Um programa feito no pós-troika,
o da PAF em 2015, e outro em período de crescimento económico, o do PSD de Rui
Rio, mas que têm muitos pontos de contacto. A imagem do anterior e a do atual
líder social-democrata é que faz a diferença.
Era interessante, mas impossível,
comparar um programa eleitoral de Pedro Passos Coelho e de Rui Rio em 2019.
Esses deveriam ser muito diferentes". profetiza Pedro Marques Lopes. Assim
talvez se percebesse a veia mais liberal do anterior primeiro-ministro e a mais
social-democrata do atual presidente do PSD. A conjuntura de 2015, de um país
que conseguiu sair do ajustamento da troika, ditou um programa da
coligação Portugal à Frente (a PAF do PSD-CDS) que, "na essência",
não é muito diferente do que é defendido por Rui Rio nestas eleições.
Esta é também a opinião de
António Costa Pinto. "As diferenças são mais em relação à imagem do que ao
conteúdo dos dois programas", e sublinha o facto de em 2015 as propostas
terem sido cozinhadas numa coligação pré-eleitoral entre PSD e CDS, o que
introduz algumas nuances centristas nas promessas eleitorais.
"Mas era já um programa que
apontava para um ciclo de crescimento económico e que se afastava do discurso
inicial mais liberal de Pedro Passos Coelho, muito longe da diabolização da
função pública" e que, "é bom não esquecer, deu a vitória eleitoral à
PAF", sublinha António Costa Pinto. Um programa que previa muitas medidas
que foram tomadas "até pelo governo do PS, que acelerou o passo".
O programa da PAF de 2015 já remetia
para alguma descida de impostos, agora uma bandeira de Rui Rio e em dose
reforçada, já que a economia e a folga orçamental gerada nestes quatro anos a
permitem acomodar. Ainda se estava na fase da redução progressiva da sobretaxa
de IRS, que só terminaria em 2019 para todos os escalões.
Passos Coelho (e Portas) investia
mais na descida gradual do IRC, que apontava para os 17% em 2019; e um reforço
nas taxas do quociente familiar, que beneficiava as famílias com mais filhos; e
na eliminação gradual do imposto municipal de transmissões onerosas de imóveis
(IMT), que ficaria reduzida em 50% na tributação em imposto de selo.
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O líder do PSD aposta na redução
de 23% para 6% da taxa de IVA do gás e da eletricidade para uso doméstico e
ainda uma descida na taxa mínima de IMI (de 0,3% para 0,25%).
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Rui Rio põe agora um assento
tónico na descida de impostos e vai mais longe a prometer que - caso ganhe as
eleições de 6 de outubro - irá reduzir o IRS para os escalões intermédios,
complementado com maiores deduções de educação e saúde; e a tal descida gradual
do IRC dos atuais 21% para os 17% ao longo da próxima legislatura.
O líder do PSD aposta na redução
de 23% para 6% da taxa de IVA do gás e da eletricidade para uso doméstico e
ainda uma descida na taxa mínima de IMI (de 0,3% para 0,25%).
"Na altura em que a PAF
apresentou o programa de 2015 não havia possibilidade de defender uma redução
de impostos desta natureza, mas Rio aproveita agora o crescimento dos quatro
anos e a folga orçamental para esta ser uma das suas bandeiras eleitorais, mas
na verdade apontavam os dois para o mesmo caminho", afirma Pedro Marques
Lopes.
António Costa Pinto sublinha que
os dois programas se tocam também nas matérias sociais e que ambos não seguiram
a via da defesa da liberalização do mercado laboral, apesar de essa imagem ter
"ficado colada a Passos Coelho", como afirma o politólogo José
Adelino Maltez.
Num dos capítulos mais sensíveis
para medir a carga ideológica dos programas do PSD-CDS 2015 e o PSD 2019, o da
Segurança Social, as semelhanças são grandes. Embora Passos fizesse uma
"aposta mais descarada", como refere Pedro Marques Lopes, do
plafonamento das pensões, ou seja, a criação de um teto máximo, para as novas
gerações.
Os dois programas apontam para a
matriz do regime público obrigatório e universal de proteção social e abrem a
porta ao desenvolvimento dos planos complementares de reforma, sejam de
natureza profissional ou individual.
E se formos às finanças públicas,
Passos e Rio têm um discurso muito similar no que respeita à necessidade de
manter o país no trilho das "contas certas". Um termo que o PS
apadrinhou e que lhe permite transmitir a ideia de que não voltará a deixar
cair Portugal numa situação parecida com a de 2011, na altura do governo
socialista de José Sócrates.
Há quatro anos, o então líder do
PSD propunha-se reduzir o défice orçamental para um valor inferior a 3% do PIB
em 2015 (acabou por ser 4,4% já com Mário Centeno e devido aos apoios à banca);
e alcançar já em 2016 a
meta do saldo estrutural de 0,5% do PIB. Referia no programa da PAF que queria
manter "uma situação orçamental equilibrada ou excedentária no período de
2017-2019.
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"Passos Coelho foi a última
peça de um ciclo marcado pela troika e a sua imagem ficou estruturalmente
ligada a esse tempo"
Mas ia mais longe ao lembrar
que,"em matéria de sustentabilidade das finanças públicas, reafirmamos
ainda a nossa disponibilidade para que a Constituição consagre um limite de
expansão da dívida pública", que Passos queria reduzir para 107,6% do PIB
em 2019 (em 2018 era de 121,5% do PIB). Mas a "norma travão" a um
endividamento excessivo sempre foi rejeitada pelo PS.
Rui Rio não volta a pegar nesta
ideia, mas, em nome do equilíbrio das contas do Estado, bate-se para que a
dívida pública fique abaixo dos 90% a médio prazo. O atual presidente
social-democrata tem vindo sempre a defender que para Portugal ser saudável
deverá ser ligeiramente superavitário, ou seja, ter mais receitas do que
despesas do Estado.
"Passos Coelho foi a última
peça de um ciclo marcado pela troika e a sua imagem ficou
estruturalmente ligada a esse tempo", afirma José Adelino Maltez,
sublinhando que, mesmo que as propostas de 2015 já fossem diferentes, essa
imagem não se diluiu. "Nas coisas da política a imagem é tudo. E Passos
Coelho deixou-se encurralar na imagem de austeridades. Rui Rio vai noutra
direção."
Foi esta gestão de imagem que, na
opinião de António Costa Pinto, levou o atual líder do PSD a fazer um discurso
de recentramento do PSD, que afirma de centro e social-democrata, e a um
distanciamento, até artificial, do antecessor no partido.
O politólogo sublinha que até na
aposta no investimento público e nas exportações, para fomentar o crescimento
económico, e na defesa e melhoria dos serviços públicos que constam das
propostas eleitorais do PSD hoje já o programa pós-troika da coligação PAF
ensaiava os primeiros passos para um novo ciclo económico de crescimento. Que o
Partido Socialista de António Costa acabou por aproveitar a todo o gás.
Diário de Notícias
Na foto: Rui Rio sucedeu a Passos
Coelho na liderança do PSD em janeiro de 2018 / © Paulo Spranger/Global
Imagens
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