Pablo Sepúlveda Allende apontou
falhas no relatório sobre direitos humanos da alta comissária da ONU e
ex-presidente chilena Michelle Bachelet
Médico radicado na Venezuela,
Pablo Sepúlveda Allende, neto do ex-presidente do chileno Salvador Allende,
acompanhou de perto a visita da alta comissária das Nações Unidas para os
Direitos Humanos, Michelle Bachelet, também ex-presidente do Chile. Bachelet
esteve na Venezuela entre os dias 19 e 21 de junho, em missão oficial.
Sepúlveda chegou a fazer parte da comitiva de convidados ilustres que recebeu a
alta comissária na sede do Ministério de Relações Exteriores da Venezuela. Na
ocasião entregou uma carta a ex-presidente chilena falando sobre as razões da
crise venezuelana e a realidade do país.
Em entrevista ao Brasil de
Fato, Pablo Sepúlveda Allende fala sobre o relatório final sobre a situação dos
direitos humanos na Venezuela apresentado por Michelle Bachelet ao Conselho de
Direitos Humanos da ONU, nessa sexta-feira (05/07). Confira a seguir os
principais trechos da conversa e os temas destacados pelo neto de Salvador
Allende, ex-presidente alvo de um golpe de Estado apoiado pelos Estados Unidos,
em setembro de 1973.
Falhas do relatório de Bachelet
É um informe totalmente parcial.
Retrata uma realidade que foi distorcida. Fala, por exemplo, que o sistema CLAP
(Comitês Locais de Abastecimento e Produção), abastecimento de alimentos
subsidiados pelo Estado, obedece a critérios políticos, e afirma que quando a
pessoa é opositora não recebe os alimentos do CLAP. Isso é totalmente falso. O
que eu vejo, onde moro, é que a maioria das pessoas é opositora e recebe seu
benefício. Também afirma que é um sistema de vigilância e controle social, o
que não faz sentido.
Outro equívoco ocorre ao
mencionar que as sanções econômicas estão direcionadas, em sua maioria, às
pessoas do governo. Sabemos que as sanções estão fazendo com que muitos bancos
retenham quantidades importantes de dinheiro venezuelano, destinado a compra de
alimentos e medicamentos.
Por outro lado, o relatório pouco
diz sobre a violência que os setores chavistas sofreram. Nos protestos de 2017,
durante as guarimbas [protestos violentos de opositores], houve muitas mortes
de chavistas. Foram agredidos devido a sua orientação política. Há casos de
pessoas que foram queimadas vivas por serem chavistas, mas Bachelet não
menciona isso em seu relatório.
Ela fala em ‘presos políticos’,
mas não menciona que essas pessoas estão detidas por delitos de violência,
inclusive por terrorismo. Ninguém está preso porque opina contra o governo.
Crise econômica e sanções
A crise econômica da Venezuela
tem sua origem no mercado petroleiro, quando os preços do barril de petróleo
sofreram forte queda a partir de 2014. A queda se manteve por dois anos e isso
repercute em uma economia que depende em grande medida nos recursos da venda do
petróleo. Cerca de 95% dos dólares que entram na Venezuela vêm do petróleo.
E quando a economia começava a
dar sinais de recuperação, em 2017, com a alta no preço do petróleo, começaram
as sanções contra a PDVSA. O Departamento do Tesouro proibiu a comercialização
dos títulos de dívida da PDVSA e do governo venezuelano. Isso foi afetando a
economia. Recordemos a palavras do ex-embaixador dos Estados Unidos na
Venezuela, William Brownfield." As sanções à PDVSA estão dirigidas para
causar um colapso econômico e social". Portanto, é uma política planejada
e anunciada publicamente por autoridades do governo dos EUA, e Bachelet não
condena esse bloqueio.
