Investigador diz que terroristas
responsáveis por ataques violentos em Cabo Delgado , em Moçambique, são alimentados por
fatores internos. E critica autoridades por terem privilegiado a teoria de uma
origem estrangeira.
O académico Salvador Forquilha
considerou esta quarta-feira (17.06) que a origem dos grupos de terroristas
responsáveis por ataques violentos na região de Cabo Delgado, no norte de
Moçambique, é complexa e alimentada por fatores internos, sobretudo étnicos e
sociais.
"A insurgência é alimentada
por clivagens múltiplas de origem étnica, histórica, social e política",
disse o diretor e investigador sénior do Instituto de Estudos Económicos e
Sociais (IESE) de Maputo, durante o seminário "Encontrar soluções para a
insegurança em Cabo
Delgado ", organizado pelo Instituto Real de Relações
Internacionais - Chatham House.
Cabo Delgado, província onde
avança o maior investimento privado de África para exploração de gás natural,
está sob ataque desde outubro de 2017 por insurgentes, classificados desde o
início do ano pelas autoridades moçambicanas e internacionais como uma ameaça
terrorista.
Em dois anos e meio de conflito
naquela província do norte de Moçambique, estima-se que já tenham morrido, no
mínimo, 600 pessoas e que cerca de 200 mil já tenham sido afetadas, sendo
obrigadas a refugiar-se em lugares mais seguros.
Teoria Estado Islâmico errada?
Forquilha criticou as autoridades
moçambicanas por terem privilegiado a teoria de uma conspiração de origem
estrangeira de extremistas islâmicos ligados ao grupo Estado Islâmico quando
"Informação no terreno sugere que o desenvolvimento da insurgência em Cabo Delgado foi
alimentada consideravelmente por fatores internos".
O investigador moçambicano disse
estar envolvido em dois estudos, um sobre o conflito e os desafios em termos de
desenvolvimento no norte de Moçambique e outro sobre a coesão social e
violência política, que olham para a situação em Cabo Delgado.
O que descobriu é que um fenómeno
inicialmente isolado e pouco organizado tem estado a crescer junto de grupos
populacionais marginalizados pelo Estado, nomeadamente jovens e muçulmanos mais
conservadores.
"O discurso de oposição à
ordem estabelecida funciona no sentido de acelerar o descontentamento social e
radicalizar clivagens políticas e sociais", justificou, adiantando que
"os insurgentes conseguiram estabelecer uma rede eficiente de apoio
logístico e informação" graças aos jovens integrados nas comunidades
locais.
A informação recolhida sobre o
movimento das diferentes forças de segurança na região deu aos rebeldes maior
mobilidade e eficiência em operações militares, explicou, alertando para a
necessidade de impedir que o conflito se intensifique e espalhe para outras
províncias no norte de Moçambique.
Aliança militar regional
Pedro Esteves, especialista em
segurança e analista da consultora Africa Monitor, sediada em Lisboa, sugeriu
que uma das soluções a curto prazo pode ser a criação de uma aliança militar
regional, nomeadamente com o Zimbabué, e eventualmente com o apoio da África do
Sul e Angola.
Porém, salientou, estes dois
últimos países "podem apoiar e ter força regional em Mocambique, mas
existe uma diferença entre apoio político e meios militares".
A outra hipótese é uma maior
intervenção das forças militares moçambicanas, apesar da "falta de
motivação, organização, capacidades e recursos" que tem dado espaço para a
intervenção de empresas militares privadas na região.
"Existe um descontentamento
dos militares pela forma como o conflito tem sido abordado pela polícia. Eles
sentem que estão a ser subordinados e isso agrava a falta de coordenação e a
moral. Qualquer solução a curto prazo vai precisar dos militares com vontade e
capacidade. O Presidente [Filipe] Nyusi tem de resolver isto em breve",
disse Esteves.
Deutsche Welle | Lusa
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