No fim, passado o surto
epidémico, não vamos ficar todos bem. As enormes desigualdades, bem patentes
ainda hoje na nossa sociedade, ter-se-ão acentuado. A precariedade e o
desemprego terão crescido ainda mais.
AbrilAbril | editorial
A Assembleia da República debateu
o Programa de Estabilidade de 2020 apresentado pelo Governo que, ao contrário
do que aconteceu em anos anteriores, não inclui qualquer cenário macroeconómico
para o ano corrente e para o período 2020-2024.
Um debate morno, cheio de fait-divers,
fruto de uma ampla e profunda convergência quanto ao essencial, nomeadamente
entre PS, PSD e CDS. Com excepção do PCP, ninguém questionou este exercício de
submissão às regras e imposições da União Europeia (UE), de ingerência e condicionamento
das opções macroeconómicas, orçamentais e de soberania nacional.
O próprio BE passou ao lado desta
questão. Aliás, a eurodeputada bloquista subscreveu no passado dia 9 o
Manifesto Nossa Europa, da Plataforma de Cidadania Nossa Europa, associando-se
a destacadas personalidades do PS, PSD e CDS/PP, onde, entre outros aspectos,
se sublinha que, para responder ao «maior desafio da sua história», a UE deve
apostar no «aprofundamento da integração política, social e económica».
Mas, regressando ao Programa de
Estabilidade de 2020, o Governo decidiu não avançar para já uma previsão para o
crescimento económico em 2020, assumindo uma posição mais cómoda, já que ao
mesmo tempo que não ignora e até divulga as previsões que algumas instituições
internacionais (FMI e CE) e nacionais (BP), não se compromete com nenhuma.
Entretanto, enquanto o Governo
não se compromete com nenhuma previsão para a taxa de desemprego, da mesma
forma que não arrisca uma evolução do emprego e das remunerações médias dos
trabalhadores, vão sendo conhecidos dados oficiais referentes à evolução
recente do número de trabalhadores inscritos nos Centros de Emprego, do número
de empresas que recorreram ao lay-off simplificado, do número de
processos de despedimento colectivo iniciados e dos trabalhadores abrangidos
por esses processos. Todos estes dados permitem perceber a dimensão das nuvens
negras que se abatem já hoje sobre os trabalhadores e as suas famílias, embora
o Governo persista em tratar todas as empresas da mesma forma, sejam elas
micro, pequenas médias ou grandes.
Com este Programa de
Estabilidade, o Governo não faz mais do que meter a cabeça na areia e a não
querer ver o que se está a passar no mundo das empresas e no mercado de
trabalho.
No fim, passado o surto
epidémico, não vamos ficar todos bem. As enormes desigualdades, bem patentes
ainda hoje na nossa sociedade, ter-se-ão acentuado. A precariedade e o
desemprego terão crescido ainda mais e o nosso tecido produtivo, já hoje muito
fragmentado e fragilizado, ainda será mais destruído.
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