Cifras de ONGs financiadas pelos
EUA
As cifras utilizadas por Michelle
Bachelet são fornecidas por ONG's que historicamente são de oposição e
financiadas pela Usaid (sigla em inglês para Agência dos Estados Unidos para o
Desenvolvimento Internacional) e a NED (sigla em inglês para Fundação Nacional
para a Democracia, ligada ao Partido Republicano). Também são financiadas por
fundações como a Fundação Ford e a Open Society Foundations, do empresário
norte-americano George Soros.
A organização Foro Penal, citada
por Bachelet e que fornece cifras de ‘presos políticos’, é financiada por essas
fundações, que instrumentaliza os direitos humanos com fins políticos e
econômicos. Portanto, as fontes que são utilizadas nesse relatório são ONGs que
recebem dinheiro dessas organizações estrangeiras e isso desprestigia e
deslegitima o informe da alta comissária da ONU.
Lugar na história
O papel que desempenha Michelle
Bachelet, com esse tipo de informe, é um bastante desonesto e vergonhoso, porque com
isso está pavimentando o caminho para uma possível intervenção por "razões
humanitárias". Vamos lembrar que em casos anteriores, como na Síria e na
Líbia, deram esses mesmos passos prévios, com esses organismos, como a comissão
de Direitos Humanos da ONU e também a Corte Penal Internacional, para condenar
líderes políticos antes de uma intervenção militar.
Portanto, recai sobre Michelle
Bachelet uma grande responsabilidade histórica e política, caso daqui em diante
aumente as agressões contra a Venezuela. Isso terá seu custo histórico.
Além disso, ela está traindo os
ideais que alguma vez defendeu e, os quais, o seu pai também defendeu. Está
traindo um legado da esquerda chilena ao colocar-se ao lado de um agressor
poderoso como os Estados Unidos, que ameaça constantemente a Venezuela. No
fundo, esses agressores são os mesmos que agrediram o Chile no passado.
Violações durante o seu
governo
Michelle Bachelet militarizou
toda a zona de Araucanía, região do povo indígena Mapuche. Isso foi feito para
criminalizar e satanizar a luta do povo Mapuche que tenta recuperar suas terras
e recursos, contra os terratenentes e as empresas florestais [dedicadas a
produção de madeira]. Isso foi constatado pela Comissão Interamericana de
Direitos Humanos, que afirmou que nessa zona se violava os direitos humanos.
Existem informes sobre a atuação policial e os efeitos na saúde mental das
crianças, devido o grau de violência utilizado pelos policiais.
A população chilena, segundo
pesquisas de opinião pública, queria o fechamento das casas penitenciárias de
luxo, onde estão presos os militares por violação dos direitos humanos.
Militares da época da ditadura, que cometeram crimes de lesa humanidade, estão
presos em cárceres especiais, onde possuem até piscina. Bachelet se comprometeu
a fechar essas prisões, mas não fez isso.
Verdade sobre a Venezuela
É muito importante que saibam o
que de fato acontece na Venezuela. No mundo, existe um cerco midiático para
invisibilizar a verdadeira realidade que se vive no país. Existe uma guerra
declarada, nos âmbitos econômico, midiático, político, diplomático e até
militar, através de grupo irregulares, terroristas e paramilitares. Temos
notícias até de exércitos privados de mercenários, que estão se preparando na
fronteira com a Colômbia.
Entre as questões invisibilizadas
estão as verdadeiras causas da crise econômica e o esforço do governo e do povo
venezuelano para conter a crise, para superá-la, através de programas sociais,
como o sistema de alimentação do CLAP. Existe um acordo tácito entre os meios
de comunicação de demonizar a Revolução Bolivariana.
Por isso é importante que se
rompa esse cerco através de testemunhos, provas de investigação. Há um
bombardeio de informação constante. Todas as formas de mentiras são utilizadas
para criar uma visão negativa sobre a Venezuela. Esses são, realmente, meios de
propaganda. A principal batalha é a da comunicação.
Fania Rorigues, Caracas | Brasil de Fato |
em Opera Mundi
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