terça-feira, 22 de janeiro de 2019

Portugal | Salvar os Correios dos seus donos


Mariana Mortágua | Jornal de Notícias | opinião

ANA Aeroportos e CTT, duas empresas públicas monopolistas, estratégicas e lucrativas, privatizadas pelo Governo de PSD e CDS. Ambos os processos foram apresentados ao país como um sucesso, mas o pouco tempo decorrido desde então revelou a podridão desta imensa farsa.

Em troca de mais uns milhões, que garantiram ao ex-secretário de estado Sérgio Monteiro galardões como privatizador, a Direita entregou à multinacional Vinci o controlo dos aeroportos nacionais, para além da construção do novo aeroporto de Lisboa; e deu aos compradores dos CTT uma rede única, acrescida de uma licença bancária e do exclusivo da comercialização de certificados do tesouro.

Tudo nas privatizações foi uma mentira, e ninguém assume a responsabilidade. A ANA aumentou as taxas aeroportuárias e agora vai decidir por nós a localização do novo aeroporto. Os CTT degradaram o serviço, mandaram gente embora e continuam a encerrar postos dos correios.

Só em cinco anos, a ANA lucrou €587M, 20% do valor pago pela Vinci. Nos CTT, a situação financeira assume contornos quase criminais.

Em dezembro de 2013, 68,5% do capital dos CTT foi disperso em Bolsa. Apesar de terem sido proprietários da empresa por 25 dias, os acionistas decidiram para si uma choruda distribuição dos lucros de 2013. Meses depois, os CTT valiam mais €240M. Um verdadeiro Euromilhões para os bancos e fundos estrangeiros que tinham comprado as ações na primeira fase de privatização. Em 2014, os restantes 31,5% foram vendidos por menos €343M que o valor bolsista do dia anterior.

Depois do entusiasmo inicial, os CTT começaram a cair na Bolsa. Para compensar os investidores, a empresa distribuiu ainda mais dividendos. Em cinco anos, os Correios tiveram lucros de €300M, mas entregaram aos acionistas €330M. Não é lapso, a administração dos CTT entregou aos acionistas todo o lucro e ainda uma parte das reservas. Descapitalizaram a empresa. Geriram-na de forma incompetente e, para compensar a quebra dos lucros, prometeram a eliminação de 800 postos de trabalho. O homem responsável por este assalto, Francisco Lacerda, era o 9.o gestor mais bem pago do país em 2017, com um salário anual de €900 mil.

Leviandade é pouco para caracterizar as decisões que, em poucos meses, deitaram a perder o futuro destas empresas e poder de decisão do país sobre elas. Responsabilidade é o que se exige ao Governo que tem nas mãos o poder de recuperar já os CTT para a esfera pública. Quantas mais Portugal Telecom teremos de ver definhar para que se tomem as decisões que protegem o interesse público?

*Deputada

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