Manlio Dinucci*
A França já não dispõe da tríade
nuclear (vectores com base no solo, no ar e no oceano), desde 1996 e o Reino
Unido nunca a teve. Só os Estados Unidos, a Rússia e a China têm esse
privilégio. Num novo documento, o Comandante da Comissão Conjunta de Chefes do
Estado-Maior dos EUA afirma a sua disposição de desarmar nuclearmente os seus
aliados que, num desfecho, não teriam o direito de utilizar senão as bombas dos
EUA e não as deles.
Os Ministros da Defesa da NATO (de
Itália, Elisabetta Trenta, M5S, de Portugal, João Gomes Cravinho) foram
convocados para reunir em Bruxelas, em 26 e 27 de Junho, a fim de aprovar as
novas medidas de “dissuasão” contra a Rússia, acusada, sem qualquer prova, de
ter violado o Tratado INF.
Fundamentalmente, irão alinhar-se
com os Estados Unidos que, retirando-se definitivamente do Tratado, em 2 de
Agosto, preparam-se para instalar na Europa, mísseis nucleares de alcance
intermédio (entre 500 e 5.500
km ) com base no solo, semelhantes aos da década dos anos
80 (os Pershing II e mísseis de cruzeiro) que foram eliminados (juntamente com
os SS-20 soviéticos) pelo Tratado assinado em 1987 pelos Presidentes Gorbachev
e Reagan.
As principais potências
europeias, cada vez mais divididas dentro da UE, reúnem-se na NATO sob o
comando USA para apoiar os seus interesses estratégicos comuns.
A mesma União Europeia - da qual
21 dos 27 membros fazem parte da NATO (assim como faz parte a Grã-Bretanha, de
saída da UE) - rejeitou nas Nações Unidas, a proposta russa de manter o Tratado
INF. Sobre uma questão de tal importância, a opinião pública europeia é
deixada, deliberadamente, no escuro pelos governos e pelos principais meios de
comunicação mediática. Assim, não se avisa sobre o perigo crescente que paira sobre
nós: aumenta a possibilidade que, um dia, se venha a usar armas nucleares.
Confirma-o, o último documento
estratégico das Forças Armadas dos EUA, “Nuclear Operations” (11 de Junho),
redigido sob a direcção do Presidente do Estado Maior reunido. Dado que “as
forças nucleares fornecem aos EUA a capacidade de atingir os seus objectivos
nacionais", o documento salienta que as mesmas devem ser “diversificadas,
flexíveis e adaptáveis” a “uma ampla gama de adversários, ameaças e contextos”.
Enquanto a Rússia adverte que
mesmo o uso de uma única arma nuclear de baixa potência desencadearia uma
reacção em cadeia que poderia levar a um conflito nuclear em grande escala, a
doutrina dos EUA está-se orientando com base num conceito perigoso de
“flexibilidade”. ’Alvos (esclarece o mesmo documento) realmente escolhidos
pelas agências de inteligência/serviços secretos, que avaliam a vulnerabilidade
a um ataque nuclear, prevendo também os efeitos da chuva radioactiva.
O uso de armas nucleares –
sublinha o documento – “pode criar as condições para resultados decisivos:
especificamente, o uso de uma arma nuclear mudará fundamentalmente o quadro de
uma batalha criando as circunstâncias que permitem aos comandantes prevalecer
no conflito”. As armas nucleares também permitem aos EUA “salvaguardar os seus
aliados e parceiros" que, confiando neles, “renunciam à posse das suas
próprias armas nucleares, contribuindo para os propósitos de não-proliferação
dos EUA".
No entanto, o documento deixa
claro que “os EUA e alguns aliados selecionados da NATO mantêm aviões de
capacidade dupla capazes de transportar armas nucleares ou convencionais”.
Admite, assim, que quatro países europeus não nucleares - Itália, Alemanha,
Bélgica, Holanda – e a Turquia, violando o Tratado de Não-Proliferação, não só
hospedam armas nucleares americanas (as bombas B-61 que, a partir de 2020,
serão substituídas pelas B61-12, mais mortíferas ), mas estão preparados para
usá-las num ataque nuclear sob comando do Pentágono.
Tudo isto é omitido pelos
governos e parlamentos, televisões e jornais, com o silêncio cúmplice da grande
maioria dos políticos e jornalistas, que, pelo contrário, nos repetem,
quotidianamente, como é importante para nós, italianos e europeus, a
“segurança”. Garantem-na os Estados Unidos, instalando na Europa, outras armas
nucleares.
Manlio Dinucci*
| Voltaire.net.org | Tradução: Maria Luísa de
Vasconcellos | Fonte: Il Manifesto (Itália)
*Geógrafo e geopolítico. Últimas
publicações : Laboratorio
di geografia, Zanichelli 2014 ; Diario di
viaggio, Zanichelli 2017 ; L’arte
della guerra / Annali della strategia Usa/Nato 1990-2016, Zambon 2016; Guerra
nucleare. Il giorno prima. Da Hiroshima a oggi: chi e come ci porta alla
catastrofe, Zambon 2017; Diario di guerra.
Escalation verso la catastrofe (2016 - 2018), Asterios Editores 2018.
Imagem: O General da Infantaria
da Marinha, Joseph Dunford, Presidente da Comissão Conjunta dos Chefes do
Estado-Maior, concedeu os diplomas aos alunos da Universidade da Defesa
Nacional, em 13 de Junho de 2019. Aproveitou a oportunidade para assegurar que
“É aos oficiais generais que compete conduzir a mudança, num mundo incerto”.
Documentos anexados
Nuclear
Operations | Joint Chiefs of Staff, June 11, 2019 (PDF - 1.1 Mb)
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