Thierry Meyssan*
Só, contra a sua própria
oposição, contra a sua Administração e contra os seus aliados, o Presidente
Trump não parece à altura de conseguir fazer aplicar os seus compromissos de
campanha. Três anos após a sua eleição, a Câmara dos Representantes lançou contra
ele um processo de destituição porque ele luta contra a corrupção dos seus
adversários
O principal compromisso de campanha
de Donald Trump, de por fim à estratégia militar ofensiva Rumsfeld/Cebrowski e
de a substituir por uma política de cooperação jacksoniana, choca com uma
poderosa oposição interna nos EUA e externa dos aliados dos Estados Unidos.
Mais do que nunca, o Presidente aparece sozinho, absolutamente só, face à
classe política transatlântica.
Tudo jogado antecipadamente
Como para o seu predecessor,
Barack Obama, tudo parece decidido antecipadamente.
Desde a sua eleição, em 2009,
Obama foi saudado como «o primeiro presidente negro dos Estados Unidos», depois
mostrou-se incapaz de resolver os problemas desta comunidade, deixando a
violência policial a seu respeito atingir máximos. Logo nos primeiros dias do
seu mandato, o Comité Nobel atribuía-lhe o Prémio Nobel da Paz saudando os seus
esforços «por um mundo sem armas nucleares»; um assunto que ele deixou
imediatamente de abordar. Muito embora o seu balanço seja o exacto oposto das
suas promessas de campanha, não deixou, por isso, de ser menos popular no
mundo. Pouco importando a deslocalização de empregos para a China, a
continuação de Guantanamo, os milhares de assassínios selectivos, e a
destruição da Líbia.
Pelo contrário, desde a sua
eleição, e antes mesmo da transmissão de Poder em 2017, Donald Trump era
apresentado como um narcísico maníaco-depressivo, uma personalidade fraca e
autoritária, um cripto-fascista. Desde o seu acesso à Casa Branca, a imprensa apelou
para o seu assassinio físico e o Partido Democrata acusou-o de ser um espião
russo. Conseguiu que uma investigação contra ele e a sua equipa fosse aberta na
perspectiva da sua destituição. O seu principal Conselheiro, o General Michael
Flynn, foi forçado a demitir 24 horas após a sua nomeação, depois detido.
Quando Donald Trump perdeu as eleições intercalares para a Câmara dos
Representantes (Novembro de 2018), foi logo forçado a negociar com alguns dos
seus opositores. Chegou a um acordo com o Pentágono, autorizando certas acções
militares desde que elas não envolvessem o país numa espiral, e obteve em troca
o encerramento do inquérito russo. Durante oito meses, ele tentou a todo o
vapor por termo à destruição do Médio-Oriente Alargado e aos preparativos para
a destruição da Bacia das Caraíbas. Esperava poder anunciar a concretização da
paz na tribuna da Assembleia Geral das Nações Unidas. Zás! Neste exacto dia, a
USIP (alter ego da NED, mas para o Departamento da Defesa), apresentava o seu
relatório sobre a Síria aconselhando o relançar da guerra. E, ainda no mesmo
dia, a Presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, anunciava a
abertura de um processo de impeachment (destituição-ndT) contra ele, desta vez
a propósito da sua luta, com as autoridades ucranianas, contra corrupção do clã
Clinton.
É, pois, pouco provável que
Donald Trump consiga realizar o seu programa antes do fim do seu mandato quando
a campanha eleitoral, para a sua eventual reeleição, se inicia. Entretanto, os
seus partidários ressaltam que ele nunca é tão bom como quando é acusado.
Raros foram os média (mídia-br) a
explicar o Jacksonianismo. Claro, uma ideologia que já ninguém defendia desde a
Guerra da Secessão. Quase todos pretenderam durante dois anos que Donald Trump
era incoerente e imprevisível, antes de admitir que ele agia segundo uma visão
do mundo bem determinada.
Seja como for, ele já conseguiu
repatriar muitos dos empregos deslocalizados e a pôr fim ao apoio maciço dos
Departamentos de Estado e da Defesa aos exércitos jiadistas, do qual restam, no
entanto, alguns programas em curso.
Pouco importa o que Barack Obama
e Donald Trump realizaram enquanto presidentes, o apenas será lembrada a
maneira como os média os apresentaram quanto ao dia da sua tomada de posse.
O papel do Estado Profundo
É agora evidente que a oposição a
Donald Trump não é unicamente constituída pelo essencial da classe política
norte-americana, mas também pela maior parte dos dirigentes estrangeiros de
países aliados dos Estados Unidos. Isso pode parecer estranho para estes
últimos que teriam tudo a ganhar com o seu sucesso. Mas não é assim que
funciona a política. Uns após os outros, estes dirigentes adquiriram a
convicção que ninguém poderá mudar a política dos EUA. O interesse dos seus
Estados face aos poderosos EUA será, pois, não se afundar junto com um Donald
Trump isolado no seu país, mas permanecer fieis à política destrutiva de George
W. Bush e de Barack Obama.
Resta saber quem entre as dezenas
de milhar de funcionários puxa os cordelinhos e porquê se opõem ao projecto
Trump. O «Estado Profundo», do qual o Presidente não pode inflectir a política,
talvez não seja mais do que um fenómeno sociológico, tanto como poderá
representar interesses estruturados. O Presidente Trump acreditava ter
neutralizado a oposição dos comités encarregados de aplicar os tratados mais ou
menos secretos dos Estados Unidos com os seus aliados. Ele julgava ter
negociado um acordo com o governo montado preventivamente para o caso de guerra
nuclear. Enganou-se redondamente.
As lições desta história
Duas lições podem ser extraídas
desta história. Primeiramente, todos os historiadores estão de acordo em
afirmar que George W. Bush verdadeiramente não exerceu a sua presidência, mas
alinhava com o seu circulo próximo, em primeiro lugar atrás do seu
Vice-Presidente, Dick Cheney, e do seu Secretário da Defesa, Donald Rumsfeld. É
igualmente evidente que Barack Obama tinha muito pouco poder para além da
decisão dos assassinatos selectivos. Parece hoje que Donald Trump não está à
altura de conseguir mudar a política dos EUA. É forçoso constatar que, desde o
11 de Setembro de 2001, a
função de presidente dos Estados Unidos é quase exclusivamente mediática. E, se
o presidente não dirige a Política, aqueles que o fazem na sombra não são
eleitos.
Em segundo lugar, os aliados dos
EUA não obedecem ao presidente dos EUA, mas, antes ao seu Estado Profundo. São
os joguetes de um actor invisível. Apenas a Rússia e a China são
verdadeiramente independentes. A Rússia é o único destes três Estados cujo
presidente é democraticamente eleito e exerce o Poder em nome do seu Povo. A
China é um sistema transparente, mas apenas os membros do Partido único
participam na sua vida política. O sistema dos Estados Unidos, esse, é
perfeitamente opaco.
Thierry Meyssan* | Voltaire.net.org | Tradução Alva
*Intelectual francês,
presidente-fundador da Rede Voltaire e da conferência Axis for Peace. As suas
análises sobre política externa publicam-se na imprensa árabe, latino-americana
e russa. Última obra em francês: Sous
nos yeux. Du 11-Septembre à Donald Trump. Outra obras : L’Effroyable
imposture: Tome 2, Manipulations et désinformations (ed. JP Bertrand,
2007). Última obra publicada em Castelhano (espanhol): La gran impostura II. Manipulación y
desinformación en los medios de comunicación (Monte Ávila Editores,
2008).
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