Inês
Pereira | AbrilAbril | opinião
Bruno
Candé Marques, actor da Casa Conveniente, foi assassinado em plena luz do dia
este sábado. Antes dos tiros, ouviu insultos racistas que o mandavam «de volta
para a sua terra». Até quando?
Foi
assassinado este sábado Bruno Candé Marques, actor da Casa Conveniente e
Zona Não Vigiada. Pai de três filhos, Bruno nasceu em Lisboa em
1980 e iniciou o seu percurso de actor no grupo de teatro da Casa Pia.
Sentado
num banco, a passear a sua cadela, foi alvejado por um
homem idoso com quem alegadamente tinha tido uma discussão por causa do
animal de estimação, na passada quarta-feira.
Um
crime que será punido nos termos da lei, certamente. Mas importa falar dele
para alertar para o que há de particular neste assassinato. Os insultos
que Bruno ouviu antes de morrer mandavam-no «voltar para a sua terra». Quantas
vezes por dia serão proferidos insultos deste tipo? Embora o discurso de
ódio contra sujeitos racializados esteja longe de ser uma novidade, este tem
sido cada vez mais legitimado, porque há mais espaço hoje do que há uns anos
para esta narrativa no espaço público, a começar pela Assembleia da
República.
O
espaço que estas forças retrógadas têm vindo a ganhar, no poder e no campo
mediático, permite tirar das gavetas, legitimar, e dar suporte
àqueles que durante muitos anos apenas podiam afirmar os seus
preconceitos entre dentes, por causa dos avanços conseguidos no
25 de Abril e dos valores progressitas desta revolução.
Todos
os democratas devem tomar posição e impedir que volte a sair do esgoto um
conjunto de valores que promovem a divisão e discriminação por forma a
justificar as injustiças e desigualdades que prevalecem na sociedade.
O
que nos divide não é o que nos torna distinguíveis uns dos outros, fisicamente
ou culturalmente. O que nos divide é a ideia de que somos mais parecidos com o
nosso patrão porque temos a mesma cor de pele do que do homem negro
que trabalha na empresa ao nosso lado e que vive no nosso bairro.
Quantos
é que somos, aqueles que vivem do seu trabalho e que vêem os seus direitos ser
postos em causa quando se anuncia a próxima crise? A culpa de ter o meu emprego
em risco é daquele com quem vou amontoado no autocarro às 7 da manhã cujos
avós nasceram noutro país? Ou será dos que optam por direccionar a riqueza
que eu e ele produzímos para manter os privilégios de um pequeno grupo?
A este
pequeno grupo de privilegiados serve bem que desconfiemos do nosso
vizinho, do nosso colega de trabalho, por causa da sua cor de pele.
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