Ainda não há data para o funeral
de Jonas Savimbi, a família e o seu partido aguardam ainda pelo resultado do
teste de ADN. Assim já não há cerimónias fúnebres a 6 de abril, como estava
inicialmente previsto.
Os filhos de Jonas Savimbi e a
UNITA, o maior partido da oposição em Angola, entendem que o ideal seria fazer
o enterro depois da época chuvosa, que vai até princípios de maio. Rafael
Savimbi, um dos filhos do fundador e ex-líder da UNITA, estima que a partir da
segunda quinzena de maio, se os resultados do teste de ADN estiverem prontos,
então tal possa acontecer. A DW África conversou com Rafael Savimbi sobre esse
processo e não só:
DW África: Depois de vários anos
de espera finalmente os restos mortais do seu pai serão entregues a família e a
UNITA. É um gesto do novo Governo angolano que em muito se distancia do
anterior Governo...
Rafael Savimbi (RS): Este
processo não começou com o novo Governo, começou há vários anos, na altura era
José Eduardo dos Santos a dirigir o país, mas infelizmente não teve a
postura necessária. Deve ter havido algum interesse que fez com que o
processo não fosse muito bem sucedido. Aquando do último encontro entre o
Presidente da República e o [presidente da UNITA] houve o relançar desse
processo, que felizmente está a correr bem e hoje as coisas estão muito
avançadas.
DW África: É um sinal de abertura
por parte do Governo de João Lourenço?
RS: É um sinal de que Jonas
Savimbi, por ter pertencido a um partido diferente, está a marcar profundamente
Angola e os próprios angolanos, inclusivamente o próprio Governo tem
necessidade de [continuar] este dossier, porque seguramente vai aprofundar o
processo de reconciliação nacional. Penso que há aqui uma dinâmica política e
social no país que faz com que [isso aconteça].
DW África: Para muitos africanos
o enterro e as devidas cerimónias fúnebres são rituais que trazem paz e
encerram, de certa maneira, uma porta. Como foram os últimos 17 anos para a
família Savimbi?
RS: Foram anos de dor e
cheios de muita expetativa por este momento que felizmente iremos viver.
É verdade, como bem disse, nós somos africanos e na nossa cultura o óbito
só se encerra com um funeral condigno do seu ente-querido. Então, seguramente
que estes 17 anos foram difíceis e vão ter, felizmente, este momento de
realizarmos um funeral condigno. Mas isso não significa que o homem será
enterrado e que tudo para por aí, é uma pessoa que marcou profundamente as
nossas vidas, seja no quadro particular ou coletivo, pelo que será sempre
lembrado, como pai, avó, companheiro, sobretudo como cidadão que se
entreguou as causas dos seus povos, destacou-se e marcou a história do seu
país.
DW África: Um enterro sem honras
de Estado é motivo de insatisfação para a família de Savimbi e para o seu
partido, a UNITA?
RS: Nem a UNITA e nem a
família um dia solicitaram um funeral condigno junto do Governo, isso nunca
aconteceu. Eu praticamente participei de todo o processo, de todos os contatos,
das negociações que fomos fazendo com o Governo para que pudéssemos encontrar
algum meio termo neste processo e devo dizer que nunca, em momento algum, nós
levantamos essa possibilidade. Agora, é preciso dizer que o Governo, queira ou
não, Jonas Savimbi marcou profundamente a história deste país, Jonas Savimbi
foi um dos co-signatários dos acordos de Alvor que trouxeram a independência
para Angola, foi signatário dos acordos gerais de paz para Angola, os
famosos acordos de Bicesse. Então, há factos tão marcantes da história de
Angola que fazem com que Savimbi faça parte deste mosaico histórico do nosso
país. Não são decretos que trarão honra para Savimbi. Eu sinto que hoje a
maioria dos angolanos reconhece a sua causa e vão honrando. E digo-lhe, por
exemplo, que estes dias há uma série de [ações] não só nas redes sociais, mas
também nos bairros aqui em Luanda, onde os jovens dizem que para honrar Savimbi
estão a desenhar a sua imagem nas paredes e isso para mim é muito
reconfortante. Se fosse por causa de um decreto a determinar que Savimbi é um
herói e tem a sua estátua e vai merecer honras de Estado mas que os angolanos,
povo pelo qual Savimbi morreu, não o reconhecesse eu ficaria triste.
