Daniel Oliveira | TSF
| opinião
"Não
há propriamente boas notícias", avisa logo Daniel Oliveira, no espaço de
Opinião habitual na TSF. O plano de recuperação acordado em Bruxelas "foi
uma brutal derrota para os países do Sul e uma brutal derrota para o conjunto
da Europa"
Os
quatro frugais, expressão que o cronista admite "detestar",
conseguiram, na perspetiva do jornalista, "uma vitória muito acima das
expectativas".
"Li
nas redes sociais e acho que vou começar a adotar: os quatro feudais, uma
expressão que me parece mais justa", comenta.
Aos
quatro feudais - Holanda, Áustria, Dinamarca e Suécia -, como Daniel Oliveira
prefere chamar, são dirigidas várias críticas: "Só o dinheiro ficou a meio
caminho, e mesmo quanto ao dinheiro, compensaram no orçamento até 2027. Não
apenas impuseram condicionalismos no Fundo de Recuperação, como aproveitaram a
pandemia para reforçar o seu poder político sobre os outros Estados,
conseguindo impor a sua vontade, ao longo do processo que se vai seguir."
A
forma encontrada para que este dinheiro seja entregue é "muito pior do que
foi a troika". Daniel Oliveira deixa mesmo o aviso: "Pode acontecer
isto: um país acha que outro não está a cumprir os objetivos, aciona aquele que
é chamado como o super-travão, e isso suspende as transferências."
As
transferências só podem portanto ser aprovadas "se uma maioria qualificada
do Conselho decidir, não uma maioria simples", o que significa que
"uma minoria pode bloquear o processo", explica o jornalista. Esta
"maioria qualificada" é difícil de calcular, dado que está envolvido
"o peso da população", por exemplo.
Como
não basta uma maioria simples para aprovar este processo, o que a Holanda
conseguiu, de acordo com Daniel Oliveira, foi "o direito formal de uma
minoria impor a sua vontade".
"Penso
que é a primeira vez que isso acontece na União Europeia", realça o
cronista. "Claro que qualquer país o pode fazer... Portugal pode fazer o
mesmo em relação à Holanda." Mas os países não se encontram em pé de
igualdade, ressalva Daniel Oliveira, "porque os mais pobres, que estão
numa situação muito pior, não podem dispensar esse apoio, não podem ficar à
espera e sofrem muito mais se o super-travão for aplicado".
A
"vitória dos quatro feudais" não acaba aqui. É o alerta de Daniel
Oliveira, já que, no que diz respeito ao quadro plurianual até 2027, "há
os descontos de três mil milhões de euros do que já tinha sido proposto em
relação às contribuições que estes quatro países poderiam fazer - conseguiram
juntar mais mil milhões de desconto".
Foi
um "dia cheio", descreve o jornalista, que não compreende "por
que é que António Costa, que falou grosso aquando de uma expressão que o
ministro holandês das Finanças utilizou, saiu a falar tão fininho deste
Conselho, onde teve uma monumental derrota, talvez das maiores derrotas que
Portugal já teve num Conselho Europeu".
O
jornalista tem, contudo, dúvidas sobre se as decisões saídas de Bruxelas
comprometerão a recuperação económica, porque "o dinheiro chega, e o
dinheiro é muito".
"A
questão é o peso político que outros passam e a forma como isso condiciona. É
olhar para a proposta de Costa Silva e perceber que a proposta vale nada se a
Holanda ou a Dinamarca ou outros países tiverem a capacidade de, a qualquer
momento, acionarem este super-travão." E, além de Portugal, sublinha
Daniel Oliveira, este acordo é também "uma catástrofe para a União
Europeia".
Daniel
Oliveira vê a celebração deste acordo como um boicote ao futuro da UE.
"Não é por acaso que é a Comissão Europeia a tomar estas decisões, porque
os países têm interesses económicos contraditórios entre si, competem entre si.
Dar a um país o poder para travar investimentos noutro país é a receita para o
caos. Cada passo que a União Europeia dá, sobretudo durante uma pandemia,
parece ser para se auto-boicotar."
*
Texto redigido por Catarina Maldonado Vasconcelos
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