes.

Pede-se a todos os agentes económicos e políticos que esta medida possa resultar sem o sobressalto cívico que a proposta da UNITA pretendia, com objectivos pouco transparentes e indiciar porventura o regresso aos tempos do “quanto pior melhor”, com as consequências que essa política trouxe e ainda bem presente no quotidiano dos angolanos.

Angola é mais importante que os partidos, e a maior riqueza que tem o País são as pessoas e é para elas e com elas que se vai fazer uma Pátria que não os envergonhe e que não traga períodos tão grandes de melancolia e desesperança.

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