DW África: Então por tudo isso
que referiu agora ser elevado a estatuto de herói seria uma satisfação para a
UNITA?
RS: Não, o que
quero dizer com isso é que a sua elevação a um estatuto de herói vai
resultar da vontade do povo como tem sido de momento. Mas não precisamos de
decretos para dizer o que Savimbi é, não é preciso isso, porque nunca
solicitamos.
DW África: Entretanto em 2015 a UNITA teria até
entregue um caderno de encargos com o plano dos atos das cerimónias fúnebres.
Em que consistia esse caderno de encargos?
RS: Não só em 2015, mas
também o ano passado fizemos, porque este processo que é de exumação, recolha
de amostras, transladação e exumação é longo, e porque também no local, que é a
aldeia Lopitanga, no município do Andulo na província do Bié, que é a terra
natal de Jonas Savimbi, onde então serão exumados os seus restos mortais, é uma
zona que no tempo do conflito armado tinha sido minada. Significa que em 1999,
quando as tropas do Governo retomam a vila do Andulo, houve minas colocadas a
volta da aldeia de Lopitanga. Então, havia necessidade garantirmos que essas
minas fossem retiradas para podermos evitar acidentes, esses são alguns dos
pontos que constavam do caderno de encargos e o Governo é que tem os meios
para fazer isso. Um outro ponto era a necessidade, por exemplo, de abrirmos
vias de acesso porque a zona praticamente estava a abandonada, um outro aspeto
era a necessidade de no quadro de criamos alguma vida ali colocarmos alguns
pontos de água para as populações que vivem naquela zona. Um outro ponto foi o
da necessidade de, uma vez feita a exumação podermos chamar especialista para
fazer a extração de amostras para o teste de ADN. São estes aspetos que
constavam do caderno de encargos entregues pela UNITA ao Governo.
DW África: E o Governo de Angola
respondeu positivamente a esses pedidos?
RS: Pelo menos a questão da
desminagem foi respondida, parte da desminagem foi feita, falta outra.
Felizmente hoje já se chega a Lopitanga. A questão do ADN ja foi feita, já
fizemos a recolha das amostras e neste momento estamos a espera dos resultados.
Tivemos duas equipas: uma angolana e outra portuguesa, todas em nome do
Governo. E em nome da família e da UNITA tivemos uma equipa sul-africana que
também participou do processo da exumação e recolheu amostras. Neste momento
cada grupo está a trabalhar no seu laboratório para num curto espaço de tempo
darem-nos o resultado. E cada um virá de novo a Luanda para então cruzarmos os
resultados.
DW África: Acredita que até
abril, altura em que prevêm fazer as cerimónias fúnebres, todos estes pontos
estejam devidamente respondidos?
RS: É o nosso desejo,
estamos a ser o mais positivos possível, com o desejo também de que tudo corra
da melhor maneira possível, pelo que estamos a trabalhar para que tudo corra
dentro dos prazos pré-estabelecidos.
DW África: Os interesses da
família Savimbi e da UNITA estão conciliados no que diz respeito as cerimónias?
RS: Claramente, porque o
desejo tem sido da família e da UNITA. Mesmo no quadro dos contactos que foram
estabelecidos com o Governo nunca houve uma dissociação. A delegação é mista,
composta pela família e membros do partido UNITA para juntos defendermos esta posição,
pelo que todas as posições e disposições que estão a ser tomadas são
combinadas, são da nossa vontade e partilhadas pelo partido.
Nádia Issufo | Deutsche Welle
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