JES pode regressar a Angola para
servir de guardião dos filhos quando nada joga a favor deles na Justiça, diz
analista. Diálogo com João Lourenço, visto como "carrasco" do clã dos
Santos, seria outro moto do regresso.
Desde que o cerco a Isabel dos
Santos em Angola apertou a ponto de a sufocar enquanto empresária que a
possibilidade de um regresso próximo de José Eduardo dos Santos (JES) começou a
ser cogitada. E parece até ter lógica a desconfiança, pois dá sentido à frase
"mexeu com o meu filho, mexeu comigo".
Também os outros dois destacados
filhos, José Filomeno "Zenú" dos Santos e Welwitschia
"Tchizé" dos Santos, estão a ver a "vida a andar para trás"
durante a governação de João Lourenço. Em nome do desafogo da sua prole,
planearia o ex-Presidente de Angola ser a moeda de troca?
O analista político Agostinho
Sikatu entende que "o seu [possível] regresso pode significar duas coisas:
a primeira, para servir de guardião dos filhos [e] para os que lhes são mais
próximos, como é o caso dos amigos e daqueles que estiveram mais próximos no
seu Governo, para que estejam minimamente seguros." Por outro lado,
pode também ser o acenar da bandeira branca, acrescenta: "para
dizer 'eu cá estou, podemos abrir um canal de diálogo e vamos resolver
isto definitivamente por via da conversa, porque com tensão não vamos a lado
algum'. É preciso notar que José Eduardo dos Santos, mesmo ao nível do MPLA, se
tornou, até determinada altura, uma figura moralmente aceite."
Alvo final é José Eduardo dos
Santos?
Agostinho Sikatu lembra,
entretanto, que José Eduardo dos Santos não fugiu de Angola - foi para Espanha
tratar da sua saúde. Justamente durante a sua ausência, o seu nome é cada vez
mais chamado ao de cima nos maiores casos de supostas irregularidades financeiras,
envolvendo empresas públicas e os interesses privados dos seus filhos.
Isso alimenta a suspeição de que
o alvo final das autoridades angolanas seja José Eduardo dos Santos, enquanto
responsável em última instância. Mas Sikatu não o vê como alvo, preferindo
questionar a guerra da qual o ex-estadista faz parte.
"O objetivo não é bem a quem
se visa atingir, nós apenas deslocamos o problema principal. Tivemos um erro na
colocação em prática do discurso de combate à corrupção", opina Sikatu.
"Mão" angolana numa
eventual ação americana contra JES?
Mas a pressão contra José Eduardo
dos Santos não chega apenas de Angola. As autoridades norte-americanas estariam
também a encostar o ex-Presidente à parede. De acodo com o Novo Jornal, as
autoridades dos Estados Unidos da América terão acionado mecanismos para
congelar os seus bens, com base na Lei Global Magnitsky, por causa do seu
suposto envolvimento em casos de corrupção.
O ex-Presidente poderá ser alvo
de um processo-crime. Isso é resultado da "mão" angolana ou trata-se
de pura iniciativa dos EUA?
"Não acredito que se trata
de pura iniciativa do Governo norte-americano, porque as autoridades americanas
trabalham com o Governo angolano há mais de vinte anos. É preciso notarmos que
o Executivo de João Lourenço tem estado em contacto direto com o FMI, que
praticamente dita as regras dos angolanos", responde o analista
político.
E Sikatu alerta: "Não nos
esqueçamos que há poucos meses esteve cá uma equipa de peritos norte-americanos
com garantias dessas entidades de que a Justiça norte-americana trabalharia
para ajudar a Justiça angolana a recuperar os bens de angolanos que lá estão,
ou seja, recursos que possam ser repatriados para o nosso país."
Depois de longo silêncio, duas
reações de JES em curto espaço de tempo
Desde que JES saiu de Angola, há
cerca de um ano, nunca se pronunciou sobre as ações contra os seus filhos na
Justiça, nem sobre qualquer outro tema relativo a Angola - até há cerca de
dez dias, quando endereçou uma mensagem de fim de ano aos angolanos,
desejando particularmente a João Lourenço sucessos. A carta, apesar de
enigmática, evidencia sinais de que queira sair da "toca".
Nesta segunda-feira (13.01), o
ex-Presidente endereçou uma segunda missiva, desta vez ao Tribunal
Constitucional, Parlamento e à imprensa local. Eduardo dos Santos refuta a sua
participação direta na comercialização do petróleo e diamantes, reagindo deste
modo ao despacho-sentença do caso do arresto dos bens de Isabel dos Santos e do
genro Sindika Dokolo, onde o seu nome é repetidamente citado.
Regresso de JES: nostalgia e
ressentimento seriam sentimentos dominantes?
O que representaria o regresso de
JES a Angola? O sociólogo Paulo Inglês não tem uma resposta fechada: "Não
sei como seria, não seria tocado nem molestado, evidentemente. Ele tem muitos
apoiantes ainda, pessoas fiéis a JES."
O académico entende que a
debilidade económica do país poderá ser determinante: "Mas, neste momento,
em minha opinião, há uma espécie de confusão, as pessoas não sabem o que
pensar, porque economicamente a situação está muito má. Então, para alguns, há
uma espécie de nostalgia dos tempos de JES e outros veem isso como consequência
da governação de JES."
"Agora, numa possível vinda
de JES, reagiriam aqueles que têm a tal nostalgia; ligariam o seu regresso a um
possível crescimento económico, por exemplo. E as pessoas ressentidas vão [ver]
o seu regresso como uma espécie de assombração", finaliza Paulo Inglês.
Nádia Issufo | Deutsche Welle
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