Lourenço Pereira Coutinho |
Expresso | opinião
E de repente, as próximas
presidenciais ganharam interesse. Há tempos, escrevi neste espaço que as
eleições marcadas para janeiro de 2021 corriam o risco de se transformarem num
passeio monótono de Marcelo Rebelo de Sousa, isto para desespero de alguns,
entre eles André Ventura. Mas, na semana passada, António Costa deixou
implícito o seu apoio à recandidatura de Marcelo, abrindo a caixa de pandora, e
trocando as voltas às previsões.
Resultado, o atual presidente
que, na primeira volta, não pediu nem esperou pelo apoio do PSD, procura agora
demarcar-se da desconfortável posição de candidato do governo. Por outro lado,
a insinuação de António Costa destapou um vasto campo à esquerda. Muitos
voltaram a falar de Ana Gomes, que está em “reflexão, e é a candidata de
convergência preferida pela esquerda “europeia”. O eventual apoio do Livre e de
parte do PS a Ana Gomes, podem obrigar o BE a apresentar também um candidato.
Para se diferenciar da antiga eurodeputada socialista, este teria de
enquadrar-se numa linha claramente à sua esquerda, o que, à partida, afasta a
hipótese Marisa Matias. Ainda à esquerda, é previsível o aparecimento da
habitual candidatura apoiada pela CDU, sem outro objetivo para além de fixar o
seu eleitorado.
Mas as palavras de António Costa
na Autoeuropa tiveram um impacto ainda mais interessante à direita.
Tradicionalmente, a direita costuma unir-se em torno de um candidato
presidencial comum mas, desta vez, pode vir a dividir-se por quatro candidatos:
o próprio Marcelo Rebelo de Sousa que, não esquecer, é oriundo do
centro-direita; um candidato “liberal” - Adolfo Mesquita Nunes, ou alguém de
perfil semelhante – que consiga reunir apoios da Iniciativa Liberal, e de sectores
do PSD e do CDS; um candidato do populismo “light”, possivelmente Miguel
Albuquerque, um político que procura protagonismo e gosta de desafios (em 2012,
disputou a liderança do PSD Madeira ao então intocável Alberto João Jardim); e,
por fim, o populista André Ventura que, afastado do comentário futebolístico, e
perante um cenário de mais concorrentes à direita, terá de reajustar a sua
estratégia.
Se a todos estes candidatos
juntarmos o aparecimento de independentes e um ou outro curioso, teremos umas
eleições presidenciais de 2021 mais animadas que o esperado. Até agora, a
recandidatura de um presidente em exercício tem sido sinónimo de passeio
eleitoral sem verdadeiro debate, e de eleições sem grande história. Mas não
devia ser assim. As eleições em que um dos candidatos concorre a segundo mandato
têm também de servir de escrutínio democrático dos cinco anos anteriores e,
sobretudo, de debate de ideias, valores, e intenções de futuro.
A História recente demonstrou que
António Costa tem uma capacidade política invulgar. No caso das próximas
presidenciais, só ele saberá os reais motivos sobre o timing do seu apoio à
recandidatura de Marcelo Rebelo de Sousa. Para a democracia, o cenário que
agora se prefigura é mais vantajoso que o inicial, quando se adivinhava o
confronto entre um candidato de consenso, e candidaturas menores e de extremos.
Mas, para António Costa, pode ser que o tiro lhe tenha saído pela culatra.
Pedindo emprestado parte da interrogação de um anúncio de outros tempos a uma
marca de vinho do Porto, este é, pois, caso para perguntar-lhe: foi você que
pediu um candidato presidencial?
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