Eugénio Costa Almeida* | opinião
Andamos todos, e com muita razão,
um pouco – ou muito – preocupados com a pandemia do coronavírus SARS-Cov-2
(Covid-19) que, tudo o indica e pouco há que o desminta, teria sido proveniente
da China.
Isso é assunto para outras
matérias e para especialistas de outras valências que não as que investigo. É
que o Mundo não é só Covid-19.
Há muito mais que a pandemia que
prolifera, quase em exclusivo em muita comunicação social, principalmente, a
televisiva.
Acreditem, ou não, também há
outras pandemias, quer na saúde, quer na política, quer na segurança.
Porque o mundo, nomeadamente,
África, não é só Covid-19, deixo-vos aqui alguns exemplos, nestas três
vertentes:
i. Ao nível da saúde:
1. No passado sábado, 25 de
Abril, recordou-se uma das maiores e mais persistentes pandemias que continuam
a varrer a humanidade, e, para a qual, continua a não existir uma vacina e nem
parece que, alguma vez – mesmo que haja filantropos a tentar ajudar que isso
aconteça – vá existir: o paludismo, ou malária.
De acordo com estimativas da OMS,
e referidas pelo portal da ONU News, em 2018 – os de 2019, só saberemos em
finais deste ano, como habitualmente –, terão ocorrido 228 milhões de contágios
e 405 mil pessoas (cerca de 1,77%) falecidas devido a esta pandemia. Angola,
por exemplo, em 2019, e de acordo com um artigo do Jornal de Angola, o
paludismo foi a doença que mais matou no País. Já no primeiro trimestre de
2020, e de acordo com uma informação do VPN, na província da Lunda Sul, por
exemplo, foram registados 49 mortos num universo de 24.150 infectados.
De acordo com a OMS, em 2018,
ter-se-ão gasto em controlo e eliminação do mosquito da malária, cerca de 2,7
mil milhões de USDólares, bem aquém dos esperados 5 mil milhões de USDólares.
Se esta pandemia, tal como o
SARS-Cov-2, atacasse o chamada Hemisfério branco ou do Norte (Europa e América
do Norte) tenho a certeza de que já há muito que uma vacina, pelo menos, já
estaria descoberta. Até lá, os laboratórios vão ganhando milhões com
medicamentos pouco eficazes, com desparasitantes em aerossóis e certas
indústrias têxteis com o fabrico de milhões de mosquiteiros…
2. Outra das endemias que
proliferam, em particular em África, e parece esquecida é o ébola. No início de
2020, ou mais concretamente, em Fevereiro, a OMS – e a nova pandemia já
começava a mostrar o que iria dar – afirmava que o ébola, apesar de algumas
relativas melhorias na sua propagação, continuaria a ser considerada com uma
doença como uma “emergência internacional”.
Por exemplo, só na RDC, mas
regiões de as regiões de Kivu-Norte e de Ituri, desde Agosto de 2018, já
faleceram cerca de 2300 pessoas. Só no Congo Democrático. Mas o impacto desta
endemia vai até à Libéria e à República da Guiné…
ii. Ao nível político, o caso da
Guiné-Bissau parece ser o mais paradigmático que ocorre no continente africano.
Uma personalidade, discutível – quem foi assessor de Kadhafi, quem apresenta
informações académicas (graus superiores e pós-graduações) que as próprias
autoridades académicas do país de onde diz ter obtido esses graus de
pós-graduações, pelo menos, dizem desconhecer onde terão sido obtidas, que usa
turbante islâmico, não persistente, mas conforme as conveniências, não me
parece merecer ser considerada uma personalidade credível – que impediu o
Tribunal Supremo de dirimir uma questão que foi levantada pelo seu opositor,
nas presidenciais; uma personalidade que é muito próxima do presidente
senegalês Macky Sall – não esquecer que o Senegal não acolhe a linha de
demarcação fronteiriça marítima internacional porque na área que está dada como
pertencente à Guiné-Bissau, estará a maior – e, talvez, mais rica – área de
hidrocarbonetos.
