domingo, 27 de outubro de 2019

Portugal | Um Governo à medida do país?


Domingos De Andrade* | Jornal de Notícias | opinião

Um primeiro-ministro, 19 ministros, 50 secretários de Estado. Setenta ao todo. E comece-se a somar o que aí vem. Chefes de gabinetes, adjuntos, adjuntos dos adjuntos, assessorias e adjuntos das assessorias.

Perante os grandes desafios com que Portugal se confronta, identificados e dissecados, uma economia débil, pouco diversificada e aberta, a ameaça de mais uma crise internacional, uma dívida externa incomportável e interna, das famílias, fundada no consumo, insustentável, o país a envelhecer e sem soluções que estanquem a hemorragia, um tecido social profundamente empobrecido, o estafado interior desertificado e as escandalosas assimetrias regionais, António Costa responde com um Governo de dimensões dificilmente explicáveis.

Para um Governo gigante, ambições gigantes? As fronteiras diluídas entre pastas não auguram nada de bom, a começar nos ministérios da Coesão Territorial e o da Modernização do Estado e da Administração Pública, com este último a ficar com competências como a descentralização, que pela lógica deveriam pertencer ao primeiro, mas a lógica aqui importa pouco, e a acabar no do Planeamento, que tem também, como o da Coesão, a missão de gerir os fundos europeus. Pode parecer boa política, como parece o Ambiente ficar com as florestas, mas teme-se que no fim da história se acabem a diluir responsabilidades e a fazer de conta que se faz muito para não fazer nada.

E é uma pena. Contrariamente ao que à primeira vista parece, António Costa tem um quadro parlamentar que lhe permitiria finalmente avançar com algumas reformas estruturais para o país, desde a da Justiça, ao SNS, ou à Segurança Social, e olhar com seriedade para o urgente investimento público, e sem as quais dificilmente deixaremos de andar aflitos e de crise em crise.

A Esquerda, a quem já prometeu o aumento do salário mínimo, não o deixará cair até que pelo menos o centro-direita se reorganize e estanque o crescimento da extrema-direita. O PSD, enquanto for de Rui Rio, já se disse disponível para a discussão das grandes reformas. E o presidente da República quer continuar a ser o artífice da estabilidade.

Costa pode é não querer, mas isso, usando a expressão de Marcelo no discurso da tomada de posse, só ele é que sabe.

*Diretor

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