Nuno Botelho | Jornal de Notícias
| opinião
O fim do Bairro do Aleixo é uma
boa notícia. Já a dispersão do tráfico e do consumo de estupefacientes por toda
a envolvente é um problema grave e levanta questões de segurança preocupantes.
Afinal, quem é que manda na polícia?
A área que vai dos jardins de
Serralves até ao Fluvial, entre hotéis de cinco estrelas e escolas
internacionais, transformou-se num supermercado de droga a céu aberto, com
epicentro no Bairro Pinheiro Torres, num cenário de degradação social absoluta.
O fenómeno não é novo - estava escondido nas ruas interiores do Aleixo -, nem
diferente do que há anos sucedia noutras paragens. Acresce que a uma boa medida
da Câmara - o realojamento dos moradores do bairro, permitindo a sua demolição,
a revitalização e o adequado tratamento urbanístico daquela chaga -, não cabem
ao município competências correspondentes em matéria de policiamento e de
segurança urbana. A Câmara pode acabar com o Aleixo mas não tem autoridade para
acabar com o tráfico de droga. Sendo que não existe uma entidade regional que
possa ser responsabilizada.
Aqui entram os vícios do nosso
modelo de governo. Um Estado centralista gere as polícias (como outros
instrumentos de soberania) à distância, totalmente alheado de todas e cada uma
das realidades locais. Ao diretor da PSP ou ao ministro da Administração
Interna tudo o que não constitua um problema de segurança ou de ordem pública
em Lisboa e arredores não é prioridade. Não são os filhos dos governantes nem
dos deputados que têm que passar pelo Pinheiro Torres a caminho da escola. Que
fica demasiado longe de Lisboa para sequer colocarem a questão dos meios ou da
falta deles.
Um Estado regionalizado associa
políticas de segurança a responsáveis políticos, do mesmo modo que pode assumir
compromissos e procurar resultados. Um governo regional, até porque vai a
votos, não se demite das suas obrigações. A regionalização não se fará apenas
por causa da PSP e da segurança dos cidadãos. Mas, por si só, seria um bom
motivo para que se fizesse. Também para que no Porto não se pudessem ver
episódios do "Narcos" sem precisar de assinar a Netflix.
*Empresário e Presidente da
Associação Comercial do Porto
------------------------
Nota da Redação PG
O artigo de opinião de Nuno
Botelho, aborda, pelo menos, dois pontos que referem a zona da cidade do Porto,
porém em nossa opinião e conhecimento podem com toda a verdade ser extensivos a
muitas outras zonas de Portugal.
O Bairro do Aleixo era uma zona
degrada e paupérrima da cidade do Porto, as chamadas “casas para a ralé” e
alguns da criminalidade. Ora isso ocorre em imensas zonas degradadas do país,
também em Lisboa.
A centralização é, para Nuno
Botelho, com razão, um mal que contribui para a situação que refere e que aparentemente se
esgota no Porto. Mas não. A centralização de poderes em Lisboa afeta todo o país.
Sabemos. Botelho também o sabe… Quem não o sabe? Muitos outros já estão
devidamente esclarecidos, os políticos com poderes também. Urge avançar com a
descentralização que vergonhosamente tarda. Esse é um dos problemas. A
proliferação dos “barões lusos" da droga está-lhe no rasto. A droga é outro
problema.
Em Lisboa, como no Porto, os “dealers”
acoitam-se nos bairros sociais da Câmara Municipal de Lisboa, na Gebalis,
melhor dizendo. A droga prolifera a céu aberto e a PSP não tem mãos a medir.
Tantas vezes frustrada por não poder deitar ferros da justiça aos que são grandes “tubarões” da
droga e que a disseminam por jovens desses bairros sociais, “promovendo-os a pobres-dealers”.
‘Pés-rapados’ que são afinal vítimas de esquemas criminosos desses mesmos grandes “tubarões”.
Tudo porque a miséria a vários níveis abunda nesses bairros lisboetas (citadinos)
de gentes cujas habilitações literárias, culturais, profissionais e outras
atingem níveis tão pobres quanto Job. A escolaridade, dita obrigatória, principalmente
para esses, passa a ser um mito. Até porque a escola é algo enfadonho, “uma
seca” como tantos dizem e sentem tantas vezes, com muita razão.
Dos governos já sabemos o que a “casa
gasta” quanto a isto. Das câmaras municipais também – principalmente nas
grandes cidades. O fazerem nada ou quase nada para inverter as situações
degradantes é o hábito quotidiano, outras entidades o que mais fazem é socorrer
essas degradações a todos os níveis com um miserável subsídio que dá para nada,
a não ser juntar aos parcos “rendimentos” da venda da droga, de objetos
furtados e/ou outros pequenos roubos que podem ser incluídos no exemplo de irem
aos supermercados com carrinhos de compras com fundos falsos. Lástimas.
Visto isso, a inércia dos poderes
governamentais, autárquicos e outros - que podiam fazer a diferença – não segurarem
o touro pelos cornos e preferirem deixar andar, vimos famílias inteiras a
afundarem-se e os seus filhos jovens a puxarem-nas cada vez mais para baixo,
para ainda mais miséria e perda de dignidade. Avós e/ou pais velhos, filhos
jovens, tudo e todos são arrastados por esse mal maior, terrível, que é a
droga.
As perspetivas são as de que tudo
virá a ser pior ainda sem a descentralização dos poderes. Porque se tal vier a
existir, quando existir, poderá criar as condições para agarrar o touro pelos
cornos do modo adequado, porque cada caso é um caso e tem as suas
especificidades. Multidisciplinarmente e multiprofissionalmente, em colaboração, as entidades locais e
regionais podem vir a ser muito mais úteis se não tiverem de se sujeitar aos
poderes centralizados. Afinal, dar azo a uma sociedade muito melhor, a uma
juventude que vê a luz ao fundo do túnel, que pode desfrutar de uma educação
escolar que não seja uma seca mas algo por que se interessem. Evoluírem enquanto cidadãos, culturalmente, profissionalmente, socialmente, etc.
Muitas mentalidades, usos e
costumes vão ter de mudar com a descentralização. Certos vícios prejudiciais, a
vários níveis, assistirão então à sua morte, ao seu desaparecimento. Surgirão
outros vícios, perniciosos, é evidente. Mas aos que surgirem o que há a fazer é
não os deixar ganharem raízes. A descentralização terá mais competências e
capacidades para atuar na defesa dos reais interesses dos cidadãos, das
cidades, vilas e aldeias… Até das empresas que existam nas suas áreas.
Sem comentários:
Enviar um comentário