Miguel Guedes | Jornal de Notícias
| opinião
A 26 de Abril, cravos já cansados
na sua relativa liberdade, contas de subtrair: são 5 os anos que separam as
comemorações dos 40 anos do Serviço Nacional de Saúde (SNS) das comemorações
dos 45 anos da Revolução de Abril. Agora, as contas são feitas para dividir:
são também 5 os anos que nos podem separar do fim do SNS. A nova Lei de Bases
da Saúde, a ser debatida e votada ainda nesta legislatura, é a peça fulcral da
visão e do que queremos para o país nas próximas décadas. A escolha far-se-á
entre dotar a saúde de todos os meios que assegurem condições de tratamentos e
cuidados universais e para todos ou, ao invés, esvaziar progressivamente o SNS
de meios e recursos, entregando-o aos privados através de parcerias
público-privadas (PPP) na gestão dos hospitais.
Sejamos claros. Depois do direito
ao voto, o SNS é a conquista que os portugueses mais valorizam em democracia. É
um caso de sucesso que a Direita não ousa enfrentar mas que teima em revisitar
para, aos poucos, o destruir. A divagação à vista de António Costa, ao dar o
dito por não dito relativamente aos acordos da nova Lei de Bases com o BE, cede
o horizonte ao mapa de navegação do PSD de Rio. A pior notícia para o SNS, a
maior conquista de Abril, é o amanhã que o PSD ontem cantou ao PS como
chamamento de sereia à custa do SNS.
O PS foi no engodo no dia 25 de
Abril e esse é, já de si, um triste sinal. A diabolização do fim das PPP a que,
aparentemente, o presidente da República procura dar lastro, nada tem a ver com
as PPP de Cascais, Loures ou Vila Franca de Xira, as três únicas que existem. A
escolha a ser feita diz respeito ao futuro e a saber se admitimos a
vampirização do sector público pelo sector privado que, naturalmente só fará
pelos cidadãos aquilo que estiver acordado e não aquilo que tiver que ser
feito. E, não é coisa menor, é da saúde que tratamos. A Lei de Bases hoje em
vigor, pedaço de catástrofe pela mão do PSD e CDS, é responsável e porta aberta
à degradação de condições para os utentes e trabalhadores do SNS nos últimos
anos. Permitir que tudo fique igual na nova Lei de Bases da Saúde, será
condenar o extraordinário legado de António Arnaut e de João Semedo a uma
simples memória.
Querem tratar-nos da saúde. Não
podemos admitir a admissão de desmantelamento do SNS ao serviço de benefícios
particulares e de uma visão ideológica que pretende dissolver direitos
fundamentais numa rede de interesses. É este "bloqueio central" entre
PS e PSD que, à semelhança do passado, julga assegurar que nada mudará até que
se extinga.
(O autor escreve segundo a antiga
ortografia)
* Músico e jurista
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