Os guineenses queixam-se que é
cada vez mais complicado obter o bilhete de identidade. Para adquirir o
documento básico tem que se contar com longos tempos de espera nas repartições
públicas.
Os serviços da identificação
civil da Guiné-Bissau têm com seis centros de produção nas regiões do país. Mas
não são os centros que imprime os bilhetes de identidade. A impressão é
assegurada por um único centro localizado na capital, Bissau. E aqui juntam-se
diariamente várias centenas de pessoas que precisam deste documento básico de
identificação pessoal.
A DW foi ao Centro de Produção de
Bilhete de Identidade falar com guineenses presentes, que se mostram-
insatisfeitos com o serviço prestado aos cidadãos. As queixam vão desde a
demora no atendimento, passam pela fraca capacidade de produção e terminam na
discriminação no atendimento dos cidadãos: "Estou aqui desde as sete horas
da manhã em busca do formulário, mas até agora não consegui”, diz um cidadão
que realça estarem presentes cerca de duzentas pessoas desde as oito horas da
manhã. Por vezes, diz, falta a eletricidade.
Cidadãos indignados
Outro guineense presente
confirma: "É um pouco aborrecido; estou aqui desde a manhã para preencher
um formulário. Preciso de um novo documento. Mas nada se resolve, está a ser
difícil, e, como pode ver, há esta a fila e há dificuldades”.
Entre os entrevistados, há quem
peça mais centros de produção do bilhete de identidade como forma de evitar as
multidões nos serviços da identificação civil: "Que descentralizem os
locais da produção do bilhete de identidade, pelo menos que haja um em cinco ou
seis bairros, assim não nos agrupamos aqui”.
Uma cidadã revoltada denunciou a
conduta imprópria dos funcionários e o tratamento desigual dos utentes:
"Hoje faz três dias que venho aqui. Vou e venho sem conseguir nada. Nós
esperamos na fila, aí chega alguém, passa à frente, entra, resolve e vai
embora”, queixa-se à DW África. Acresce que muitas vezes pessoas passam à
frente na própria fila de espera.
Prioridade para alguns
A DW tentou, sem sucesso, obter
um comentário da Diretora-Geral dos Serviços da Identificação Civil.
Está ainda a causar polémica no
país um despacho da Ministra da Justiça e dos Direitos Humanos, Ruth Monteiro,
que reserva prioridade para de atendimento em todos os serviços do Ministério,
inclusive no centro de produção de bilhete de identidade, a magistrados e
advogados. Grávidas e idosos constam na última posição de prioridades e pessoas
com deficiência não são mencionadas.
O jurista Luís Peti considera que
o despacho em causa não é discriminatório, mas devia levar em conta as pessoas
com deficiência: "Por causa do seu estado, as pessoas com deficiência não
conseguem ficar em filas por longas horas”.
Milhões de africanos sem cartão
de identidade
Mais de 500 milhões de africanos
não têm cartão de identidade e cerca de 120 milhões de crianças vivem sem
registo de nascimento, segundo dados divulgados hoje pela Comissão Económica
para África das Nações Unidas (ECA).
"Mais de 500 milhões de
pessoas em África não têm cartão de identidade. Deste número, cerca de 120
milhões são crianças sem registo de nascimento", adiantou a ECA.
Os dados foram avançados na
véspera do Dia Africano do Registo Civil e das Estatísticas Vitais, que se
assinala no sábado (10.08.) pelo segundo ano consecutivo.
A efeméride pretende sublinhar a
importância de ter documentos de identificação na proteção dos direitos dos
cidadãos ao longo da vida e na promoção da sua inclusão nas sociedades.
Registo de nascimento universal
Numa declaração a propósito, o
diretor do Centro Africano de Estatística da ECA, Oliver Chinganya, sublinhou a
necessidade de aumentar a perceção pública da importância de "tornar todos
visíveis através do registo de nascimento universal".
"Infelizmente, em África a
procura pelos serviços de registo mantém-se fraca porque muitas pessoas não têm
a real consciência da importância do registo civil para si e para as suas
famílias, bem como das implicações que isto tem na melhoria do acesso a
serviços públicos essenciais" como escolas, serviços de saúde ou
benefícios sociais, disse.
Oliver Chinganya lembrou a meta
da "identificação legal para todos, incluindo o registo de nascimento, até
2030", prevista nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das
Nações Unidas, bem como o reconhecimento do registo civil como um pré-requisito
para o crescimento e o desenvolvimento de África pela Agenda 2063 da União
Africana.
Reconhecimento perante a lei
"O registo universal de
nascimento fornece a cada criança um certificado de nascimento, um documento
exigido para garantir o direito básico a um nome, identidade e nacionalidade. É
um documento legal essencial para garantir o reconhecimento dos cidadãos
perante a lei e para salvaguardar os seus direitos", enfatizou.
Como documento legal e prova da
idade, ajuda a prevenir as violações dos direitos das crianças, incluindo
casamentos forçados, tráfico, trabalho infantil e uso de crianças soldado,
especialmente entre as populações vulneráveis ou marginalizadas, prosseguiu.
Oliver Chinganya considerou ainda
essencial a existência de um sistema de registo civil e de estatísticas vitais
para a construção de sistemas administrativos modernos e para a promoção da boa
governação.
"O registo civil aumenta a
credibilidade das administrações nacionais e locais e melhora a capacidade de
fornecer serviços sociais, ajudando a definir quais os serviços necessários,
onde e por quem", disse.
Entre os países lusófonos, metade
da população de Angola, pelo menos 14 milhões de angolanos, não tem registo de
nascimento ou bilhete de identidade, enquanto em Moçambique apenas 47% da
população registou as crianças à nascença.
Na Guiné-Bissau, os dados mais
recentes apontam que menos de um quarto das crianças até aos cinco anos estão
registadas.
Iancuba Dansó (Bissau), Agência
Lusa | em Deutsche Welle
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