Ora, segundo consta nos
corredores políticos, o auto-proclamado e, agora, sancionado(?) pela CEDEAO,
Sissoco Embaló, estaria disposto a rever esta linha fronteiriça. Por alguma
razão, o Senegal tem se apetrechado de melhores e mais recentes barcos
patrulhas de costa – os mais recentes a Israel, patrulheiros da classe Shaldag
MK II (tem já 3 desta classe) – e colocados na área de Casamance, na área
militar Zona 4. Não me parece que seja por causa dos secessionistas
casamandenses… A CEDEAO, já reconheceu a sua autoproclamação. Sancionado uma
atitude nada democrática e tida como contra constitucional. E a União Africana,
vai sancionar, também. Assim como assim, tanto a ONU, que, indirectamente já
acolheu as directrizes da CEDEAO, como Portugal – o seu primeiro-ministro – já
o felicitou, ficamos a aguardar. Pelo menos, o presidente em exercício da CPLP,
o presidente de Cabo Verde, preferiu pautar pela prudência…
Recorremos, por exemplo, como no
Mali, por exemplo, o presidente Ibrahim Boubacar Keita, considerou mais
importante efectuar eleições legislativas – a primeira volta e com pouca adesão
como confirmou o primeiro-mistro – que estavam marcadas para meses atrás, mesmo
com a pandemia do Covid-19, porque o impacto social seria mais importante para
a sua presidência sucessivos dos jihadistas. É que os malianos, começam a
questionar a presença das forças franco-europeias que os apoiam, porque não
veem alterações na crise securitária do País…
iii. Já ao nível securitário não
esquecer a crise securitária no Golfo da Guiné e no Sahel. No Mali, face à
crise atrás referida, no Burkina Faso, com os sucessivos ataques de jihadistas,
quer a nível interno, que na fronteira burquino-maliana e com a invasão de
militares malianos sob a desculpa de perseguição aos jihadistas, mas onde os
kurkinasos são, igualmente, vítimas inocentes. A sucessiva pirataria no Golfo
da Guiné. Recentemente, no Togo e no Benim, barcos têm sido e foram abordados
e, ou, raptados, bem como os seus tripulantes. Neste último, o mais recente, um
porta-contentores de pavilhão português, Tommi Ritscher, foi atacado porque a
tripulação, apesar de já ter sio aprovada uma resolução num Conselho de
Ministros português para o uso de armas ligeiras em barcos com bandeira
portuguesa, para autodefesa, a tripulação não as tinha porque o Governo
português ainda não legislou, ou transpôs para a legislação, esse despacho
governativo.
Mas não é só nesta zona que a
preocupação da União Africana deve prevalecer. Em Moçambique, na província de
Cabo Delgado os sucessivos ataques de jihadistas parecem estar a ter algum
impacto junto da população. A falta de intervenção credível das forças armadas
moçambicanas, o pedido de ajuda a do presidente Nyussi junto de paramilitares
sul-africanos – situação que indispôs, de sobremaneira o governo de Ramaphosa –
e o facto de alguns moçambicanos começarem a considerar as Forças de Defesa e
Segurança estarem mal armados e mal alimentados, continuarem a exercer
violência sobre as populações e começarem a ser vistos como ocupantes, enquanto
os jihadistas começam a ser olhado como combatentes contra a “corrupção e a
arbitrariedade da elite local apoiada por um governo distante” (Público, 21
Abril 2020), torna a situação muito preocupante, não só para Moçambique, mas
para toda a área e para os Grandes Lagos. É reconhecida o uso das vias férreas
caminho-de-ferro entre Lubumbashi (RDC) e Moçambique para o transporte
irregular de armas ligeiras (a rota a kapulana).
Tudo isto, só para recordar que o
mundo, e África, em particular, não é só Covid-19…
*Investigador do Centro de
Estudos Internacionais do ISCTE-IUL (CEI-IUL) e investigação para Pós-Doutorado
pela Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto; Investigador
associado do CINAMIL.
**Todos os textos por mim
escritos só me responsabilizam a mim e não às entidades a que estou agregado.
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