Entidades sanitárias apelam às
pessoas suspeitas de estarem infetados pelo coronavírus para irem fazer o
exame, em Bissau. País é dos mais afetados entre os PALOP. Crise política
continua a preocupar.
"Apelamos, mais uma vez,
através da comunicação social, para irem fazer o exame. Irem ao centro de
atendimento do Hospital Nacional Simão Mendes. Caso contrário, o que não
queremos, somos obrigados a tomar medidas, que naturalmente temos de tomar para
proteger a saúde pública", afirmou o médico Tumane Baldé, do Centro de
Operações de Emergência de Saúde guineense.
Tumané Baldé, que falava na
conferência de imprensa diária para fazer o balanço da evolução da doença no
país, explicou também que aquelas pessoas são cidadãos residentes em Bissau e
em Canchungo.
A Guiné-Bissau tem até hoje 50
casos confirmados de Covid-19, três dos quais curados, distribuídos pelo setor
autónomo de Bissau (32), Canchungo (13) e Biombo (5).
O médico guineense disse que foi
enviada para a cidade de Canchungo uma equipa reforçada de saúde pública, que
inclui médicos, epidemiologistas e funcionários do Laboratório Nacional de
Saúde Pública, para reforçar o Centro de Operações de Emergência Médica
regional e fazer um "trabalho de fundo para informar qual a situação real
daquela cidade".
Tumane Baldé referiu também que o
grupo clínico identificou 18 pessoas com Covid-19 que têm risco de maior
transmissão da doença na comunidade ou por causa do grau de gravidade que vão
ser transferidas para o Hospital Nacional Simão Mendes "por falta de
condições e porque têm maior risco de transmissão".
Estado de emergência
Também este sábado (18.04), a
jurista guineense Aua Baldé defendeu que o estado de emergência não pode ser
"um cheque em branco" para a violação de direitos humanos em África,
condenando a imposição violenta das medidas de combate à Covid-19.
"Os governos africanos não
poderiam fugir à tendência mundial de declarar o estado de emergência de modo a
restringir alguns direitos humanos. No entanto, o que se tem notado é que há
casos de violência das autoridades policiais para fazer implementar as medidas
do estado de emergência", disse Aua Baldé.
Académica guineense, mestre pela
Harvard Law School, dos Estados Unidos da América, que trabalhou para as Nações
Unidas e em vários países africanos, apontou o caso
concreto da Guiné-Bissau, de onde têm chegado denuncias de dezenas de
casos de abusos policiais e das autoridades para fazer respeitar o confinamento
das populações em casa.
"A segurança social é um
direito para uma pequena minoria nos contextos africanos. As economias são
maioritariamente informais e as pessoas, por uma necessidade de sobrevivência,
são obrigadas a sair. As medidas têm de ser adaptadas ao contexto local",
defendeu a especialista em direito internacional dos Direitos Humanos.
"Tem havido casos concretos
de violações de direitos humanos, que são condenáveis, e os governos têm de ter
em atenção que a declaração do estado de emergência não significa passar um
cheque em branco para que possam cometer violações que noutros contextos não
aconteceriam", sublinhou.
Globalmente, e excetuando os
casos de violência policial, a jurista afirma não "ver ainda uma tendência
maior" de violações de direitos humanos no continente, adiantando que o
que há é maior atenção sobre "realidades que já existiam".
Crise política
"A situação da Guiné-Bissau
desafia qualquer jurista. É impossível fazer uma análise coerente do que se
passa", disse ainda Aua Baldé, referindo-se à crise pós-eleitoral e
confessou, ainda durante a entrevista à Lusa, a sua "frustração" com
mais uma oportunidade desperdiçada de tirar o país do impasse.
A jurista, que reside em
Portugal, apelou, por outro lado, para a "responsabilidade acrescida"
dos órgãos políticos e do Supremo Tribunal de Justiça para que não continuem
"a propiciar focos de tensão que só vão adiando o futuro do país".
Aua Baldé responsabiliza também a
comunidade internacional por um certa "manipulação de interesses" que
não "são para o bem da Guiné-Bissau, nem dos guineenses".
"Mas, enquanto guineense e
africana, o que sinto é que não podemos deixar que o futuro do país e do
continente esteja nas mãos do outro, temos de assumir essa
responsabilidade", disse.
Socialistas portugueses
preocupados com a Covid-19 na Guiné-Bissau
Entretanto, na sexta-feira
(17.04), os deputados socialistas da Comissão de Negócios Estrangeiros e
Comunidades Portuguesas (CNECP) na Assembleia da República manifestaram "a
maior preocupação" com a situação política e a evolução da pandemia de
Covid-19 na Guiné-Bissau.
"Os deputados socialistas na
CNECP manifestaram grande preocupação pelo facto de não estar ainda resolvida a
situação política e institucional na sequência da segunda volta das eleições
presidenciais e apelam para o diálogo interno e internacional e para a
normalidade democrática", afirmam num comunicado emitido após uma reunião
por videoconferência.
Na reunião, na qual analisaram
diversos temas no âmbito da política externa e das comunidades portuguesas, no
contexto da evolução da pandemia de Covid-19, os deputados manifestaram também
"a maior preocupação pelo facto de vários membros do Governo [da
Guiné-Bissau], entre os quais o próprio primeiro-ministro, Aristides Gomes, vários
ministros e secretários de Estado estarem sem paradeiro conhecido",
pedindo para que "não sejam cometidas arbitrariedades pelo atual regime do
Presidente Umaro Sissoco Embaló e que todos os direitos, liberdades e garantias
sejam respeitados".
Os deputados apelam também à
comunidade internacional para que continue "a acompanhar a situação na
Guiné-Bissau e faça respeitar os princípios do Estado de direito e da
democracia, muito particularmente às Nações Unidas, União Europeia, CPLP
[Comunidade dos Países de Língua Portuguesa], União Africana e CEDEAO
[Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental]".
Ainda de acordo com o mesmo
comunicado, os deputados socialistas daquela comissão "manifestam a sua
maior preocupação devido ao aumento do número de casos de Covid-19 na
Guiné-Bissau, que é o país mais atingido da CPLP, já que não existem estruturas
sanitárias com capacidade de resposta para com o agravamento da situação, nem
em Bissau nem noutras zonas do país".
Neste contexto, os deputados
"condenam qualquer abuso de poder com o argumento do cumprimento das
medidas do estado de emergência, já que há relatos de pessoas espancadas
simplesmente por se encontrarem na rua".
Deutsche Welle | Agência Lusa, cvt
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