quinta-feira, 13 de junho de 2019

Portugal | O Aleixo acabou, a droga não


Nuno Botelho | Jornal de Notícias | opinião

O fim do Bairro do Aleixo é uma boa notícia. Já a dispersão do tráfico e do consumo de estupefacientes por toda a envolvente é um problema grave e levanta questões de segurança preocupantes. Afinal, quem é que manda na polícia?

A área que vai dos jardins de Serralves até ao Fluvial, entre hotéis de cinco estrelas e escolas internacionais, transformou-se num supermercado de droga a céu aberto, com epicentro no Bairro Pinheiro Torres, num cenário de degradação social absoluta. O fenómeno não é novo - estava escondido nas ruas interiores do Aleixo -, nem diferente do que há anos sucedia noutras paragens. Acresce que a uma boa medida da Câmara - o realojamento dos moradores do bairro, permitindo a sua demolição, a revitalização e o adequado tratamento urbanístico daquela chaga -, não cabem ao município competências correspondentes em matéria de policiamento e de segurança urbana. A Câmara pode acabar com o Aleixo mas não tem autoridade para acabar com o tráfico de droga. Sendo que não existe uma entidade regional que possa ser responsabilizada.

Aqui entram os vícios do nosso modelo de governo. Um Estado centralista gere as polícias (como outros instrumentos de soberania) à distância, totalmente alheado de todas e cada uma das realidades locais. Ao diretor da PSP ou ao ministro da Administração Interna tudo o que não constitua um problema de segurança ou de ordem pública em Lisboa e arredores não é prioridade. Não são os filhos dos governantes nem dos deputados que têm que passar pelo Pinheiro Torres a caminho da escola. Que fica demasiado longe de Lisboa para sequer colocarem a questão dos meios ou da falta deles.

Um Estado regionalizado associa políticas de segurança a responsáveis políticos, do mesmo modo que pode assumir compromissos e procurar resultados. Um governo regional, até porque vai a votos, não se demite das suas obrigações. A regionalização não se fará apenas por causa da PSP e da segurança dos cidadãos. Mas, por si só, seria um bom motivo para que se fizesse. Também para que no Porto não se pudessem ver episódios do "Narcos" sem precisar de assinar a Netflix.

*Empresário e Presidente da Associação Comercial do Porto

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Nota da Redação PG

O artigo de opinião de Nuno Botelho, aborda, pelo menos, dois pontos que referem a zona da cidade do Porto, porém em nossa opinião e conhecimento podem com toda a verdade ser extensivos a muitas outras zonas de Portugal.

O Bairro do Aleixo era uma zona degrada e paupérrima da cidade do Porto, as chamadas “casas para a ralé” e alguns da criminalidade. Ora isso ocorre em imensas zonas degradadas do país, também em Lisboa.

A centralização é, para Nuno Botelho, com razão, um mal que contribui para a situação que refere e que aparentemente se esgota no Porto. Mas não. A centralização de poderes em Lisboa afeta todo o país. Sabemos. Botelho também o sabe… Quem não o sabe? Muitos outros já estão devidamente esclarecidos, os políticos com poderes também. Urge avançar com a descentralização que vergonhosamente tarda. Esse é um dos problemas. A proliferação dos “barões lusos" da droga está-lhe no rasto. A droga é outro problema.

Em Lisboa, como no Porto, os “dealers” acoitam-se nos bairros sociais da Câmara Municipal de Lisboa, na Gebalis, melhor dizendo. A droga prolifera a céu aberto e a PSP não tem mãos a medir. Tantas vezes frustrada por não poder deitar ferros da justiça aos que são grandes “tubarões” da droga e que a disseminam por jovens desses bairros sociais, “promovendo-os a pobres-dealers”. ‘Pés-rapados’ que são afinal vítimas de esquemas criminosos desses mesmos grandes “tubarões”. Tudo porque a miséria a vários níveis abunda nesses bairros lisboetas (citadinos) de gentes cujas habilitações literárias, culturais, profissionais e outras atingem níveis tão pobres quanto Job. A escolaridade, dita obrigatória, principalmente para esses, passa a ser um mito. Até porque a escola é algo enfadonho, “uma seca” como tantos dizem e sentem tantas vezes, com muita razão.

Dos governos já sabemos o que a “casa gasta” quanto a isto. Das câmaras municipais também – principalmente nas grandes cidades. O fazerem nada ou quase nada para inverter as situações degradantes é o hábito quotidiano, outras entidades o que mais fazem é socorrer essas degradações a todos os níveis com um miserável subsídio que dá para nada, a não ser juntar aos parcos “rendimentos” da venda da droga, de objetos furtados e/ou outros pequenos roubos que podem ser incluídos no exemplo de irem aos supermercados com carrinhos de compras com fundos falsos. Lástimas.

Visto isso, a inércia dos poderes governamentais, autárquicos e outros - que podiam fazer a diferença – não segurarem o touro pelos cornos e preferirem deixar andar, vimos famílias inteiras a afundarem-se e os seus filhos jovens a puxarem-nas cada vez mais para baixo, para ainda mais miséria e perda de dignidade. Avós e/ou pais velhos, filhos jovens, tudo e todos são arrastados por esse mal maior, terrível, que é a droga.

As perspetivas são as de que tudo virá a ser pior ainda sem a descentralização dos poderes. Porque se tal vier a existir, quando existir, poderá criar as condições para agarrar o touro pelos cornos do modo adequado, porque cada caso é um caso e tem as suas especificidades. Multidisciplinarmente e multiprofissionalmente, em colaboração, as entidades locais e regionais podem vir a ser muito mais úteis se não tiverem de se sujeitar aos poderes centralizados. Afinal, dar azo a uma sociedade muito melhor, a uma juventude que vê a luz ao fundo do túnel, que pode desfrutar de uma educação escolar que não seja uma seca mas algo por que se interessem. Evoluírem enquanto cidadãos, culturalmente, profissionalmente, socialmente, etc.

Muitas mentalidades, usos e costumes vão ter de mudar com a descentralização. Certos vícios prejudiciais, a vários níveis, assistirão então à sua morte, ao seu desaparecimento. Surgirão outros vícios, perniciosos, é evidente. Mas aos que surgirem o que há a fazer é não os deixar ganharem raízes. A descentralização terá mais competências e capacidades para atuar na defesa dos reais interesses dos cidadãos, das cidades, vilas e aldeias… Até das empresas que existam nas suas áreas.

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